Circular por Belo Horizonte e Região Metropolitana em carros de aplicativo já foi mais simples e prático. Quem costuma utilizar o serviço de empresas como a Uber e 99 deve ter percebido que, além do aumento do preço das corridas, está mais difícil encontrar motoristas disponíveis, principalmente para viagens curtas.
Os motoristas atestam a situação e afirmam que a categoria está perdendo profissionais pelos altos custos de manutenção dos automóveis e pelo aumento no preço dos combustíveis. De acordo com o Sindicato dos Condutores de Veículos que Utilizam Aplicativos no Estado de Minas Gerais (Sicovapp), não é mais viável ter esta atividade como fonte exclusiva de renda.
“Está tendo uma debandada enorme dos motoristas por aplicativo. Muita gente não tem como continuar rodando, porque não tem lucro. Os que tinham esse trabalho como bico, largaram, porque para ter o lucro tem que trabalhar de 12 a 15 horas. E ainda escolhendo as corridas, principalmente para quem usa só gasolina”, aponta a presidente do Sicovapp, Simone Almeida.
Quando Simone cita a ‘escolha de corridas’, ela fala sobre uma técnica utilizada para evitar viagens que não geram lucro. Quando o cliente solicita o serviço, um motorista que está por perto recebe a oferta da viagem com um valor estimado pela plataforma. Dependendo da quantia, o trabalhador decide se quer ou não aceitar a proposta e, desta maneira, corridas com valores menores acabam sendo negligenciadas.
“Muitas vezes, os passageiros ficam até bravos, porque os motoristas acabam escolhendo mais as corridas. A gente que roda há mais tempo, rapidamente faz uma conta e sabe se a corrida vale a pena ou não. Tem casos em que a gente está na verdade pagando para trabalhar”, explica a presidente do sindicato.
Na conta rápida feita pelos motoristas, entra como fator não apenas o preço dos combustíveis, mas também a taxa cobrada pelos aplicativos por viagem. De acordo com o Sicovapp, a Uber cobra entre 35% e 50% do total pago pelo cliente e a 99, entre 35% e 40%.
Em março, após o anúncio do aumento do preço dos combustíveis pela Petrobras, Uber e 99, principais plataformas de transporte por aplicativo, anunciaram um reajuste no preço das corridas. A 99 aumentou em 5% o preço por quilômetro rodado, enquanto a Uber estabeleceu uma alta de 6,5% no valor final da viagem.
Ambas as empresas justificaram o reajuste como forma de ajudar os motoristas a arcar com o aumento dos custos para manter os carros rodando. No entanto, como as taxas cobradas pelas plataformas é variável (no caso da Uber em até 15%), os trabalhadores têm dificuldade em perceber como o aumento no preço final da corrida impacta nos ganhos.
“É um reajuste fictício e que é sentido mais pelo cliente, que paga mais caro. Eu abro minhas corridas no fim do dia e não percebo o critério para entender quando eles cobram uma taxa maior ou menor. A gente tem um canal direto com a Uber, a gente tenta conversar, mas eles não respondem”, protesta Simone Almeida.
Na soma dos fatores da complexa e imprevisível conta que os motoristas fazem ao longo da jornada de trabalho, o resultado acaba sendo dor de cabeça e um peso maior no orçamento dos clientes.
Além dos reajustes feitos pelas empresas, a escassez de motoristas, a rejeição de corridas e a falta de circulação em áreas específicas em horários em que a oferta de corridas é menor impactam no preço final das viagens. Isso acontece porque o preço é definido a partir da relação entre oferta e demanda.
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Velhos hábitos
“O público nós temos, mas as plataforma não nos dão condições de trabalhar”, arremata a presidente do Sicovapp sobre a situação do transporte por aplicativo. É neste cenário que a defasagem de serviço está sendo aproveitada pelos taxistas.
“Os taxistas têm sentido muito a alta no preço dos combustíveis, mas entendemos que não é o momento de reajustar as tarifas. A população está voltando a enxergar o táxi como um serviço seguro e a gente pretende fazer este sacrifício para reconquistar o cliente”, explica o diretor presidente do Sindicato dos Taxistas de Minas Gerais (Sincavir), João Paulo de Castro.
A categoria tem a prerrogativa de encaminhar um pedido de reajuste tarifário à BHTrans, mas decidiu não fazê-lo por enquanto. Atualmente, os táxis rodam na capital com o preço inicial fixo de R$ 4,70, acrescido de R$ 2,80 a cada quilômetro rodado.
O que dizem as empresas
Em nota, a 99 afirma que está sempre aberta ao diálogo com os motoristas parceiros. A plataforma diz que lançou, em março deste ano, um auxílio que acrescenta R$ 0,10 no valor repassado ao motorista por quilômetro rodado a cada R$ 1 de aumento no preço do combustível.
A 99 ainda diz que implementou um pacote de benefícios aos motoristas que inclui corridas sem cobrança de taxas em períodos e cidades específicas. A empresa não discriminou as condições para aplicação desta ação.
Sobre a redução no número de motoristas, a plataforma afirmou que não foi registrada uma queda no número de parceiros registrados, mas um aumento no volume da demanda. De acordo com a 99, o fenômeno ocorreu de forma mais significativa após a flexibilização das leis sanitárias para a pandemia.
A Uber também afirma que não houve redução de motoristas, mas aumento na demanda. A empresa, porém, não tem dados específicos para a Grande BH, apenas o total de associados no Brasil.
Para reduzir a defasagem entre a demanda por viagens e o número de motoristas, a Uber informou que tem reforçado campanhas de indicação, nas quais associados ganham recompensas a partir do cadastro de novos trabalhadores na plataforma.
Sobre a taxa cobrada por corrida, a Uber informa que não há um valor fixo e que disponibiliza um saldo semanal para os motoristas entenderem o quanto a empresa retirou do total recebido. A plataforma diz que, embora o percentual varie, os trabalhadores associados sempre ficam com a maior parte do valor pago na viagem.
A empresa também informou que realiza ações especiais com até 20% de desconto em combustíveis via cashback em parceria com a rede Ipiranga e o aplicativo ‘abastece-aí’.