Um jovem negro e homossexual de 22 anos — acusado, por várias vítimas, de cometer crimes de homofobia e injúria racial na internet — foi alvo de uma operação da Polícia Civil em Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira, na manhã desta terça-feira (5/4), para o cumprimento de mandados de busca e apreensão expedidos pela Justiça.
Em novembro do ano passado, o Estado de Minas mostrou com exclusividade que o indivíduo – até então não identificado pelas autoridades – abordou diversas pessoas no Instagram e, além dos crimes já citados, realizou ameaças de morte e estupro.
À época, em resposta protocolar, a Polícia Civil disse que foi instaurado procedimento para apuração dos fatos. No entanto, pouco mais de dois meses após os crimes — que foram registrados por meio de prints (capturas de tela) e vídeos —, o mesmo perfil falso, intitulado Arthur Rodrigues, ressurgiu com mais ataques na web em 12 de janeiro deste ano.
Então, a delegada Ione Barbosa, que também atua como presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher, assumiu as investigações, levantando provas e ouvindo testemunhas.
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Com a chegada da polícia, suspeito tenta fugir
Após meses de investigação, uma equipe da Polícia Civil mineira, sob o comando da delegada, realizou uma megaoperação nesta manhã na Região da Cidade Alta no município.
“Assim que chegamos à casa do suspeito para cumprimento do mandado de busca e apreensão, ele tentou fugir pulando por uma janela, mas nossa equipe conseguiu capturá-lo. Questionado sobre as acusações, ele negou os crimes, mas também entrou em contradição em muitos momentos e disse que as pessoas não gostam dele”, conta a delegada Ione Barbosa em entrevista ao Estado de Minas.
Carta manuscrita de vingança apreendida
Durante as diligências na residência do suspeito, os policiais apreenderam um computador, um notebook, um tablet, um celular e uma carta escrita de próprio punho. "Na folha, ele montou uma listagem de pessoas das quais ele queria se vingar – identificando elas, por exemplo, como mendigo, negro, macumbeiro, pobre, travesti, gay e morador de rua", conta Ione.
"O outro mandado foi cumprido na casa dos pais. Eles relataram que o filho tem problemas psiquiátricos, faz acompanhamento com profissional e estão tentando interná-lo de forma compulsória", acrescenta.
Pedido de prisão ainda não foi deferido
Além da autorização para cumprir os mandados de busca e apreensão, a delegada Ione Barbosa conta que também havia encaminhado à Justiça um pedido de prisão em desfavor do investigado.
“No entanto, neste momento, o juiz entendeu que uma medida cautelar diversa da prisão seria o suficiente. Este procedimento está previsto no artigo 319, inciso III, do Código de Processo Penal (CPP). Com isso, o suspeito não poderá fazer contato ou se aproximar das vítimas. Em caso de descumprimento, ele pode ser preso a qualquer momento”, finaliza.
A força e a voz de Graziele: para além da dor, o desejo de Justiça
“Macaca, preta, suja, usa drogas e só serve para sexo”. Estes foram alguns ataques com os quais Graziele Cláudia Matias Campos Batista, de 24 anos, foi surpreendida nas redes sociais, em Juiz de Fora.
À época, em 18 de janeiro deste ano, a reportagem conversou com a estudante que, pela segunda vez, foi vítima de injúria racial praticada pelo agressor na internet.
Antes disso, em outubro do ano passado, ela foi surpreendida pela primeira vez em mensagens privadas no Instagram, quando decidiu gravar a conversa em chamada de voz pela rede social. "Volta pra África! Macaca! (...). Cabelo duro! (...). Você tem que ser estuprada. Só pra isso que você presta! Eu não ligo para o que preto pensa. Eu sou superior a você", disse o homem nas gravações publicadas pela reportagem à época.
O ataque aconteceu após Graziele tentar defender um amigo, que, vítima de homofobia, foi chamado pelo agressor de “pintoso” e “afeminado”.
“Eu senti um misto de sentimentos. Fiquei com muita raiva, mas também senti muito nojo. Não acredito que passei por isso. Sinto-me inútil por não saber quem é”, desabafou na oportunidade.
Ao denunciar o caso em suas redes sociais, Graziele foi abordada por algumas pessoas, em mensagens privadas, relatando que também foram alvos de ataques do mesmo indivíduo. Por meio de Graziele, a reportagem do Estado de Minas, na ocasião, conseguiu abordar outras vítimas que registraram provas das agressões, além de boletins de ocorrência junto à Polícia Militar.
Em um quase desfecho — e pouco mais de cinco meses após o primeiro ataque recebido em 28 de outubro de 2021 —, Graziele falou rapidamente, por telefone, com a reportagem na tarde desta terça-feira (5/4) e aquele misto de sentimentos ruins, relatado pela jovem na primeira entrevista, deu lugar à sensação de que valeu a pena lutar.
“Nossa, estou muito feliz e realizada. Tenho certeza que ele será preso em breve e pagará pelo que fez não só a mim, mas também às outras vítimas. O momento é de muita felicidade”, revelou Graziele, que deixou transparecer um sorriso em sua voz.
A Polícia Civil segue investigando o caso.