Combinação entre os esportes e o turismo ecológico, o chamado turismo de aventura era a principal modalidade praticada no lago de Furnas, onde se deu a tragédia na cidade mineira de Capitólio. Informações da Associação Brasileira de Ecoturismo e Turismo de Aventura (Abeta) apontam que a busca por esse tipo de atração aumentou durante a pandemia e, com o crescimento da demanda, o número de acidentes também teve elevação, em parte, por desrespeito às normas de segurança e à falta de fiscalização.
Após a tragédia de Minas Gerais, a necessidade de uma maior regulação do turismo ecológico e de aventura ficou ainda mais explícita. O acidente deixou 10 mortos e, embora o deslizamento do paredão no início de janeiro tenha sido considerado "imprevisível", o risco já existia há tempos, segundo especialistas, pois a rocha que caiu estava em processo de erosão.
A Sociedade Brasileira de Geologia (SBG) chegou a emitir uma nota sobre o ocorrido, ressaltando que o acidente traz à tona problemas provocados por falta de laudos geológicos e geotécnicos adequados para avaliar riscos em locais tão frequentados. Mesmo com as fortes chuvas, o ponto turístico não foi interditado, nem houve recomendações para que as visitas fossem evitadas — foi só depois da confirmação de vítimas que a prefeitura decidiu proibir a entrada no lugar.
Experiência segura
A realização de estudos geológicos em locais turísticos foi abordada em uma reunião virtual do Ministério do Turismo com representantes do Fórum Nacional dos Secretários e Dirigentes Estaduais de Turismo (Fornatur). Na ocasião foram discutidas formas de minimizar os riscos no setor, especialmente no ecoturismo. A assessoria do órgão divulgou que pretende lançar — junto ao Ministério do Trabalho — um curso gratuito para capacitar condutores de turismo náutico, entre outras ações.
A Defesa Civil de MG afirmou, em nota ao Correio, que o governo do estado lançou, na semana passada, o grupo de trabalho "Reviva Capitólio — Viva o Mar de Minas", com o objetivo de debater ações de incentivo ao turismo e preservação da segurança na região do lago de Furnas e Peixoto. "As ações envolvem diagnósticos com laudos técnicos e geológicos realizados por órgãos competentes na extensão dos cânions e áreas interditadas, além do ordenamento, regulamentação de uso e ocupação dos cânions e suas águas, por parte dos municípios, visando a segurança dos usuários, trabalhadores e turistas. Depois, haverá a formação e qualificação dos agentes públicos e privados, bem como usuários e turistas, sobre uso seguro da área. E, por fim, haverá o reposicionamento de Capitólio e Mar de Minas como destino seguro dentro e fora do estado com projetos de marketing e promoção", explicou a pasta.
"O Brasil é o segundo em recursos naturais no mundo, então o turismo de aventura e o turismo ecológico são atividades extremamente importantes, especialmente nos momentos atuais, em que as atividades ao ar livre são cada vez mais estimuladas", afirmou a secretária de Turismo do Distrito Federal, Vanessa Mendonça.
Presente na conferência com o Ministério do Turismo, a secretária afirmou que a regulamentação é "essencial" e reiterou: "É muito importante que haja um esforço e uma união para que possamos ter um turismo seguro e oferecer cada vez mais essa experiência. O que aconteceu em Capitólio é uma situação extremamente triste. Deixou claro o quanto é necessário ter esses cuidados e tomar medidas preventivas para que o nosso turista e a população possam ter uma experiência segura".
Desastres naturais
Doutora em Engenharia Ambiental e professora no Centro de Excelência em Turismo da Universidade de Brasília (UnB), Kerlei Eniele Sonaglio citou importância das sete metas globais da plataforma Sendai, cujo acordo firmado na cidade japonesa em 2016, no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU), busca medir o progresso na redução do risco de desastres e perdas. O plano traz objetivos e prioridades de ação para diminuir o total de desastres naturais e reduzir todos os impactos relacionados a eles e acaba contribuindo para um turismo mais seguro e busca conciliar os objetivos do milênio e do Acordo de Paris. O Brasil é um dos signatários do acordo, que tem como campanha "Sendai Seven", destacou a professora. "O Brasil é o país com maior número de municípios inscritos na ação", afirmou. Ela lembrou, porém, que ainda não há uma ação coordenada interministerial e estadual, já que o país apenas se inscreveu, mas não articulou as atividades. Nesse sentido, ela avaliou que "não há um desenvolvimento, frente ao Ministério do Turismo, de segurança turística de modo coordenado, e nenhuma política nacional relacionada a isso". "Deveria haver uma articulação entre a pasta de Turismo e do Desenvolvimento Regional", observou.
A especialista da UnB também reforçou a necessidade de avaliar possíveis áreas de risco. "É importante salientar a necessidade de protocolos de segurança no planejamento e gestão do turismo brasileiro, provenientes de diagnósticos e avaliação de risco e de eventos adversos que podem impactar o turismo no país", ressaltou.
*Estagiários sob a supervisão de Rosana Hessel