Danos morais coletivos

Colégio de Minas deve indenizar em pelo menos 500 mil comunidade LGBT+

O Colégio Recanto do Espírito Santo, de Itaúna, deve indenizar a comunidade LGBTQIA+ por danos morais coletivos pela publicação de material homofóbico

Hellem Lara - Estado de Minas
postado em 29/04/2022 19:39 / atualizado em 29/04/2022 19:39
 (crédito: Reprodução Colégio RES)
(crédito: Reprodução Colégio RES)

O Colégio Recanto do Espírito Santo, de Itaúna, no Centro Oeste de Minas, deve indenizar a comunidade LGBTQIA+ em pelo menos R$ 500 mil por danos morais coletivos causados pela publicação de material homofóbico distribuído aos pais dos alunos.

A quantia, conforme o requerimento do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), que ajuizou Ação Civil Pública (ACP) contra a instituição, deverá ser revertida a entidades representativas de pessoas LGBTQIA+ ou, alternativamente, ao Fundo Especial do Ministério Público do Estado de Minas Gerais (Funemp), cuja aplicação deve ser destinada especificamente a projetos de enfrentamento à LGBTfobia.

De acordo com a ação, o Colégio Recanto do Espírito Santo encaminhou, em janeiro deste ano, material informativo para as famílias dos seus alunos com conteúdo de natureza homofóbica.

Entre as informações, estavam orientações para que os responsáveis pelos estudantes não adquirissem materiais escolares estampando símbolos associados à comunidade LGBTQIA+, em razão da carga representativa de uma ideologia "anti-família" que, segundo a escola particular, ligada ao movimento católico conservador de Itaúna, estaria contida nesses símbolos.

No comunicado, a instituição ainda associou a "militância LGBT" a "ideologias anti-família" e qualificou pessoas não binárias de socialmente inadequadas, antinaturais e contrárias ao divino.

 

Colégio de Minas deve indenizar em pelo menos 500 mil comunidade LGBTQIA+
Colégio de Minas deve indenizar em pelo menos 500 mil comunidade LGBTQIA+ (foto: reprodução colégio RES)

Além da indenização por danos morais coletivos, a ACP pede a retratação pública por parte da escola e a condenação do colégio à obrigação de não mais expedir comunicados, documentos ou material publicitário e pedagógico com teor discriminatório.

A ação pede, ainda, que a escola arque com os custos econômicos da produção e divulgação de material contranarrativo ao discurso de ódio praticado, com a efetiva participação de entidades representativas de pessoas LGBTQIA+, sob pena de multa diária de R$ 1 mil.

Irredutíveis

Antes de acionar a Justiça, o MPMG tentou realizar um acordo com os responsáveis pela instituição para implementação de medidas de reparação, compensação e não repetição de danos e condutas discriminatórias.

No entanto, o colégio não reconheceu o caráter preconceituoso e discriminatório da conduta, frustrando a tentativa de solução extrajudicial e levando ao ajuizamento da ACP.

Sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos

Já no início de sua fundamentação jurídica, a ação recorda que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 declara, já em seu preâmbulo, que o Estado Democrático é destinado a "assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos".

Conforme os promotores que assinam a ação - Andrea Clemente Barbosa de Souza, Maria José de Figueiredo Siqueira e Allender Barreto Lima da Silva -, independentemente de para quem o comunicado foi direcionado inicialmente, de forma não surpreendente, ele extrapolou seu público-alvo, possibilitando que um número indeterminado de pessoas fosse atingido e ofendido em sua honra e dignidade por seu conteúdo.

"É necessário salientar que o poder deste discurso não é 'meramente simbólico', pois este constitui a teia de argumentos que, em última instância, fazem com que nosso país seja um dos que mais mata LGBTs no mundo", apontam.

Ancorados também na legislação internacional de direitos humanos, os promotores reforçam, na ação, que toda pessoa, não importando sua orientação sexual ou identidade de gênero, tem o direito de desfrutar plenamente de todos os direitos humanos.

"O comunicado representa, além de patente ofensa à dignidade das pessoas LGBTQIA+, um franco desserviço social, sobretudo em um contexto educacional, pois no lugar de estimular a pluralidade, a diversidade, o respeito e promover uma cultura de paz, referido discurso estimula a segregação e fomenta ideias estereotipadas e discriminatórias contra esse grupo social", destacam.

De acordo com os promotores, "os direitos de pessoas LGBTQIA+ são direitos humanos e não podem ser excluídos da esfera de proteção do Sistema de Justiça, o que torna inaceitável qualquer tom de discurso que associe orientação sexual e identidade de gênero como características capazes de determinar o caráter, a moralidade e a respeitabilidade de um sujeito".

Ainda segundo eles, o colégio ultrapassou os limites da liberdade de expressão e atacou a dignidade de um número imensurável de pessoas.

Resposta da escola

O Jornal Estado de Minas entrou em contato com a direção do Colégio Recanto do Espírito Santo, mas não obteve retorno até o fechamento da matéria.

Mais preconceito

Esta não é a primeira polêmica na qual o Colégio Recanto do Espírito Santo se envolve. Em junho de 2021 o colégio publicou em sua conta no Instagram uma postagem na qual culpabilizava as vítimas pelo crime de estupro devido às roupas com as quais as mulheres se vestiam.

"Quando a mulher decide expor partes do corpo que deveriam estar cobertas, se torna uma sedutora, partilhando assim a culpa do homem. De fato, os teólogos ensinam que o pecado da sedutora é muito maior que o da pessoa seduzida", afirmava a postagem que foi apagada depois da repercussão negativa.

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