Violência

Homem que levou tiro disparado por PM tem morte cerebral e deixa 2 filhos

Homem de 30 anos foi atingido na cabeça quando estava de costas, segundo a família, e policial estava de folga, sem farda e alterado

Um homem de 30 anos teve morte cerebral confirmada neste domingo (23/1) após levar ao menos um tiro de um policial militar de folga após uma discussão. O caso aconteceu no bairro São Benedito, em Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, no final da tarde de sábado (22/1).

Joaquim Aleixo Sabino Junior deixa dois filhos, de 2 e 3 anos. "As crianças eram o xodó dele. Ele saía todo fim de semana com elas, uma tristeza enorme. Ele tinha acabado de assumir um cargo de chefia na empresa, onde trabalhava anteriormente como soldador. Não tinha vício, não fumava, não bebia", lamenta à reportagem um parente da vítima, que prefere não se identificar (veja mais sobre a versão da família e de testemunhas abaixo).

Segundo o registro da PM, o policial militar Wanderson de Oliveira Pedroso, 37, deixou o carro para um serviço de enceramento na Rua Marita, em um lava rápido, onde também existe uma casa. Ele teria combinado o serviço com o possível proprietário do estabelecimento e o prazo de entrega era a tarde de sábado. Porém, ao chegar ao local, o policial não encontrou o veículo.

Ao bater no estabelecimento, foi atendido por Joaquim Aleixo Sabino Junior, 30, que disse não saber onde o homem com quem o policial havia combinado o serviço estava. Ele teria dito que o carro, provavelmente, "devia estar na rua".

Em depoimento à Polícia Civil, Pedroso afirmou que Junior não 'gostou' do tom em que a pergunta foi feita, e teria começado uma discussão. Nisso, segundo o policial, ele ligou para o 190 pedindo uma viatura da PM para solucionar o 'desacordo comercial', quando o jovem teria se exaltado e começado a empurrá-lo e ameaçado rasgar a camisa.

Aí o PM, que estava de folga, pegou o revólver e atirou contra o rapaz. Ele confirmou, em depoimento, que não havia se identificado como policial durante a discussão. O disparo acertou a testa de Junior, que foi socorrido por vizinhos. Levado para a Unidade de Pronto Atendimento do próprio bairro, foi transferido pouco tempo depois ao Hospital João XXIII, em estado muito grave.

A Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), responsável pela administração do Hospital João XXIII, diz ter como política "não divulgar estado de saúde de pacientes, exceto em casos de de grandes proporções", porém familiares confirmaram à reportagem que a morte cerebral foi confirmada na manhã de hoje.

"Os médicos já haviam dito que o estado era irreversível. Um tiro na cabeça, não tinha como", lamentou um dos familiares de Junior. 

Reprodução - Joaquim Aleixo Sabino Junior, de 30 anos, teve morte cerebral confirmada neste domingo (23/1), segundo a família

 

Outras versões


O primeiro relato trazido pela reportagem foi do próprio policial, mas os policiais ouviram outras duas pessoas.

Um sobrinho de Junior informou que o tio havia perguntado ao policial se o carro não estava na rua. O policial teria respondido de maneira ríspida. Junior questionou a educação e a forma da resposta, e pediu para que o PM saísse da casa (ele estaria dentro do local, segundo o relato).

Quando estava prestes a fechar a porta da garagem, o jovem teria sido empurrado pelo PM, quando começou a troca de socos. O PM teria ameaçado e atirou em seguida.

O relato de uma outra testemunha, vizinho do local onde o crime aconteceu, aponta que o policial estava de fato procurando o carro dele, e, alterado, perguntou a Junior porque não o encontrou. Nisso, Pedroso tentou entrar à força no estabelecimento, sendo empurrado pelo jovem, quando as agressões e o tiro aconteceram.

O vizinho disse que foi ele quem resgatou o jovem à UPA.

O que se sabe é que toda a confusão foi ouvida pelos atendentes do telefone 190. À reportagem, o familiar de Junior disse que o policial tentou simular as agressões e que a roupa dele seria rasgada.

"Ele estava muito alterado. Ou drogado, ou bêbado. Ele não estava normal. Quando me aproximei para tentar resgatar Junior, ele [o policial] ainda fez sinal de que iria atirar em mim também", disse.

O homem confirmou que o policial não havia se identificado como PM - e que só foram saber após o registro da ocorrência - e que o serviço de polimento do veículo dele havia sido confirmada pelo dono do lava rápido, também parente dele, e que o veículo seria deixado em um comércio no próprio bairro.

O carro foi localizado no endereço combinado e devolvido à família, intacto.


O que acontece agora?

A Corregedoria da Polícia Militar esteve em Santa Luzia para acompanhar o registro da ocorrência. Uma cópia da gravação feita por Pedroso ao 190 já está com a Polícia Civil.

A Polícia Militar de Minas Gerais não informou se um processo administrativo interno foi aberto contra o policial, e o que pode acontecer agora que a morte cerebral do jovem foi confirmada. A corporação encaminhou a seguinte nota oficial:

"A Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) esclarece que o policial militar estava de folga e à paisana e que o evento foi registrado pelo 35º BPM, com acompanhamento da Corregedoria da instituição. O policial militar foi preso em flagrante delito e conduzido à delegacia de plantão da Polícia Civil para adoção de providências cabíveis e apuração dos fatos".

Wanderson de Oliveira Pedroso foi preso em flagrante por homicídio.

A reportagem apurou que advogados representando o policial acompanharam o registro da ocorrência na delegacia, porém não conseguiu contato com eles até o fechamento deste texto. Tão logo tenha sucesso ou os defensores se manifestem, esta reportagem será atualizada.