Orlando Rufino fica de pé sobre o leito do rio que ele diz ter "dado a vida" para seu povo por centenas de anos.
"Deu a vida, porque ele nos dá tudo", explica.
Importante meio de transporte e fonte de alimento e renda para famílias como a de Rufino, o rio sempre serpenteou pelas densas florestas no sul da Colômbia, até chegar ao poderoso rio Amazonas.
Mas, em vez de caminharem pela água, os pés de Rufino afundam na areia seca. Os barcos de madeira que normalmente trafegavam ao longo do fluxo constante do rio agora estão esquecidos, encalhados ao lado dele.
"Mesmo durante as secas, o rio sempre chegou até aqui", afirma Rufino, de 43 anos, apontando acima da sua cabeça. "Agora, está difícil."
Historicamente, a estação seca na região vai de julho a dezembro. Embora o nível do rio diminua neste período, sua profundidade quase sempre é suficiente para os barcos trafegarem, segundo Rufino. Mas, nos últimos cinco anos, o período de seca aumentou gradativamente. E, neste ano, se estendeu por meses além do normal.
Normalmente com alguns metros de profundidade, o rio agora é pouco mais que um fio d'água. O nível baixo representa uma ameaça à sobrevivência de cerca de 30 milhões de pessoas que moram na Bacia Amazônica, incluindo o povo Ticuna, natural da região, ao qual pertence Orlando Rufino.
O diretor da ONG colombiana Fundação para a Conservação e Desenvolvimento Sustentável, Rodrigo Botero, afirma que as mudanças climáticas são a causa do aumento da frequência das secas.
"E quem sofre são as pessoas com menos recursos", segundo ele.
Botero é um cientista que trabalha em toda a região amazônica colombiana e vem documentando a destruição ao longo das últimas décadas.
Chamadas de "pulmão do mundo", as florestas tropicais da Bacia Amazônica ocupam 6,9 milhões de quilômetros quadrados — mais de duas vezes a superfície da Índia — e vêm enfrentando desmatamento desenfreado, o que alimenta as mudanças climáticas.
Desde 1978, cerca de 15% da floresta amazônica foram destruídos no Brasil, Bolívia, Colômbia, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela, segundo dados coletados pela Mongabay — plataforma jornalística sem fins lucrativos, especializada em conservação ambiental.
"Entre o desmatamento e estas secas imensas... as comunidades locais enfrentam novos problemas todos os dias", alerta Botero.
Deisi Sánchez Parente Bóatakü é uma das pessoas afetadas pela queda nos níveis dos rios. Ela tem 33 anos e mora em San Pedro de los Lagos, no meio da região amazônica colombiana, perto da fronteira com o Brasil e o Peru.
Normalmente, ela manda os filhos para a escola de barco. Mas, com os níveis do rio baixos demais para a navegação, sua viagem de meia hora agora é uma caminhada de duas horas a pé pela densa floresta.
Todos os dias, ela acorda os filhos às 3h30 da manhã para que cheguem a tempo à escola.
"Às vezes, eles me dizem: 'Mamãe, não quero ir para a aula, é muito longe'", ela conta.
Para Rufino, que é pescador e agricultor, a seca significa que metade do seu trabalho desapareceu. Os peixes se mudaram para águas mais profundas, e a comunidade luta para regar suas plantações, segundo ele.
E, mesmo quando ele e seus colegas agricultores conseguem cultivar alguma coisa, eles não conseguem levar para o mercado sem barcos.
"Você perde dinheiro, porque não há como vender nada. Não existe transporte", relata.
Botero afirma que, em situações extremas, ele já viu animais morrerem por falta de água.
Os animais silvestres, que as comunidades normalmente caçam para ter alimento, migram para locais onde existe água em maior quantidade.
Ele alerta que a escassez de alimentos poderá aumentar ainda mais para populações que já enfrentam taxas de desnutrição desproporcionalmente altas.
As comunidades nativas vêm advertindo repetidamente sobre os efeitos que a seca poderá ter em cerca de 350 grupos étnicos diferentes na região.
"Não queremos mais discursos. Estamos enfrentando um ponto sem retorno na Amazônia", afirmou recentemente em entrevista coletiva o chefe da Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica, José Gregorio Díaz, enquanto os líderes da Organização das Nações Unidas (ONU) se reuniam para discutir a questão.
E, para piorar a situação, grandes áreas da região amazônica colombiana foram devastadas por incêndios florestais desde o início do ano.
Embora os dados sobre os incêndios ainda não estejam disponíveis, o Ministério do Meio Ambiente da Colômbia publicou uma nota em janeiro afirmando que, aparentemente, foram os piores incêndios na região em uma década.
"O que está acontecendo é inédito", segundo Botero. "É um dos maiores incêndios que vi nos últimos 10 anos. De fato, é uma situação apocalíptica."
O medo é que, a longo prazo, os incêndios possam contribuir com as mudanças climáticas, colocando a região em um círculo vicioso de queimadas e secas.
De volta à sua pequena comunidade, Sánchez Parente dá de comer ao seu bebê na sua pequena casa de tijolos sem reboco. Ela conta que está preocupada com o futuro que vai deixar para os filhos.
"Isso nunca havia acontecido", afirma ela. "São coisas que deixam você triste, porque tudo mudou muito."
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