Santa Bárbara – Autoridades que acompanham a situação das erosões nas encostas e base da pilha de rejeitos da AngloGold Ashanti, em Santa Bárbara, mostradas com exclusividade na edição de ontem pela reportagem do Estado de Minas, avaliam a necessidade de um projeto de adequação da estrutura, podendo pedir até um novo licenciamento.
Fiscais também devem seguir para o local a pedido do Ministério Público de Minas Gerais. A empresa garante a estabilidade do reservatório, a não poluição do ambiente e a transparência com a comunidade.
Conforme mostrou a reportagem na edição de ontem, a Pilha do Sapê, que tem mais de 80 metros de altura e 3,2 milhões de metros cúbicos (m3) de rejeitos de ouro (um terço do desprendido no rompimento de Brumadinho), está situada na Mina de Córrego do Sítio, Região Central do estado e sua situação já causou a retirada de trabalhadores e o esvaziamento do refeitório, alojamento, estruturas administrativas e operacionais.
De acordo com a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), analistas do Núcleo de Emergência Ambiental (NEA) vistoriaram a estrutura em 1º de fevereiro de 2022.
"Representantes da mineradora informaram que as chuvas que atingiram o local em dezembro de 2021 desencadearam processos erosivos, que pioraram com as chuvas de janeiro de 2022, aumentando consideravelmente o número de processos erosivos na pilha de rejeito.”
A empresa informou aos técnicos que realizaria trabalhos emergenciais de recuperação e reconformação dos taludes da pilha, a fim de retornar a estrutura à sua geometria original, assim como a limpeza da drenagem da respectiva pilha que se encontrava assoreada. "Os técnicos da mineradora afirmaram que não há riscos de rompimento da estrutura."
A Feam informou, ainda, que está sendo realizada uma campanha de investigação geotécnica visando subsidiar um projeto de adequação da pilha de rejeito dentro da área diretamente afetada (ADA).
"Caso seja necessária a alteração da geometria da estrutura, será solicitado novo licenciamento no órgão ambiental. Atualmente, estão sendo realizadas inspeções visuais duas vezes ao dia. Na próxima semana, serão iniciados trabalhos de sondagens e, com base nos parâmetros obtidos de resistência e impermeabilidade, além de outros, serão definidos critérios e estratégias de atuação, estimando-se um período de 90 dias para elaboração do projeto."
CRONOGRAMA
Foi concedido um prazo de 15 dias para que a mineradora encaminhe um relatório contendo as informações preliminares dos trabalhos que estão sendo desenvolvidos e cronograma para concepção do projeto final e sua implantação. "Qualquer alteração na situação atual que possa trazer risco de dano ao meio ambiente ou à população vizinha deverá ser comunicada de imediato ao núcleo."
Os promotores de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais também acompanham a situação das erosões na pilha de rejeitos da AngloGold Ashanti na Mina de Córrego do Sítio. Segundo informações do órgão, as inspeções dos sistemas de regulação federais e estaduais foram acionadas assim que as informações chegaram.
“Assim que obteve as primeiras informações comunitárias a esse respeito, o MPMG provocou a Agência Nacional de Mineração (ANM) e a Fundação Estadual de Meio Ambiente. Segundo informações de momento, a ANM ficou de fazer uma vistoria em campo para avaliar a situação”, informou a assessoria de imprensa do Ministério Público.
ESTABILIZAÇÃO
A reportagem do EM mostrou as imagens das erosões a especialistas em mineração que atestaram se tratar de aberturas por processos desgastantes de grande risco e necessidade urgente de respiros para estabilização, algo reforçado por ter a mineradora removido trabalhadores das áreas próximas e transferido departamentos administrativos e espaços operacionais.
"O processo de erosão dessa estrutura é evidente e preocupante, precisa receber intervenção urgente. Reforça isso a retirada dos trabalhadores pela própria empresa", afirma o professor Carlos Barreira Martinez, do Instituto de Engenharia Mecânica (IEM) da Universidade Federal de Itajubá (Unifei).
Na oportunidade em que a reportagem do EM esteve na mina, a evacuação era total. Da portaria aos edifícios da administração, refeitório e alojamentos aos tanques de retenção, onde funcionários afirmam ficar estocadas misturas com cianeto, todas as dependências estavam desocupadas. Nenhuma movimentação de pessoal ou maquinário foi vista por imagens aéreas que varreram a localidade, principalmente no entorno da Pilha de Sapê.
Contudo, a AngloGold Ashanti informou que “desde 10 de janeiro, técnicos e engenheiros da companhia atuam na área com maquinário para as obras de reparo. Também de forma preventiva, para que as obras sejam feitas com o máximo de segurança e agilidade, neste período, algumas estruturas e empregados foram deslocados temporariamente já há mais de 10 dias”.
Para reforçar essa posição, a empresa divulgou uma fotografia com dois tratores trabalhando em uma área de taludes onde afirma estar a pilha, máquinas que simplesmente nem sequer estavam no local no dia que a reportagem lá esteve.
As imagens aéreas também exibem enxurradas correndo de dentro das erosões, que abriram sulcos nos taludes e base da pilha de rejeitos. Todo esse material cor de lama percorre a área da mineradora e cai em diversos pontos do Rio Conceição, mostrando um perigoso caminho que os rejeitos podem percorrer em caso de desabamento da estrutura. Comunidades próximas nas manchas de inundação, sobretudo do distrito de Brumal, temem inundações e interrupções de vias, como a estrada que leva a Itabirito e outra que faz a ligação com o Santuário do Caraça.
Outro temor é o de que uma onda de rejeitos saia da calha do Rio Conceição e atinja a captação da Copasa que abastece Santa Bárbara, no Ribeirão do Caraça, manancial que corre mais baixo que o rio que pode ser caminho dos detritos e fica a apenas 500 metros de distância. O abastecimento leva água a mais de 25 mil pessoas.
Contudo, a empresa nega que haja poluição do manancial advinda de sua área operacional. “Esta pilha sofreu um processo de erosão, que está controlado e não apresenta risco iminente. A erosão permaneceu totalmente na área da empresa, sem impactos aos cursos hídricos da região e às comunidades próximas”, informou.
ELEMENTO TÓXICO
Relatos de trabalhadores à reportagem e a movimentos sociais, como o Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), dão conta de que os rejeitos a seco depositados na pilha seriam finos da mineração de ouro provenientes da barragem em descomissionamento da mina. “Os trabalhadores afirmam que há cianeto – elemento tóxico a organismos biológicos, usado na separação do ouro – tanto na pilha quanto em tanques que estão na área que foi abandonada após a identificação das erosões”, conta o dirigente estadual do MAM na Região do Caraça do, Luiz Paulo Siqueira.
A AngloGold Ashanti informa que não há compostos tóxicos na pilha de depósito de rejeitos. “A estrutura contém material classificado como não perigoso, de acordo com a norma técnica brasileira. O local, inclusive, recebeu na semana passada vistoria do governo do estado, por meio do órgão ambiental.” A mineradora afirma que a pilha não tem relação com suas barragens, que se encontram estáveis e seguras. Em caso de dúvidas, a empresa atende à comunidade pelo canal de relacionamento: 0800 72 71 500.
A reportagem procurou a Prefeitura de Santa Bárbara para saber se tinha conhecimento dessa situação, mas a administração municipal não respondeu às perguntas sobre ações de fiscalização e orientação da comunidade. A Copasa também foi procurada e não respondeu se tem plano de abastecimento de emergência caso a captação no Ribeirão do Caraça seja comprometida.
Pilha do sapê
O depósito na Mina do Córrego do Sítio (Santa Bárbara)
- Altura: 83 metros
- Área: 133 mil m2
- Sedimentos estéreis (inservíveis) e rejeitos (empresa afirma serem inertes; trabalhadores denunciam tóxicos presentes, como cianeto e arsênio)
Problemas identificados
- Erosões grandes e em progresso nos taludes e na base
- Ausência de contenções
- Material sendo carreado para o Rio Conceição
- Não foram vistos trabalhos de reparos
- Vias de acesso livres em caso de emergência
- Comunidades reclamam de falta de informações e transparência
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