Mineradoras brasileiras e estrangeiras que operam no Brasil se posicionaram, ontem, contra o projeto de lei nº 191/2020, que permite a mineração em terras indígenas, encaminhado pelo governo federal ao Congresso Nacional. Por meio de nota, o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), que reúne as empresas, defendeu o poder de decisão e consentimento dos povos indígenas sobre os seus territórios. As empresas dizem que o tema precisa de um debate mais amplo e se colocam contra o papel limitado que o texto dá aos índios.
"O Ibram entende que o PL 191/2020, encaminhado pelo poder Executivo ao Congresso Nacional, não é adequado para os fins a que se destina, que seria regulamentar o dispositivo constitucional que prevê a possibilidade de implantação de atividades econômicas em terras indígenas como geração de energia, produção de óleo, gás e mineração", diz a nota.
A mineração em terras indígenas está inscrita na Constituição Federal, nos artigos 176 e 231, mas a sua regulamentação precisa ser amplamente debatida pela sociedade brasileira. "Especialmente pelos próprios povos indígenas respeitando seus direitos constitucionais, e pelo Parlamento brasileiro", continua.
Dessa maneira, o Ibram defende que, para ser regulamentado, o caso da mineração em terras indígenas exige como imprescindível o Consentimento Livre, Prévio e Informado (CLPI) dos indígenas. "O consentimento livre é um princípio previsto na OIT 169 e em uma série de outras diretivas internacionais, o qual define que cada povo indígena, considerando sua autonomia e autodeterminação, pode estabelecer seu próprio protocolo de consulta para autorizar as atividades que impactem suas terras e seus modos de vida", avalia.
Coalizão
O grupo Coalizão pelo Clima também se manifestou contra o PL ontem. Para os membros, a possível votação do projeto em regime de urgência está sendo justificada com o equivocado argumento de que a mineração em terras indígenas resolveria a escassez de fertilizantes, em especial o potássio, vindos da Rússia, na esteira da guerra entre aquele país e a Ucrânia. "A Coalizão Brasil conclui que o PL não resolve o problema no fornecimento de fertilizantes para o agronegócio", diz em nota.
O documento ressalta que dados da Agência Nacional de Mineração (ANM) e do Serviço Geológico Brasileiro coletados pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) mostram que dois terços das reservas brasileiras de potássio, matéria-prima utilizada nos fertilizantes e importados da Rússia, estão fora da Amazônia. O grupo ressalta, além disso, que somente 11% das reservas brasileiras de potássio estão sobrepostas a terras indígenas, e que a ANM conta com mais de 500 processos ativos de exploração de potássio em andamento que poderiam ser viabilizados sem agressão aos territórios indígenas.
Marcelo Furtado, fundador da Coalizão Brasil e professor visitante da Universidade de Columbia, analisa que o mais importante é encontrar um consenso. "Esse projeto não resolve o problema dos fertilizantes. Todo esse problema está vindo na esteira de um conflito na Europa que preocupa a todos. Mas essa guerra não pode ser um pretexto para aprovar esse projeto", avalia.