No sábado (26/2), o Brasil completa dois anos do primeiro caso confirmado de covid-19. A primeira infecção do novo coronavírus foi notificada em 26 de fevereiro de 2020. Em 24 meses, o Ministério da Saúde confirmou 28.578.647 casos e 647.390 óbitos em razão da pandemia. Assim como muitas nações pelo mundo, o país busca um nível de imunização capaz de revogar o caráter pandêmico da doença. Para especialistas ouvidos pelo Correio, ainda que o desejo seja o fim da pandemia, incertezas do momento vivido no mundo colocam em risco a estimativa de uma data para o término do surto global.
Embora o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, já anuncie a expectativa de rebaixar a pandemia para o grau de endemia até o fim do primeiro trimestre e estude a flexibilização de medidas restritivas, outras esferas federativas preconizam a cautela. Ontem, durante reunião ordinária da Comissão Intergestores Tripartite, o vice-presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e secretário da Saúde do Espírito Santo, Nésio Fernandes de Medeiros, pediu prudência nas projeções.
"Nós precisamos ter cautela e precaução em qualquer posição oficial do sistema de saúde que reconheça expressões como o 'fim da pandemia'. Dependendo da mensagem passada ao público, se a gente não tem o zelo pela expressão adequada, a gente pode acabar dificultando a coesão social necessária para garantir aquilo que vai determinar o fim da pandemia", disse o gestor, que ainda ressalta: "A pandemia não vai se acabar por decreto, vai acabar de acordo com as evidências de comportamento dela mesmo", completou.
A infectologista Ana Helena Germoglio, que atendeu a primeira paciente com covid-19 do Distrito Federal, lembra que estimar uma data para o fim da pandemia não é uma previsão matemática. "O histórico das últimas pandemias mostra que, geralmente, elas costumam durar dois anos. Essa, aparentemente, está seguindo esse caminho. Mas, agora, temos um período de incertezas no cenário internacional, de guerra, que não sabemos quanto tempo vai durar", ponderou.
Este cenário vai influenciar na distribuição das vacinas contra covid-19 e na movimentação de pessoas, pontos chaves para o controle da transmissão do vírus. "Por isso, essas incertezas podem fazer com que a pandemia dure mais do que a gente imaginava, já que não adianta vacinar só um país do mundo", afirmou.
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Estabilização
Nésio Fernandes ressalta que alguns países e continentes ainda têm baixo percentual de cobertura vacinal, mas espera que o Brasil contribua na ampliação do acesso às vacinas contra a covid-19. "Sem dúvida nenhuma, estamos mais perto do fim do que do começo, já que as vacinas estão trazendo aquilo que sempre se esperou delas", indicou.
Para o médico infectologista Eliseu Alves, a previsão é de que de fato haja uma estabilização dos casos a partir do inverno. "Depois de dois anos de pandemia, com uma cobertura vacinal boa ou ao menos razoável, em boa parte dos países, com exceção dos países africanos, e após a ampla circulação em todo o globo da ômicron, é provável que após o inverno (julho/agosto) a circulação do SARS-CoV-2 diminua sensivelmente", acredita. Segundo ele, a tendência seria a covid-19 passar a ser endêmica, adquirindo um comportamento sazonal, à semelhança de outros vírus respiratórios.
Alves avalia que a estabilização da covid-19 deve ocorrer no Hemisfério Norte a partir do próximo março ou abril. No entanto, o epidemiologista afirma que ainda é difícil estimar o nível de endemicidade do novo coronavírus. Por isso, segundo ele, ainda será necessário manter as medidas de prevenção, especialmente em locais fechados, "por um bom tempo". "Em síntese, podemos ter uma expectativa mais otimista para o segundo semestre, mas não devemos baixar a guarda", disse.
A infectologista Ana Helena Germoglio ressalta que a estabilização no hemisfério norte só deve ocorrer no Brasil um pouco depois. Ainda assim, ela alertou, o feriado de carnaval pode influenciar a transmissão do SARS-CoV-2. "Mesmo que a maior parte do país tenha cancelado as festas de rua, a tendência é que haja um aumento da circulação do vírus", analisou. Por isso, a especialista acredita ser "ousado" e "precipitado" chancelar uma data para o fim das medidas restritivas no país.
Desigualdade
Em meio a um cenário de incertezas, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) sugere que qualquer discussão e decisão sobre o quadro atual e cenários futuros deve considerar o quadro heterogêneo e desigual no Brasil no acesso à saúde. "É importante destacar que nem todos os espaços geográficos, territórios e populações a vivenciaram ao mesmo tempo e com a mesma intensidade", pontuou a última edição do Boletim do Observatório Covid-19 Fiocruz, divulgada ontem.
"Embora o cenário seja bastante promissor, tanto pela tendência de queda nos principais indicadores como pelo avanço da cobertura vacinal, o Boletim sublinha que a pandemia ainda não acabou, com necessidade de proteger a população mais vulnerável, e considera que dentre os mais expostos estão os adultos que não completaram o esquema vacinal, como também crianças e adolescentes", detalhou o documento elaborado pela Fiocruz.