Saúde

Doenças raras atingem 13 milhões no Brasil e aumenta pressão no Legislativo

Portadores dessas enfermidades não têm atenção adequada do governo, mas interesse sobre o tema é crescente no Legislativo

Para ser considerada doença rara, uma enfermidade precisa atingir apenas 65 pessoas em cada grupo de 100 mil indivíduos. Apesar disso, ao juntar todos os cidadãos atingidos pelas oito mil doenças raras existentes em todo o mundo, o contingente se torna enorme. No Brasil, as doenças raras acometem 13 milhões de pessoas, quase o mesmo número de diabéticos, mas a atenção dada para os chamados de raros não é a mesma.

Uma pesquisa inédita — produzida pelo Correio Braziliense com a Associação Crônicos do Dia a Dia (CDD) e a Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras (Febrararas) — sobre a produção do Congresso Nacional relacionada a essas doenças apontou que apenas oito projetos de lei sobre o tema foram aprovados nos últimos vinte anos. A íntegra dos resultados foi publicada no e-book "Radar dos Raros — o atual cenário das doenças raras no Congresso Nacional", que está disponível para download gratuitamente.

O levantamento apontou que a Câmara dos Deputados e o Senado Federal registraram, juntos, 6.400 proposições relacionadas ao setor de saúde naquele período. Dessas, apenas 199 fazem referência direta a doenças raras — 0,3% de todos os 64.734 projetos de lei propostos no Congresso de janeiro de 2000 até dezembro do ano passado.

Embora a produção de proposições com foco nas doenças raras seja considerada ínfima, a pesquisa constatou um crescente interesse pelo tema. De 2016 para 2021, foram registrados 130 projetos de lei, enquanto nos primeiros cinco anos apenas 11 propostas haviam sido feitas pelos congressistas. Na análise do deputado federal Pedro Westphalen (PP/RS), o crescimento do número de projetos de lei para doenças raras é fruto da mobilização da sociedade.

"A produção cresceu quando a sociedade passou a participar. Houve envolvimento do governo, dado o clamor que vem dessas minorias", afirmou. A expansão se acelerou a partir de 2019, ano de criação da Frente Parlamentar de Doenças Raras na Câmara e da Subcomissão de Doenças Raras no Senado.

A diretora de comunicação do Instituto Vidas Raras, Rosely Maria, destaca a importância do Dia Mundial e Nacional das Doenças Raras, comemorado no último dia de fevereiro. "Muitos me perguntam por que celebrar um dia que deveria ser ruim. A gente precisa de uma data para todo mundo falar sobre o assunto e passar informações para a frente", apontou.

Editoria de Arte/CB - Doenças raras no Brasil

Preconceito

Ainda existem muitos estereótipos sobre os doentes raros. "Os raros não são improdutivos. A maioria deles está por aí e você nem sabe quem são. Além disso, não é toda doença rara que indica que você vai morrer", explicou Rosely. Para ela, o compartilhamento de informações sobre o assunto é de extrema relevância para libertar os doentes raros dos preconceitos.

A diretora reconhece que o assunto ganhou notoriedade nos últimos 10 anos, mas ainda há muito caminho a ser percorrido. "Ainda estamos engatinhando. Há poucas pesquisas no Brasil sobre doenças raras, muitos medicamentos que existem lá fora não chegaram aqui. Por isso, é preciso um olhar mais carinhoso de quem deveria gerir os nossos direitos, porque a gente não consegue fazer tudo sozinha", ponderou.

O deputado Westphalen reforça: "Nós temos que produzir mais para provocar o surgimento de políticas públicas que venham facilitar o diagnóstico, a criação de centros de referência e o tratamento adequado". Ele alerta para a necessidade de ter responsabilidade na produção de projetos. "Temos que ter urgência com responsabilidade para que não se façam proposições de políticas públicas que não venham ser eficazes", observa.

Focos

Para Gustavo San Martin, fundador e diretor-geral da Associação Crônicos do Dia a Dia (CDD), entre os maiores desafios enfrentados pela comunidade dos raros, que poderiam ser foco dos legisladores, estão a dificuldade do diagnóstico precoce e do acesso célere a um tratamento. "Culturalmente, nós não somos preparados para falar em prevenção, diagnóstico precoce, em acesso rápido a tratamento, e é de tudo isso que a doença rara precisa", afirmou Gustavo, que é portador da esclerose múltipla, uma doença considerada rara.

Ele defende a criação de espaços formais de discussão permanente sobre o tema, como comissões e frentes parlamentares. "A partir de 2015, a gente teve vários eventos importantes: a promulgação da Portaria 199, que garantiu uma atenção integral às pessoas com doenças raras, a Frente Parlamentar lançada na Câmara, e a Subcomissão de Doenças Raras, no Senado. Esses espaços formais, junto da mobilização social, vão melhorar o nível do tratamento do problema no Brasil", apontou.

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