Consumo

Sanduíche vinha apenas com 'cheiro' de picanha

Diante da controvérsia em torno dos sanduíches de picanha do McDonald's sem o corte de carne preferida dos brasileiros na composição, a rede de fast food decidiu interromper, ontem, a venda dos lanches da nova linha em todos os restaurantes do país.

"Esclarecemos que a plataforma recém-lançada denominada 'Novos Mc Picanha' teve esse nome justamente para proporcionar uma nova experiência ao consumidor com o exclusivo molho sabor picanha, uma nova apresentação e um hambúrguer diferente em composição e em tamanho (100% carne bovina, produzida com um blend de cortes selecionados e no maior tamanho oferecido pela rede atualmente). Pedimos desculpas se o nome escolhido gerou dúvidas e informamos que estamos avaliando os próximos passos", informou a rede mundial de fast food, em comunicado divulgado à imprensa.

A decisão ocorreu depois que o Ministério da Justiça e o Procon-SP, notificaram a companhia pedindo esclarecimentos sobre a falta de picanha nos sanduíches anunciados pela rede. O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) também abriu um processo para investigar a campanha da empresa, de acordo com as agências de notícias.

A nova linha dos hambúrgueres Mc Picanha entrou no cardápio da rede de fast food em 5 de abril. A justificativa ao questionamento de órgãos de fiscalização chocou os consumidores quando a empresa admitiu, publicamente, que não há proteína na composição do sanduíche, mas um molho com "aroma natural de picanha".

Na avaliação de Walter Moura, advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) em Brasília, o fato revela uma estratégia de propaganda precária e um claro desrespeito ao cliente não somente do McDonald's, devido à notória impunidade em casos que lesam o consumidor. Ele relatou processos na Justiça que demoram quase 10 anos para a definição do valor de multa a ser aplicada pelo Procon.

Lixo comercial

Moura destacou que o tal "aroma natural" do sanduíche polêmico nada mais é do que uma substância artificial que não justificaria um preço diferenciado para o produto. "Sabemos que picanha é mais cara, e o cliente pagou mais por um sanduíche que não tinha essa proteína na composição. A empresa agiu como se aqui tudo fosse uma festa", lamentou. Para o advogado, neste caso, a multa a ser aplicada deveria ser alta e, inclusive, obrigar o reembolso ao consumidor que comprou o sanduíche achando que se tratava de uma refeição com carne de primeira.

De acordo com o especialista, empresas estrangeiras aproveitam para aumentar a margem de lucro sobre os consumidores brasileiros, porque a maioria da população é pouco esclarecida sobre os seus direitos e não é organizada e, portanto, não boicota as grandes marcas, como ocorre na Europa. Segundo ele, apesar de o Código de Defesa do Consumidor ser elogiado internacionalmente por ser abrangente, ele tem pouco efeito prático.

"Esse episódio (do sanduíche) é mais uma prova de que o Brasil é destinatário de lixo nas práticas comerciais. Há vários episódios que provam isso, como o compartimento do carro alemão que cortava o dedo e parou de ser incluído nos carros vendidos na Alemanha, mas continuaram aqui. É como se o país ficasse com o resto do resto, porque o brasileiro acha que tem órgãos fiscalizadores que multam, mas é tudo um faz de conta", disse Moura.

"Sabemos que as empresas acabam não pagando as multas e, por isso, elas continuam desrespeitando o consumidor brasileiro", acrescentou o advogado. Para Moura, a polêmica da picanha se trata de cortina de fumaça para um problema mais grave e que tem afetado o bolso dos brasileiros: a disparada dos preços dos combustíveis. "Pode ser um chamariz para desviar o foco da gasolina", completou.