CORONAVÍRUS

Adolescente que morreu após ser vacinado tinha doença autoimune rara e grave

Evento, considerado grave, foi apontado pelo ministro da Saúde como motivo para suspender a vacinação de adolescentes com produto da Pfizer. Estudo feito por comitê de especialistas, porém, descarta relação entre o óbito e a aplicação do imunizante

Maria Eduarda Cardim
Gabriela Bernardes*
postado em 18/09/2021 06:00
Apesar da conclusão dos especialistas, Marcelo Queiroga diz que vai aguardar o fim das investigações para decidir se mudará o posicionamento    -  (crédito: Wilson Dias/Agência Brasil)
Apesar da conclusão dos especialistas, Marcelo Queiroga diz que vai aguardar o fim das investigações para decidir se mudará o posicionamento - (crédito: Wilson Dias/Agência Brasil)

Um dia após o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, recomendar a suspensão da imunização de adolescentes de 12 a 17 anos sem comorbidades, devido à morte de uma adolescente de 16 anos que havia tomado a vacina da Pfizer sete dias antes, a Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo informou, ontem, que o óbito da jovem, moradora de São Bernardo do Campo (SP), não teve relação com a vacina contra a covid-19. Mesmo diante da análise de SP, a pasta diz que ainda aguarda a conclusão oficial da investigação do caso para mudar o posicionamento.

Segundo o governo paulista, a causa da morte foi uma doença autoimune chamada Púrpura Trombótica Trombocitopênica (PPT). “As análises técnicas indicam que não é a vacina a causa provável do óbito e, sim, a doença identificada com base no quadro clínico e em exames complementares”, afirmou a secretaria, em nota. O órgão informou que a PTT é uma doença rara e grave, normalmente sem uma causa conhecida capaz de desencadeá-la.

“Não há nenhum relato técnico até o momento que aponte este quadro como evento adverso pós-vacinação após primeira dose de uma vacina contra covid-19 de RNA mensageiro, como é o caso da Pfizer”, informou a secretaria. A análise do caso foi feita por 70 profissionais reunidos pela Coordenadoria de Controle de Doenças e do Centro de Vigilância Epidemiológica. Participaram especialistas em hematologia, cardiologia, infectologia e profissionais de outras áreas.

O infectologista Eder Gatti, que coordenou a investigação, afirma que os eventos adversos graves são sempre discutidos por uma comissão de especialistas para se ter uma decisão mais precisa. “As vacinas em uso no país são seguras, mas eventos adversos pós-vacinação podem acontecer. Na maioria das vezes, são coincidentes, sem relação causal com a vacinação. Quando acontecem, precisam ser cuidadosamente avaliados”, explicou o médico, que atua também no Instituto Emílio Ribas, referência em doenças infecciosas.

Mesmo com a conclusão das autoridades locais, o caso segue sendo investigado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A agência indicou que, com os dados disponíveis até o momento, “não existem evidências que subsidiem ou demandem alterações nas condições aprovadas para a vacina”. Ou seja, continua aprovada a aplicação do produto da Pfizer em adolescentes.



Cautela

Mesmo assim, o Ministério da Saúde prega “cautela” e diz que ainda precisa de mais dados para mudar o posicionamento. “O Ministério da Saúde aguarda a conclusão oficial da investigação do caso. Até o momento, a orientação para vacinação apenas em adolescentes com comorbidades se mantém”, disse a pasta, em nota oficial. Em conversa com o Correio, a secretária especial de Enfrentamento à Covid-19, Rosana Leite, disse que o “momento ainda é de cautela”. “Vamos esperar os trâmites oficiais. Tanto a Vigilância do PNI quanto a Anvisa estão investigando este caso”, indicou.

O Correio ainda apurou que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, vê a decisão como transitória, mas ainda não se sabe quando a pasta voltará a recomendar a imunização de jovens sem comorbidades.

Enquanto isso, a intenção é evoluir na vacinação dos idosos, imunossuprimidos e adolescentes com comorbidades. O problema é que muitos estados e cidades já haviam iniciado a vacinação de adolescentes sem comorbidades. Além de gerar embate com as unidades federativas, a confusão desgastou a relação com os especialistas do Comitê Técnico Assessor de Imunizações (CTAI), que não foram consultados sobre a decisão e não gostaram da manifestação da pasta.

Críticas

As críticas também vieram de associações médicas e de especialistas. Em nota, o Comitê Extraordinário de Monitoramento Covid, da Associação Médica Brasileira, afirmou que não há justificativas científicas para a decisão do Ministério da Saúde. “No tocante à segurança desta vacina, a incidência e gravidade dos potenciais eventos adversos evidenciados nesses estudos foram não significativos quando comparados aos benefícios da proteção conferida pelo imunizante”, diz o comunicado da entidade.

A associação afirmou, ainda, recomendar a vacinação da faixa etária, lamentando a decisão do ministério. “A melhora do cenário epidemiológico no Brasil não justifica interrupção da vacinação em adolescentes, e, sim, justamente o inverso. O avanço no controle da pandemia no país se deu única e exclusivamente por, depois de um lamentável atraso, estarmos realizando uma vacinação ampla e rápida da população, incluindo milhões de adolescentes.”, finalizou o comitê.

* Estagiária sob supervisão de Odail Figueiredo

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