À medida que a vacinação avança e que o distanciamento social, aos poucos, deixa de existir, governo criam dispositivos para que o retorno à convivência não seja, também, o caminho para os casos e mortes pelo novo coronavírus voltarem aos altíssimos patamares verificados no começo deste ano.
Um deles é a adoção de um “passaporte” de imunização como exigência para liberar a entrada de pessoas em alguns ambientes. Ontem, a medida foi anunciada na cidade do Rio de Janeiro e, anteriormente, já tinha sido apresentada na capital paulista. Contrário à ideia, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, diz que a medida “restringe a liberdade dos brasileiros” e não ajuda em nada.
No Rio, a apresentação do comprovante de vacinação será necessária para locais de uso coletivo, como academia, estádios, cinemas, teatros e museus. A imunização também será condição para as pessoas que precisam fazer cirurgias eletivas na rede pública ou privada, e também para quem quer ter acesso ao Programa Cartão Família Carioca. O prefeito Eduardo Paes enxerga o passaporte de vacinação como algo necessário para a reabertura da economia e, por isso, quer incentivar a vacinação.
“Nosso objetivo é criar um ambiente difícil para aqueles que não querem se vacinar, que acham que vão se proteger sem a aplicação do imunizante e terão uma vida normal. Não terão. Vão ter dificuldades na hora de ter uma cirurgia eletiva, um programa de transferência de renda, e estarão impossibilitadas de terem lazer e trabalho sem se vacinar”, disse Paes, durante a divulgação do Boletim Epidemiológico da cidade. O Rio já vacina adolescentes de 17 anos sem comorbidades.
Apesar de ter avançado na imunização contra a covid-19, como outros municípios do país, 180.277 cariocas não voltaram para tomar a segunda dose. “Estamos com uma cobertura vacinal boa, mas queremos atingir a perfeição. Isso é o que vai nos permitir flexibilizar essas medidas restritivas”, ressaltou. Segundo a última atualização, 43% da população com mais de 12 anos do Rio possuem a imunização completa.
Em São Paulo, o passaporte da vacina também foi adotado, mas a apresentação do aplicativo que será utilizado para limitar a entrada em vários ambientes foi adiada por causa da falta de dados no sistema. “Gostaria de apresentar isso hoje (ontem), mas ainda nos falta a secretaria do estado liberar os dados para a gente inserir. Se não liberarem, eu vou apresentar de qualquer jeito amanhã no máximo até segunda-feira”, disse o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes.
Ideia rejeitada
Na contramão dos gestores municipais, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse ontem que é contra a adoção de o passaporte de vacinação. A afirmação foi feita durante visita ao Rio de Janeiro, onde visitou a Clínica Renalcor, que realiza o tratamento de pacientes com doença renal crônica.
“Passaporte não ajuda em nada. O Brasil já tem um regulamento sanitário que é um dos mais avançados do mundo. E essas matérias são matérias administrativas. O certificado de vacinação está lá, qualquer um pode pegar. E você começar a restringir a liberdade das pessoas, exigir um passaporte, carimbo, querer impor por lei uso de máscaras para multar as pessoas, somos contra isso”, disse.
Em junho, Jair Bolsonaro havia se manifestado contrariamente à exigência de vacinação para a entrada em alguns lugares. O presidente, que ainda não se vacinou contra a covid-19, já chegou a afirmar vetará caso um projeto de lei que cria um passaporte de vacinação seja aprovado na Câmara dos Deputados. A medida passou no Senado em junho.
“O povo brasileiro é livre e nós queremos que as pessoas exerçam as coisas de acordo com sua consciência. Eu uso máscara porque entendo que é importante e você também. Não é porque tem uma lei que se você não usar máscara alguém vai te multar”, salientou o ministro.
Carioca de 12 anos será vacinado
No mesmo dia em que começou a vacinar adolescentes de 17 anos contra a covid-19, a prefeitura do Rio de Janeiro anunciou o calendário de vacinação para adolescentes com 12 anos ou mais e para idosos a partir de 60 anos. Os adolescentes poderão tomar a primeira dose até 14 de setembro, enquanto aos idosos será ministrada a terceira dose — de reforço — de 1º de setembro a 30 de outubro.
Só serão atendidos os idosos que tenham tomado a segunda dose, há pelo menos, seis meses e, nos 10 primeiros dias, serão atendidos apenas moradores de instituições de longa permanência, como asilos e casas de repouso.
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Proteção reduzida para maiores de 80
A efetividade das vacinas AstraZeneca e CoronaVac cai entre os idosos com mais de 80 anos, como revela novo estudo divulgado, ontem, pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Os cientistas avaliaram a eficácia dos imunizantes em 75.919.840 pessoas que receberam os fármacos no Brasil, entre 18 de janeiro e 24 de julho deste ano. Isso não significa que as vacinas sejam ineficazes contra o novo coronavírus, mas pode haver uma queda de proteção ao longo do tempo e, assim, a necessidade da dose de reforço. Os resultados podem ser determinantes para o planejamento de políticas públicas de vacinação entre os mais velhos.
A pesquisa demonstrou que os dois imunizantes oferecem proteção contra casos moderados e graves de covid-19 causados pelas novas variantes de preocupação em circulação. Ao avaliar os dados por faixa etária, no entanto, constatou-se uma redução na proteção com o aumento da idade. De 80 a 89 anos, a AstraZeneca tem um índice de proteção contra a morte de 89%. O da CoronaVac ficou em 67,2%. Acima dos 90 anos, os índices ficaram em 65,4% e 33,6%.
Coordenado por Manoel Barral-Netto, o trabalho foi publicado em preprint na MedRxiv, site que distribui versões pré-publicação de artigos científicos sobre saúde. Os resultados mostram que as duas vacinas são efetivas contra a infecção, hospitalização e óbito, considerando o esquema vacinal completo (duas doses): AstraZeneca, com 90% de proteção, e CoronaVac, com 75%.
“Já suspeitávamos da influência na idade na queda da efetividade, porque o mesmo ocorre com outras vacinas”, afirmou Barral-Neto, pesquisador da Fiocruz-Bahia. “O que fizemos foi delimitar claramente esse ponto de declínio. A intenção é fornecer dados para embasar decisões dos gestores”, observou.
Fatores
Segundo o estudo, a redução da efetividade pode estar relacionada a alguns fatores. São citados a diferença das plataformas tecnológicas utilizadas em cada um dos imunizantes, a seu impacto sobre a imunogenicidade (capacidade de gerar resposta imune). Há, ainda, o processo natural de resposta imunológica menor entre os mais velhos, a imunoscenecência.
De acordo com os cientistas, com disponibilidade limitada de vacinas, poder identificar com mais precisão os limites de idade em que a proteção imunológica cai é crucial para a implementação de medidas de saúde pública.
“Considerando o atual cenário no Brasil, nossas descobertas demonstram a eventual necessidade de uma dose de reforço vacinal nos indivíduos acima dos 80 anos que receberam CoronaVac e naqueles acima de 90 anos imunizados com a AstraZeneca”, conclui o estudo.
Os resultados podem ser importantes também para outros países que utilizam essas vacinas e não têm populações tão grandes (ou facilidade de acesso dos dados) para aferir a efetividade por faixa etária.
“É uma contribuição para a saúde pública do Brasil mas também para a de outros países que não conseguem fazer esse tipo de análise”, disse Barral-Neto. O pesquisador afirmou que o monitoramento das pessoas vacinadas continua. Na próxima rodada de divulgação de resultados, ele deverá apresentar os dados das vacinas da Pfizer e da Janssen.
“Já suspeitávamos da influência na idade na queda da efetividade, porque o mesmo ocorre com outras vacinas. O que fizemos foi delimitar claramente esse ponto de declínio. A intenção é fornecer dados para embasar decisões dos gestores”
Manoel Barral-Netto, coordenador do estudo da Fiocruz que analisou as vacinas da AstraZeneca e do Butantan/Sinovac