O desaparecimento de entes queridos é uma das maiores dores que acometem famílias brasileiras. Segundo a publicação mais recente do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 62.857 pessoas sumiram em 2020. A estimativa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública é de que 40 mil crianças e adolescentes sejam dadas como em paradeiro desconhecido anualmente — e entre 10% e 15% desse total somem sem deixar vestígios.
O número de 2020 representa uma queda expressiva diante do observado em 2019, quando foram 79.608 casos registrados, mas pode ser sinal de uma falha nas notificações em razão da crise sanitária. Positivamente, porém, 31.996 desaparecidos foram localizados no ano de início da pandemia.
A ONG (Organização Não Governamental) Desaparecidos do Brasil é uma das que se empenham em conscientizar a população para o sumiço das pessoas. A presidente da entidade, Amanda Boldeke, explica que muitos números estão desatualizados. Portanto, a quantidade de brasileiros com paradeiro incerto é bem maior do que o informado por fontes oficiais.
"Nem todos avisam a polícia nesses casos, e a estatística é sobre registros. Não existem dados oficiais de quantas crianças estão desaparecidas", afirmou. Ela diz que 90% dos pequenos desaparecidos são encontrados, mas nem todos com vida. "Os 10% que não são encontrados vão se somando, ano após ano, e temos uma quantidade absurda de crianças e adolescentes desaparecidos no país, totalmente esquecidos pelos órgãos responsáveis e pela sociedade."
Boldeke destaca que o sumiço de menores é especialmente grave por ser sempre totalmente involuntário. Para ela, a violência extrema aliada à impunidade explica a triste realidade brasileira.
"Maus tratos e mendicância forçada causam fugas de casa. Doenças, abandonos, drogas, aliciamentos ou raptos para o trabalho escravo infantil, para a prostituição ou adoções ilegais, são muitas das razões que causam desaparecimentos. Precisamos, com urgência, que nossos pequenos tenham seus direitos constitucionais levados a sério pela sociedade num todo", afirma Amanda Boldeke.
No mês passado, o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei nº 29/2019, que inclui o nome de crianças e adolescentes no Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas (CNPD). Até então, esses nomes constavam apenas em um cadastro próprio para menores, ativo desde 2010. Para a senadora Zenaide Maia (Pros-RN), uma das relatoras do projeto, a inclusão dos nomes em outro banco de dados garantirá mais agilidade nas buscas.
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Segunda vez
Todos os dias, um grande número de adultos também desaparece. É o caso de Givanildo Ferreira, 25, morador de Guarulhos-SP, cujo paradeiro é incerto desde 1º de maio último. A irmã, Joelma, conta que ele chegou a ser encontrado em um hospital, mas sumiu novamente no dia seguinte.
"Ele desapareceu na terça-feira, depois de sair de casa falando que ia buscar um 'negócio'. Ele entrou no hospital à meia-noite do sábado e saiu às seis horas da manhã no domingo. Aí, não retornou para a casa e dali sumiu de novo", relata.
A Polícia Civil da região orientou a família a seguir procurando Givanildo, enquanto as investigações do órgão estão em curso. "Estamos todos atrás, bem desesperados. Saindo para procurar, colocamos cartas, fomos na polícia, ligamos para os hospitais, para o IML (Instituto Médico Legal), e nada", disse, angustiada, a irmã.
Quem pode respirar aliviada é Érica, irmã de Regimar Carlos de Sousa, 29, morador de São Francisco de Itabapoana, no Rio de Janeiro. Ele foi encontrado em São Paulo, depois de desaparecer no último dia 4 de maio. "Ele saiu de casa e deixou até o celular, sem dizer para onde ia. Como a gente mora no interior, ele foi andando até o centro da cidade, a cerca de 30 quilômetros da nossa residência, sacou uma quantia no banco e, de lá, desapareceu", afirma Érica.
A irmã conta que Givanildo, provavelmente, embarcou em um ônibus para a capital paulista. Devido a um problema de coluna, que o impediu de seguir no emprego de caminhoneiro, ele tinha muita dificuldade de se locomover. Foi quando apareceu uma pessoa anônima que viu o sofrimento de Givanildo e o levou ao hospital.
"Quando ele chegou ao hospital, conseguiu lembrar o número do telefone dele e os médicos entraram em contato com a família. Aí a gente ficou sabendo que era ele mesmo e, graças a Deus, está bem", conta, aliviada. "Foi muita angústia para nós, porque ele nunca fez isso. O pior é não saber onde procurar."
Polícia pede notificação imediata
No geral, é comum que as pessoas acreditem que só podem reportar um desaparecimento às autoridades após um período de, pelo menos, 24 ou 72 horas. No entanto, conforme recomendações das unidades da Polícia Civil do país, a notificação deve ser feita tão logo se perceba o sumiço e seja constatado que o indivíduo em questão está incomunicável. Para ter certeza de que esse é o caso, deve-se verificar os locais que o desaparecido costuma frequentar (trabalho, escola, casas de amigos), hospitais e o IML.
"Os familiares ou responsáveis pela pessoa desaparecida devem registrar a ocorrência em qualquer delegacia circunscricional. Se possível, levar uma foto recente para ajudar nas investigações", orienta a Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF).
Além da foto, é útil fornecer um objeto pessoal com impressões digitais do desaparecido e a maior quantidade possível de dados extras. Também é importante informar todos os telefones para contato. Outra opção é fazer o registro pela internet. No caso de o sumiço ser de um residente do DF, o endereço eletrônico é https://www.pcdf.df.gov.br/servicos/delegacia-eletronica/desaparecimento-de-pessoas.
"Assim que a delegacia recebe a ocorrência, a investigação é iniciada. As técnicas de investigação serão utilizadas especificamente para cada caso", garante a PCDF.
Ao ver alguém dado como desaparecido, quem fez a descoberta deve, imediatamente, contatar a polícia ligando para o número 190, dando detalhes do local e das características do indivíduo encontrado.
*Estagiários sob a supervisão de Odail Figueiredo