A voz delas

Elas no campo: conheça mulheres em cargos de liderança no agronegócio

A atividade agrícola movimenta quase 30% do PIB brasileiro.

Deborah Hana Cardoso
postado em 08/03/2022 15:00
 (crédito: FETHI BELAID)
(crédito: FETHI BELAID)

Neste Dia Internacional da Mulher, o Correio conversou com mulheres que atuam diretamente no coração da economia brasileira, o agronegócio. A atividade agrícola movimenta quase 30% do PIB brasileiro. No imaginário popular, todo esse poder tem um rosto masculino. No Congresso Nacional, a disparidade entre os gêneros no setor está presente na última atualização feita no site da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). De seus 280 membros, entre deputados e senadores, apenas 18 são mulheres, ou seja, 6,42%.

Além disso, a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) apontou que as mulheres administram cerca de 30 milhões de hectares, apenas 8,5% das terras para a atividade. Segundo a Abag, o perfil das mulheres que atuam no campo é de alta escolaridade, com cerca de 60% com curso superior e 88% com independência financeira.

Para integrá-las no setor, a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja), por exemplo, instituiu recentemente a Comissão Mulher Aprosoja Brasil. O objetivo é incentivar esposas e filhas de produtores a participar mais da vida nas propriedades.

Alexandra Cossul, Mato Grosso

“O agro ainda é visto como um setor masculino desde a atividade até as lideranças”, afirmou. Alexandra explicou que trabalha com a família e está encarregada da parte administrativa e financeira. “A tecnologia transformou o setor e isso trouxe a mulher para trabalhar junto das fazendas e com seus negócios”, explicou. “A geração da minha mãe foi criada e ensinada para ser do lar. Basicamente, essa foi a criação que eu tive e a partir do momento que eu fiz uma faculdade e uma pós-graduação, eu vi que não era só isso”, disse. Para ela, a tecnologia traz a necessidade de mão de obra qualificada e essa é a porta de entrada da mulher no agro. “Meu pai que está à frente da fazenda, mas não tinha o conhecimento que eu tenho de custo de produção, por exemplo”. Ela disse que apesar dos desafios, observa que há sim um aumento no interesse das mulheres em administrar propriedades herdadas, adquirir ou mesmo trabalhar em empresas agrícolas. “Existe uma grande barreira, pois a mulher ainda exerce a função de ser mãe e esposa. Isso sobrecarrega”, finalizou.

Amanda Burnier, Mato Grosso

Para a produtora é gratificante e imprevisível a vida vivida por safras. Porém, quando se fala em ser mulher no campo, há muito o que melhorar. “Além de todos os desafios impostos no meio rural. Para ser mulher aqui, você precisa dominar o que faz e provar o tempo todo que domina e ainda sim, será testada”, afirmou. Ela explicou que não sentiu dificuldades com fornecedores ou parceiros, mas com pessoas que estavam acostumadas com a administração de seus pais. “Encaro com naturalidade”. Já com outros produtores, a conversa foi outra, havia uma inflexibilidade e uma visão deturpada do que ela era capaz. “Nós mulheres trazemos uma nova visão de estilo no agro. Somos mais detalhistas, damos caminhos mais sustentáveis e desmistificamos a questão da força com criatividade”, explicou. E reiterou: “O feminino quer somar e não tomar o lugar de ninguém”.

Lenice Gazolla, Mato Grosso

Ela explicou que no começo não foi fácil, mas que teve apoio familiar e que seu pai, particularmente, incentivou a dar continuidade nos negócios da família. “Sempre tive apoio do meu pai e do meu irmão. Eles não mediram esforços para me ajudar com os compromissos da propriedade”, disse. Para Lenice, há uma herança machista no setor. Ela destacou que situações cotidianas não a abalaram no passado devido ao apoio que teve, “não me deixei abalar com certas situações, pelo contrário, tive total apoio da minha família”, destacou. Segundo ela, o atual momento do mundo ajuda com a nova visão no campo, onde a mulher se empodera em diferentes setores. “Nos destacamos no agro por competência, capacidade, jogo de cintura e determinação”, disse

Caroline Barcellos, Goiás e Tocantins

Ela explicou que não lidera sozinha e que na fazenda de sua família, homens e mulheres trabalham lado a lado. “As mulheres são participativas e são apoiadas pelos homens aqui. Isso facilita a liderança”, disse. Ela contou que hoje é vice-presidente da Aprosoja no estado do Tocantins. “Em nossa diretoria temos outra mulher, pois somos parceiros e complementamos nossos conhecimentos”, disse. Em meio ao cargo de liderança à frente da associação e na fazenda, Caroline explicou que não sentiu dificuldade em chegar lá, pois o conquistou por sua competência e que ser mulher não foi um empecilho ou um fator definitivo – observou que teve apoio do pai, do irmão e do marido. Caroline usou como exemplo a propriedade de Chapadão do Céu, em Goiás, para elucidar como para ela é natural a integração entre os sexos no setor. “Na região, há muitos grupos familiares que esposas e filhas participam do negócio, então para mim, pareceu algo natural e as mulheres sempre respeitadas por isso”, disse. Caroline explicou que há resistência no setor. “Muitas não se qualificam para ocupar seu espaço e querem estar lá por serem mulheres. Existe machismo, mas ele só abala quando nos vitimizamos” disse. E completou: “Não estou falando daquelas que são proibidas ou que não são respeitadas por serem mulheres, isso existe e não pode ser ignorado”, finalizou.

Tábata Stock, Paraná

“Seria hipocrisia negar que não há dificuldades por ser mulher e estar no comando de fazenda e não são poucas e com frequência, mesmo há uma década nos negócios da família”. Stock contou que mora em Entre Rios, no distrito de Guarapuava, interior do Paraná. “Uma comunidade muito enraizada, fechada, onde a modernidade assusta”, descreveu. Ela explicou que ao levantar a bandeira de inovação na gestão do agro ainda mais sendo mulher foi algo que gerou resistência “até hoje há desconfiança sobre meu trabalho”, afirmou. “Quando escutamos a palavra machismo pensamos no homem querendo se sobrepor a mulher. Eu sofro mais machismo vindo de outras mulheres, devido à criação machista. Elas reproduzem muito mais pelo sentimento de inferioridade”, disse. Tábata contou que com o machismo masculino sabe lidar “homem é rápido, eu sei cortar, pois eles vem com brincadeirinhas e comentários que eu acabo logo. O machismo vindo das mulheres é um assunto mais complicado”, disse. Stock explicou que além de gerir sua fazenda faz consultoria sobre como fazer isso de forma sustentável para outros produtores e mesmo com todas as dificuldades, produzir alimentos a deixa satisfeita.

 

 

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  • Tabata Stock
    Tabata Stock Foto: acervo pessoal
  • Lenice Gazolla
    Lenice Gazolla Foto: acervo pessoal
  • Caroline Barcellos
    Caroline Barcellos Foto: acervo pessoal
  • Amanda Burnier
    Amanda Burnier Foto: Arquivo pessoal
  • Alexandra Cossul
    Alexandra Cossul Foto: acervo pessoal
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