Justiça

Atuação do governo Bolsonaro na pauta ambiental está sob a lupa do STF

Tribunal analisa conjunto de ações que denunciam o desmonte da política ambiental no governo Bolsonaro. Em seu voto, ministra Cármen Lúcia critica duramente falhas em programa de preservação

As ações do chamado "Pacote Verde" voltaram ao debate do Supremo Tribunal Federal (STF). O conjunto de sete processos movidos contra políticas ambientais do governo Bolsonaro começou a ser analisado em plenário, ontem. Até o momento, a única a votar, ministra Cármen Lúcia, reconheceu a existência de um quadro "estrutural" de violação a direitos na situação ambiental do país.

Com um voto duro, a magistrada criticou a falta de execução do orçamento para políticas ambientais e cobrou a adoção de um novo plano para reduzir o desmatamento na Amazônia. "Verbo não é verba. Lorota, trololó, lero-lero de dizer que está lá previsto, mas não acontecido. Não adianta ter uma previsão que não é para ser executada", ressaltou.

Cármen Lúcia julgou procedentes duas ações agrupadas sobre o controle do desflorestamento da região e apontou falhas na fiscalização do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm).

Na ADPF 760, sete partidos de oposição acionaram o STF em 2020 para que o governo federal executasse o PPCDAm. Segundo as siglas, houve uma diminuição de fiscalizações, com uma queda no número de autuações, e aumento no desmatamento.

Já na ADO 54, a Rede Sustentabilidade acusa o governo de se omitir em ações de combate ao desmatamento na Amazônia. O partido pede que o STF cobre da União medidas concretas para evitar a derrubada da floresta.

A ministra ordenou que o governo elabore um plano que vise a fiscalização e o combate ao desmatamento, a proteção dos direitos indígenas e o combate a crimes ambientais. O documento deverá ser entregue ao STF em até 60 dias.

Para Cármen Lúcia, o desmonte da política ambiental decorre da "cupinização institucional", que desmantela as estruturas do Estado suficientes para garantir a eficácia de uma política de prevenção do desmatamento da Amazônia Legal. Por isso, a magistrada defendeu que a intervenção do poder Judiciário se mostra imprescindível para que se estanque a destruição.

"A inefetividade do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado produz efeitos irreversíveis sobre todos os seres humanos, desta e das futuras gerações. [...] Atinge-se com as ações deficientes, as omissões estatais, a vida de todos os seres do planeta", completou.

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Pedido de vista

Ao final da sessão, o ministro Luís Roberto Barroso elogiou o voto e indicou que iria esperar o voto de André Mendonça antes de acompanhar a relatora. No entanto, o indicado do presidente Jair Bolsonaro (PL) pediu vistas, ou seja, mais tempo para analisar o caso.

Com isso, a sessão foi suspensa e deve ser retomada na tarde desta quinta-feira. Como justificativa, Mendonça afirmou que a proteção do meio ambiente não é somente responsabilidade do governo federal, mas também dos estados.

"Uma das grandes dificuldades de cobrança e fiscalização das ações ilegais praticadas na Amazônia legal inclui a regularização fundiária. Se não tratarmos da regularização fundiária, principalmente no estado do Pará, nós teremos dificuldades. A responsabilidade de proteção da região não é apenas da União, é também dos estados", defendeu Mendonça.

Considerada inédita, a pauta reúne ações desde junho de 2019 contra decisões ou alegadas omissões do Executivo no combate ao desmatamento, licenciamento ambiental e manejo dos fundos de proteção da fauna e da flora. Dos sete processos, seis foram movidos por partidos de oposição e um pela Procuradoria-Geral da República, durante a gestão de Raquel Dodge.

A iniciativa da análise em conjunto foi das ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber, que definiram a mudança na pauta com o presidente do STF, Luiz Fux, após receberem a visita de um grupo de artistas que promoveu o Ato pela Terra, em Brasília, em 9 de março.

A pauta verde no Supremo

ADPF 760 — Ação cobra a retomada do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm). O projeto foi descontinuado por Ricardo Salles quando estava à frente do Ministério do Meio Ambiente.

ADPF 735 — Ação contesta a Operação Verde Brasil 2 e o uso das Forças Armadas em ações contra crimes ambientais. Objetivo é garantir a retomada do Ibama como principal órgão de controle.

ADPF 651 — Ação é contrária ao decreto que excluiu a sociedade civil do conselho deliberativo do Fundo Nacional do Meio Ambiente.

ADO 54 — Ação acusa o governo federal de omissão no combate ao desmatamento e, por consequência, de descumprimento da meta da Política Nacional de Mudança do Clima, em consonância com a Agenda 2030 da ONU.

ADO 59 — Ação pede a reativação do Fundo Amazônia, que foi paralisado em 2019 sob a gestão de Salles na pasta ambiental.

ADI 6148 — Ação de inconstitucionalidade alerta que o país não está adequado às recomendações da Organização Mundial de Saúde sobre os padrões aceitáveis de qualidade do ar. Foi proposta pela PGR.

ADI 6808 — Contesta a Medida Provisória que prevê concessão automática de licença ambiental para empresas de grau de risco médio e impede órgãos de licenciamento de solicitarem informações adicionais.

Glossário:

ADPF — Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

ADO — Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão

ADI — Ação direta de Inconstitucionalidade