As taxas de ocupação das Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs) pediátricas para atendimento de casos de covid-19 no Brasil estão altas. Em Belo Horizonte, capital mineira, não há mais nenhum leito disponível, enquanto no Distrito Federal (DF), 94,87% das vagas estão preenchidas. Na Bahia, que ainda sofre com os danos causados pelos temporais do final de 2021, a ocupação passou dos 80%. Com o agravamento da situação, especialistas alertam para a importância da vacinação e do uso de máscaras.
O cenário se deve ao avanço da variante ômicron, cepa do coronavírus com maior transmissibilidade. Agora, além da iminente escassez de leitos para pacientes adultos em diversos estados, a possibilidade de um aumento ainda maior do número de infecções entre as crianças causa preocupação.
No Amazonas, que sofreu com uma crise de falta de oxigênio e respiradores há cerca de um ano, a taxa de ocupação das UTIs está em 50% no setor pediátrico. O Ceará, no entanto, já chegou a 100%.
Para o epidemiologista Jonas Brant, a cena é grave pois configura apenas a “ponta de um iceberg”. “Como é um número muito grande de crianças infectadas ao mesmo tempo, nós acabamos tendo uma sobrecarga na rede assistencial para elas”, afirma.
“Quando há uma sobrecarga na rede, que os serviços começam a chegar próximos do seu limite, a qualidade da assistência começa a cair, porque já não tem os profissionais especializados, não tem os insumos adequados. E como o número de casos é muito grande, estamos tendo um afastamento muito grande de profissionais de saúde também”, explica o especialista.
Ele avalia que a cena mostra “um atraso importante no programa de imunização infantil. A gente poderia já estar com essas crianças imunizadas há algum tempo, nós perdemos 30 dias que estão sendo cruciais nesse momento”.
Cuidados
“Para analisar o crescente número de crianças acometidas pela covid-19 internadas, com quadros graves, temos que considerar duas características da variante ômicron: primeiro a sua maior transmissibilidade — e quanto maior o número de pessoas infectadas, consequentemente maior também o número de crianças atingidas. Além disso, a não vacinação é um fator de risco. A maioria das pessoas internadas nos hospitais são pessoas não vacinadas ou que não completaram o esquema vacinal”, detalha o infectologista do Hospital das Forças Armadas (HFA), Hemerson Luz.
O especialista esclarece que outra característica da cepa é se manifestar no sistema respiratório alto. “Se considerarmos que, anatomicamente, as crianças têm um sistema respiratório mais curto, o acometimento pelo vírus pode ser mais danoso, a lesão pode ser maior e o processo inflamatório também pode ser maior, levando essas crianças a quadros mais drásticos”, avalia.
De acordo com ele, a vacinação é um caminho para evitar que a saúde dos pequenos fique muito abalada, visto que eles apresentam uma melhor resposta imunológica ao estímulo da vacinação, e alerta: “O vírus vai procurar um caminho para continuar se disseminando, e esse caminho é nas pessoas não vacinadas — e as crianças compõem esse universo”.
Ele aconselha que crianças que não foram vacinadas devem evitar aglomerações e permanecer isoladas de pessoas que apresentem sintomas da doença, ou tenham tido contato com quem esteja com suspeita de contaminação. No caso de os pais testarem positivo para a doença, Luz frisa que é recomendado evitar contato próximo, na medida do possível, fazer uso de máscaras e higienizar as mãos e as superfícies.
Já de acordo com Brant a ventilação também está entre os aspectos mais importantes da prevenção, além do uso de máscaras adequadas. No caso das crianças, é importante que os pais verifiquem se o item de proteção está bem encaixado no rosto, a ponto de forçar que o ar tenha que passar pelo filtro, e não entre pelas laterais, alerta o epidemiologista.
Avanço da Ômicron
O físico pesquisador da Unicamp, Pedro Cintra faz parte de um grupo de pesquisa em epidemiologia matemática no Laboratório Nacional de Computação Científica e também atua com divulgação dos dados da pandemia. Ele diz que São Paulo, Rio de Janeiro e Manaus sãos as cidades que mais tem sido impactadas pelo aumento de casos de coronavírus, causados pela onda da variante Ômicron “Em todas as fases da pandemia no Brasil, esses três estados sempre foram os primeiros a sentirem as novas ondas, como uma espécie de termômetro da pandemia”.
Cintra aponta que a situação da pandemia nas três capitais é resultado do grande trânsito de pessoas. "São Paulo e Rio são um pólo de viagens no país, então é natural que a reintrodução da Ômicron no Brasil cause um aumento mais rápido nessas duas cidades primeiro. Manaus também tem uma mobilidade muito grande, bastante gente viaja para lá, até pela Zona Franca de Manaus”, disse o pesquisador.
Segundo Pedro Cintra, é preciso reforçar a importância de ter o ciclo vacinal completo para que o avanço da ômicron seja combatida no país: “Observando os dados da rede nacional, podemos ver que tem muito idoso, acima dos 70 anos que ainda não tomou a sua terceira dose”.
Ele ainda destacou que o mesmo fenômeno acontece com os adultos entre os 20 e 40 anos, “O número de pessoas que não está retornando para tomar a segunda dose nessa faixa etária também está acima do que deveria”. O pesquisador destacou que é importante descobrir os motivos para essa resistência em tomar doses de reforço, “É preciso saber se há uma dificuldade de acesso à vacina ou se é um outro fator, como as pessoas não querendo tomar por algum tipo de rejeição à vacina”, completou.
*Estagiários sob supervisão de Ronayre Nunes
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