A tolerância com o feminicídio deve ser zero. A análise é da delegada e deputada estadual de Pernambuco Gleide Ângelo (PSB), que na última segunda-feira passou a comandar a Secretaria da Mulher da União Nacional dos Legisladores e Legislativos Estaduais (Unale). Em entrevista, ontem, ao CB.Poder — uma parceria entre o Correio Braziliense e a TV Brasília —, ela deixou claro que o assassinato de mulheres é um crime quase sempre evitável. Isso porque o marido ou namorado que pretenda tirar a vida da companheira dá sinais de que o fará.
"Tem que ser tolerância zero, porque o que mais me dói é que o feminicídio, frente aos outros crimes, é anunciado. É evitável e a gente não está conseguindo evitar", observou.
Para Gleide, o fato de, muitas vezes, o crime ser visto por pessoas do sexo masculino como "justificável", é um ato de crueldade. "É uma violência que está na estrutura da sociedade. Isso porque a gente vive em uma cultura machista, patriarcal e misógina mundialmente. Mas você vê que tem locais em que ela vai ficando mais grave", disse.
Entre janeiro e junho de 2021, 666 mulheres foram vítimas de feminicídio no país, conforme dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A deputada ressalta que, frequentemente, as vítimas de feminicídio não denunciam o agressor.
"Quando uma mulher morre por feminicídio, não morre só ela. Morre ela, morrem os filhos, morre a mãe. Morre a família toda", lamenta.
Representatividade
Candidata mais votada da história de Pernambuco, com 412.636 votos, Gleide acredita que sua eleição à assembleia legislativa, há três anos, foi "um grito de socorro das mulheres em busca de representatividade". "A conclusão a que eu cheguei, depois de 18 anos na polícia, foi de que eu estava chegando tarde demais. 'Eu preciso agora arrumar uma forma de trabalhar não mais para prender o assassino, mas para fazer que a mulher não morra', concluí. E não tem outra forma de fazer isso senão por meio de política pública, pela prevenção", observou.
Gleide amadureceu a decisão assim que se deu conta de que, como deputada, teria mais condições de lutar para tentar evitar o feminicídio do que somente prendendo o assassino. "Minha vida toda eu trabalhei com homicídio, na DHPP (Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa), fazendo local de morte. O que é o local de morte? A pessoa morreu. O que eu posso fazer? Prender. Era a parte mais fácil para mim. Era só pedir um mandado à juíza e prender", explicou.
Nos últimos três anos, em Pernambuco, a deputada apresentou 230 projetos de lei e teve 85 leis sancionadas, sendo mais de 40 com o objetivo de proteger a mulher da violência masculina. Indagada se pretende, em outubro próximo, trocar a assembleia legislativa pernambucana pela Câmara dos Deputados, e trabalhar tais projetos agora a nível federal, Gleide disse que prefere ficar onde está.
"Minha proposta é fortalecer a política da mulher no meu estado. Então, eu preciso continuar lá. Política não é profissão, não é carreira. Política são competências diferentes. Para mim, ser deputada federal não é subir de nível", assegurou.
*Estagiários sob a supervisão de Fabio Grecchi
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