Meio ambiente

40 lideranças indígenas desembarcam na COP 26

Grupo é a maior delegação indígena brasileira da história a marcar presença na conferência, onde fica até o dia 12. Povos esperam gerar conscientização de líderes mundiais sobre emergências das comunidades originárias

Cristiane Noberto
postado em 01/11/2021 06:00
Em Glasgow, delegação quer denunciar genocídio e entregar
Em Glasgow, delegação quer denunciar genocídio e entregar "Carta de Tarunã", declaração dos povos da Amazônia frente as mudanças climáticas - (crédito: Tuane Fernandes/Greenpeace)

A 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP26) recebe o maior grupo de lideranças indígenas brasileiras da história do evento. Segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), os mais de 40 representantes dos povos originários começaram a desembarcar em Glasgow, na Escócia, e ocuparão o local da conferência até o último dia de encontro, em 12 de novembro. A delegação quer denunciar genocídio indígena aos líderes mundiais, além do que chamam de “ecocídio” e agravamento das situações por conta da pandemia da covid-19. Os caciques são taxativos: “Não há solução para crise climática sem nós”.


Os indígenas também levam à COP 26 a “Carta de Tarumã”, uma declaração dos povos da Amazônia frente as mudanças climáticas. No documento, os caciques destacam que a crise está diretamente ligada à exploração dos povos e das terras indígenas da Amazônia. Segundo o texto, a pandemia do coronavírus abriu um despertar maior sobre as questões do clima para se “pensar seriamente na necessidade de respeitar a sociobiodiversidade presente em nossos territórios”.


Os povos ainda apontam os trâmites jurídicos no Brasil, como o marco temporal. “Nossos territórios, que são nossos de direito, estão sendo invadidos por garimpeiros e madeireiros; aldeias foram cercadas por fazendas de gado e soja; os rios são contaminados por agrotóxicos e mercúrio; a Floresta Amazônica está em chamas virando cinza; e governos e os fundos econômicos continuam apoiando financeiramente essa ganância desenfreada, a economia da destruição que mata e que destrói a vida e o planeta. (...) Todos precisam mais do que nunca ouvir nosso chamado, de que nós, os povos indígenas, estamos alertando há séculos a partir dos saberes ancestrais que orientam nosso modo de ver e entender o mundo. (...) Não há outro caminho a não ser reconhecer, fortalecer e promover o importantíssimo papel desempenhado por nós, povos indígenas, dentro dos nossos territórios”, diz trecho do documento.


Dados do Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena da Apib, atualizados ontem, mostram que 60.490 indígenas foram infectados pela covid-19, e 162 das 305 comunidades originárias brasileiras foram afetadas. Do total,1.228 morreram, inclusive o último homem da etnia do povo Juma, Aruká Juma. O comitê alerta que a letalidade da doença nos povos é de mais de 50%, comparada ao restante da população brasileira.


Os indígenas acusam despreparo para lidar com o vírus nas terras e apontam hipótese de contaminação levada por agentes de saúde do Estado ou em atos e atividades promovidas pelo governo. De acordo com documentos da Apib, o primeiro caso registrado foi no povo Kokama, no município amazonense Santo Antônio do Içá, onde um jovem foi infectado por um médico de São Paulo a serviço da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) que estava infectado. Desde então, o povo registra o segundo maior número de mortes pela doença, ficando atrás apenas do povo Xavante.


De acordo com o Ministério da Saúde, a Sesai foi responsável por ações nas terras indígenas. “Ao longo de toda pandemia, (a Sesai vem) desenvolvendo estratégias de proteção, prevenção, diagnóstico e tratamento do coronavírus e, também, intensificando a rede logística e o suprimento de insumos e equipamentos de proteção individual (EPIs), estabelecendo fluxos de atendimento nas aldeias, Polos Base, Unidades Básicas de Saúde Indígena (UBSI), dentre outros serviços, a fim de que seja organizado um fluxo específico para a covid-19”, disse a pasta em nota.


Segundo o ministério, foram empreendidos mais de R$ 103 milhões em ações específicas para cuidados dos povos originários. A pasta destacou ainda as ações conjuntas com o Ministério da Defesa, com a finalidade de enviar equipamentos, insumos e apoio de pessoal para as aldeias.

Transparência

Ainda que os esforços do Ministério sejam reconhecidos, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil afirma que a Secretaria Especial de Saúde Indígena é um dos “principais vetores de expansão da doença dentro dos territórios indígenas, alcançando a região com maior número de povos isolados do mundo: o Vale do Javari”.


Segundo a organização, ainda há falta de transparência dos dados, o que impediria a identificação de mais mortes. “Os dados com a sigla SI (Sem Informação) representam esses casos. Mais uma vez denunciamos sobre a falta de transparência e racismo institucional da Sesai e exigimos respeito aos nossos direitos”, escreveram no manifesto “Emergência Indígena”.


O Ministério da Saúde afirmou que fará o reforço das vacinas aos indígenas e também aos adolescentes entre 12 e 17 anos. A Apib fez essa solicitação ao STF no mês passado. Segundo a pasta, a vacinação proporcionou menos mortes e casos graves de covid-19.

 

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