O relatório anual sobre O Estado dos Direitos Humanos no Mundo 2020/21, desenvolvido pela Anistia Internacional (AI) apontou algo que as brasileiras estão acostumadas a enfrentar no seu cotidiano: a violência de todo tipo contra a mulher. Segundo a entidade, foram 120.000 casos de violência física doméstica registrados nos primeiros seis meses do ano no Brasil.
“Em alguns países, autoridades governamentais minimizaram a violência contra as mulheres e cortaram os programas de apoio. Em outros, foram os próprios atores estatais que perpetraram a violência”, adverte outro trecho do documento.
Na semana passada o Brasil acompanhou, ao vivo, um desses casos na prática. Simone Tebet (MDB-MS), a líder da Bancada Feminina no Senado Federal, fez a exposição dos fatos na CPI da Covid para o investigado, o ministro da Controladoria Geral da União (CGU), Wagner Rosário. De acordo com as informações trazidas e analisadas pela parlamentar, ele teria feito “vista grossa” para irregularidades no contrato de aquisição das vacinas Covaxin, na negociação entre o Ministério da Saúde e a Precisa Medicamentos. Ao obter a palavra, a reação do ministro foi chamar Simone de “descontrolada”, atitude que resultou instantaneamente em um bate-boca com os demais senadores da comissão.
Simone tem papel central no Senado Federal. Foi pioneira em diversos cargos que deram mais espaços de voz e oportunidades de atuação para as 12 senadoras do quadro da casa – foi a primeira presidente da Comissão Mista ao Combate da Violência contra a Mulher, a primeira líder do seu partido no Senado, a primeira presidente da Comissão de Cidadania e Justiça (CCJ) e, atualmente, é a primeira líder da Bancada Feminina. Essa última conquista, para ela, bastante importante.
“A criação da liderança da bancada feminina não só nos iguala às bancadas partidárias da maioria e da minoria, como também nos dá voz e nos dá vez. Nos dá voz em um colégio de líderes onde tudo é decidido. Pauta as grandes questões, onde elas são resolvidas e a voz da líder é ouvida, em igualdade de condições. Esse é o principal ponto. A partir daí, obviamente, intervenções em Plenário, discussão de matéria, preferência na ordem da fala... então, ainda que no aspecto mais formal que material, é uma forma de igualar a bancada feminina às demais bancadas”, explica.
Leila Barros, procuradora da bancada, acredita que com a nova forma de organização das senadoras, as pautas femininas andarão em um ritmo mais acertado com os demais assuntos, não apenas em datas comemorativas relacionadas à mulher. “Essa realidade já está sendo alterada. Hoje temos uma bancada unida, instalada oficialmente no Senado, o que nos deu o direito participar das reuniões de definição da pauta de votação e a orientar o voto em todas as votações no Plenário. Pode parecer pouco, mas é muito importante que mulheres vejam outras mulheres ocupando a Tribuna do Plenário na TV, por exemplo”, afirma.
Mais violência no poder
Outro episódio recente no Brasil foram os ataques direcionados à deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP), nas redes sociais, ao anunciar a mudança de partido e conseguir a autorização do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para realizar a desfiliação sem perder o mandato – ela saiu do Partido Democrático Trabalhista e se filiou ao Partido Socialista Brasileiro (PSB). As ofensas foram feitas, inclusive, por um prestigiado ator, José de Abreu. Em contrapartidas às agressões, Tabata recebeu, além do apoio da sociedade civil, a solidariedade da Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados.
Para Simone, a carreira de uma mulher dentro de um espaço de poder não é “premeditada”, deve-se a um esforço, muitas vezes redobrado. A representação do seu cargo para outras mulheres é algo que ajuda a senadora a se empoderar diante de episódios como o que sofreu na última semana ou outros que são repetidamente feitos com outras parlamentares dentro das casas.
“Eu falo não só por mim, mas por todas nós. Eu acredito que o que me fez chegar aonde cheguei foi ter superado as minhas deficiências, os meus medos e ter me imposto de forma incisiva, com coragem. Sempre lembrando, nos momentos de dificuldade, que eu estava ali, representando todas as mulheres brasileiras que não tem voz, que não tem vez, que se encontram de alguma forma discriminadas no seu mercado de trabalho, na sua vida enquanto cidadã. A coragem da mulher, hoje, na política é o que faz com que a gente ocupe cada vez mais esses espaços de poder”, defende.