Um grupo de alunas da Escola Estadual Parque Anhanguera, em São Paulo, denunciaram a instituição por retirá-las de sala de aula por usarem croppeds, regatas e calças rasgadas. Cerca de 16 meninas afirmam ter sido levadas à secretaria da escola e repreendidas. Os membros da diretoria ainda afirmaram que "a escola não poderia se responsabilizar por queixas de assédio cometidos por alunos homens por conta da forma como as meninas estavam vestidas".
O caso ocorreu em 9 de março e foi denunciado pelo grupo de meninas, que criaram uma página especial no Facebook para relatar e se manifestarem contra o ocorrido. Em um comunicado, o grupo diz que se sentiu "desrespeitado e ridicularizado", pois a abordagem das meninas foi feita em frente aos colegas.
"Um dia depois da comemoração do Dia Internacional das Mulheres, funcionárias que cumpriam ordens passaram nas salas de aula pedindo para que todas as alunas mulheres se levantassem. Aquelas alunas que estavam de regata, cropped, calça rasgada ou qualquer vestimenta que a escola julgasse inapropriada, foram retiradas da sala de aula e conduzidas até a secretaria da escola", lembram.
"Durante a fiscalização, alunas que estavam de blusa de frio (moletom, casaco) foram obrigadas a tirarem as peças para que as funcionárias pudessem conferir a roupa debaixo", frisaram.
Já na secretaria, as meninas receberam a informação de que o vestuário usado poderia causar “casos de possível assédio cometidos por alunos homens” e que a escola não se “responsabilizaria pelas queixas”, já que as meninas escolheram usar aquelas roupas. Elas também foram informadas que poderiam ser impedidas de entrar na escola e que os responsáveis poderiam ser convocados.
O grupo compartilhou o ocorrido com os outros alunos e receberam apoio dos colegas homens, que foram acusados pela direção da escola de que “só estavam apoiando a indignação das meninas por conveniência e para se aproveitar da situação”.
“Nós somos jovens meninas, mulheres, e temos muito respeito por quem vem antes de nós. Porém, estamos no século 21 no ano de 2022 e é inadmissível que ainda hoje episódios como este aconteçam dentro do espaço escolar onde deveríamos ser acolhidas e não censuradas com o argumento de culpar a roupa da mulher pelo assédio que ela sofre”, escreveram as meninas.
As estudantes contam que decidiram criar uma página no Facebook para garantir que casos assim não ocorram mais na instituição e ajude outras alunas que passem por isso. “Estamos aqui por direito garantido e solicitando o apoio da comunidade, de nossos pais/responsáveis, de nossos colegas homens e de todas as pessoas que acreditam que mulheres tem que ser respeitadas independente da roupa que escolhem usar, para que possamos pensar e construir uma sociedade menos machista!”, pontuam
Elas também repudiaram a fala da equipe escolar sobre possíveis assédios. “A nossa cultura prefere ensinar as vítimas a terem medo e sentirem culpa pela roupa que usam, do que educar as pessoas para que respeitem outras pessoas e principalmente mulheres, sejam elas, alunas, professoras, irmãs, mães, avós, cunhadas, vizinhas, amigas etc! Toda mulher merece respeito!”, frisam.
Na última sexta-feira (11/3), o grupo realizou um protesto visual sobre o ocorrido nas dependências da escola. Elas produziram cartazes com frases de ordem e exigências de respeito. “Escola é um lugar de respeito”, "depois do não tudo é assédio”, “respeita as minas” e “assédio não tem desculpa” foram algumas das declarações espalhadas pelos muros da instituição. Além disso, as estudantes produziram um cartaz em que resumiam o ocorrido com elas.
O advogado Ariel de Castro Alves, membro do Instituto Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, afirma que o episódio contraria “frontalmente as finalidades educacionais e sociais da escola”. Ele também diz que submeter criança ou adolescente sob sua autoridade fere o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e pode causar detenção de seis meses a dois anos.
"As funcionárias e funcionários que tiraram elas da sala e que fizeram revistas para verificar as roupas que as adolescentes usavam devem ser investigadas pela prática desse crime, de submetê-las a vexame e constrangimento", afirmou o especialista à Rádio Brasil Atual. “Os direitos ao respeito, dignidade e liberdade também estão no ECA, ele também prevê que crianças e adolescentes não podem sofrer discriminação e opressão”, acrescenta.
Em nota, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) disse que o episódio “não condiz com as orientações da pasta” e que a Diretoria de Ensino Norte 1, responsável pela escola, irá “averiguar o ocorrido e reorientar todos os funcionários”. O Correio não conseguiu contato com a Escola Estadual Parque Anhanguera.