PRESERVAÇÃO AMBIENTAL

Defesa utiliza avião sem piloto para fiscalizar ações contra meio ambiente na Amazônia

Utilizado em operações, equipamento identifica movimentação de veículos e de pessoas, assim como garimpos e áreas de desmatamento

Sarah Teófilo
enviada especial
postado em 09/08/2021 06:00
 (crédito: Fotos: Sarah Teofilo/Esp. CB/D.A Press)
(crédito: Fotos: Sarah Teofilo/Esp. CB/D.A Press)

Novo progresso (PA) — No estado que integra a Amazônia Legal e que possui os maiores números de desmatamento do bioma, a Força Aérea Brasileira (FAB) observou, há quase 70 anos, que uma área poderia ser uma base para as Forças Armadas. Na época, talvez, aqueles que ajudaram a implantá-la não imaginavam que décadas depois funcionaria uma base do Sistema de Aeronave Remotamente Pilotada (SARP) — ou seja, um avião não tripulado.

A base fica na Serra do Cachimbo, no Campo de Provas Brigadeiro Velloso (em homenagem ao pioneiro na implantação da infraestrutura), município de Novo Progresso, e a ferramenta é usada pelos militares no apoio à fiscalização de ilícitos ambientais na Amazônia.

O diferencial da ARP em comparação com satélites, por exemplo, é que as imagens são repassadas em tempo real, além da grande autonomia de voo — ela pode chegar a 30 horas de voo. A aeronave foi usada na Operação Verde Brasil 2, de maio do ano passado a abril deste ano, e agora é utilizada na Operação Samaúma, de 3 de julho a 21 de agosto. A ideia é que as Forças Armadas apoiem as operações de fiscalização dos órgãos ambientais e forneçam as imagens coletadas pela aeronave por meio dos sensores.

A ARP é silenciosa, cinza e pequena. É difícil de visualizar do chão, seja de dia ou de noite, podendo voar a uma altitude de até 10 mil pés. Lá de cima, por meio de sensores, ela consegue identificar movimentos de veículos e pessoas, assim como garimpos e áreas de desmate. Empregada na operação, a aeronave tem capacidade de chegar a qualquer um dos 26 municípios abarcados pelo decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) publicado em junho deste ano, que deu início à Operação Samaúma.

A referida operação é uma espécie de continuação da Verde Brasil, mas mais curta e menos abrangente, envolvendo dois meses de atuação e concentrando esforços nos quatro estados com maior quantidade de desmatamento na Amazônia Legal, quando a Verde Brasil englobava os nove estados que possuem o bioma. A base escolhida fica estrategicamente localizada entre esses quatro estados atendidos pela GLO: Amazonas, Pará, Rondônia e Mato Grosso.

Na base de Novo Progresso, decolagem e pouso são feitos por dois pilotos — um que fica dentro de um container com os equipamentos necessários, chamado pelos militares de “shelter” (abrigo, em inglês), e outro que fica na pista, que tem contato visual com o avião. Depois que está no céu, ele pode ser operado pelo piloto do local até um raio de 350 quilômetros, e em seguida fica com uma equipe de Brasília, em uma estação de controle de ARP, dentro do Comando de Operações Aeroespaciais (Comae), que o opera por satélite, podendo a aeronave chegar a um raio de até mil quilômetros.

Quem determina a localidade a ser mapeada é o Grupo de Integração para Proteção da Amazônia (Gipam), composto por 11 órgãos ambientais e de segurança pública. A missão é dada ao Comae, que discute qual o melhor equipamento a ser usado — como satélite, uma aeronave tripulada ou a ARP. Observando a Operação Samaúma, por exemplo, no primeiro mês foram realizadas 135 horas de voo — o equivalente a 5 dias e meio. No caso do RQ-900, foram quase 12 horas de voo.

Fiscalização
No Comae, em Brasília, enquanto os pilotos mapeiam a área, um servidor de um dos 11 órgãos do Gipam observa as imagens a fim de identificar possíveis ilícitos e coletar dados que embasam ações fiscalizatórias. Se um garimpo é identificado, por exemplo, a aeronave consegue obter imagens detalhadas, sendo possível identificar os maquinários e até as pessoas que lá estão. Já se a aeronave identifica um caminhão transportando madeira de uma área que deveria se manter preservada, é possível acionar órgãos para que façam a intercepção.

Tudo isso é uma ação de inteligência. Por todas essas características, as Forças Armadas sempre mantiveram em máxima discrição o uso do equipamento, que já é usado há 10 anos para diversas outras missões. O SARP atuou em vários eventos conhecidos, como os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos do Rio de Janeiro, e na GLO que determinou a intervenção federal na mesma capital.

Oficial de operações em Santa Maria (RS), o major aviador Vinícius Marques da Rosa Marques afirmou que o grande ganho do SARP é o tempo real. “A imagem em tempo real fornece ao decisor a informação que ele precisa para mover todos os demais meios, gerando uma eficiência muito maior na ação. Essa é a grande vantagem em operações nesse sentido em relação à imagem satelital”, afirmou.

Comandante do Comae, o tenente-Brigadeiro do Ar Sergio Roberto de Almeida ressaltou que o SARP tem uma característica importante, que é a de poder ter uma permanência longa no local. Por outro lado, a aeronave se desloca de uma forma que, para a FAB, é lenta. “Ela pode cobrir um setor por muito tempo, mas não uma área muito grande assim. Por isso tem que fazer esse planejamento criteriosamente para poder usar o sensor o máximo possível”, disse. O sensor da aeronave opera de dia e à noite. O brigadeiro ressaltou que não é possível descartar outros meios — como os satélites — e que eles se complementam.

No total, as Forças Armadas operam cinco aeronaves remotamente pilotadas (ARP), sendo que uma fica em Santa Maria, outra em Santa Cruz (RJ), e as outras duas são da Polícia Federal, e ficam no Rio de Janeiro. O Brigadeiro Almeida disse que a utilização de mais aeronaves não tripuladas para diversos tipos de missão já não é uma questão de “se”, mas de “quando”. “É questão de tempo. A substituição de aeronaves pilotadas para boa parte das missões para ARP vai acontecer por uma questão de tempo. Já temos estudos”, afirmou. 

Base na Serra do Cachimbo

Forças Armadas têm um ponto de pouso na região, no estado do Pará, desde a década de 50. Há mais de 30 anos, o lugar tornou-se o Campo de Provas Brigadeiro Velloso. É lá que fica a base de uma aeronave remotamente pilotada (ARP) que atua no mapeamento de regiões para combate a ilícitos ambientais na Amazônia:

Campo de Provas Brigadeiro Velloso (PA)
Na Serra do Cachimbo; município de Novo Progresso, Pará; Tem 22 km² de área; Pista de 2,6 quilômetros
Na área ocorrem treinamentos da FAB, com exercícios táticos, incluindo provas com armamentos e bombas;
Campo também oferece apoio logístico às organizações em operação na área de exercícios, sendo um ponto de apoio às Forças Armadas, com localização estratégica;
Distâncias (em linha reta)
880km de Manaus (AM)
1.100km de Belém (PA)
700km de Cuiabá (MT)
980km de Porto Velho (RO)
1.046km de Brasília (DF)

Operação Samaúma
Iniciada no dia 3 de julho, a partir de decreto de GLO que autoriza o uso das Forças Armadas no combate a ilícitos ambientais na Amazônia;
Compreende os quatro estados com mais desmatamento na Amazônia Legal: Amazonas, Pará, Rondônia e Mato Grosso;
Forças Armadas instalaram base de uma Aeronave Remotamente Pilotada (ARP) para auxiliar;
Campo de provas foi escolhido por localização estratégica, entre os quatro estados da operação;

Aeronave Remotamente Pilotada - RQ-900
Peso máximo: 1.180 kg
Envergadura: 15,3 metros
Autonomia: 30 horas
Velocidade: até 222km/h
Dois sensores
Operação: diurna e noturna;
Operada por piloto na base, até raio de 350 quilômetros, e depois por satélite, de Brasília

 

*Repórter viajou a convite do Ministério da Defesa

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Especialistas criticam GLOs: "Resultado pífio"

O cenário de devastação da Amazônia continua sendo dramático, conforme apontado por especialistas com base em números recentemente divulgados. Dados divulgados na última sexta-feira pelo Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostraram que uma ação firme em prol da Amazônia continua sendo urgente — de agosto do ano passado a julho deste ano, o acumulado de alertas de desmatamento foi de 8.712km², o segundo pior cenário desde 2015, quando começou a série histórica.

Neste cenário, eles avaliam que os decretos de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) no bioma, com o emprego das Forças Armadas, se mostraram até o momento ineficazes. O primeiro decreto foi publicado durante uma crise, em 2019, com diversas críticas ao governo em relação ao combate aos incêndios nos nove estados da Amazônia Legal. Outra GLO veio em 2020, até abril deste ano. Ambas deram início à Operação Verde Brasil 1 e 2, respectivamente.

Atualmente, está em vigor uma GLO publicada no final de junho, e que deu início à Operação Samaúma, com o emprego das Forças Armadas no apoio para fiscalizar ilícitos ambientais, em parceria com as agências ambientais. Ela teve início no dia 3 de julho e vai até 31 de agosto, sendo uma espécie de continuação da Operação Verde Brasil.

“Os números mostram que essas operações, apesar de um alto custo, se comparadas com operações anteriores, conduzidas pelo Ibama, principalmente, trazem um resultado pífio. São quase como operações inócuas, que fazem propaganda, marketing, para dar a percepção de que o governo está cumprindo o dever de fiscalizar as práticas ilegais na Amazônia”, opinou o diretor-executivo do WWF-Brasil, Mauricio Voivodic.

Porta-voz do Greenpeace, Cristiane Mazzetti também afirma que com base nos dados de desmatamento e de queimadas, “pode-se confirmar que a medida é ineficiente”. “Não deu conta de reduzir significativamente o desmatamento e as queimadas ilegais na Amazônia”, completou.

Objetivo
Por outro lado, o comandante tenente-Brigadeiro do Ar Sergio Roberto de Almeida, do Comando de Operações Aeroespaciais (Comae), diz ter convicção de que o processo de combate ao desmatamento está sendo aprimorado a cada dia. “Cada vez que conseguimos melhores coordenações e utilizações de meios, o resultado vai acontecer. É uma questão de tempo para que esse processo de redução de desmatamento entre em vigor, e o uso dos meios se faz necessário em coordenação. Essa coordenação entre as agências, Ministério da Defesa, Meio Ambiente, é fundamental”, diz.

O Brigadeiro disse acreditar que o uso da aeronave remotamente pilotado (ARP) fará com que no próximo ano o cenário de desmatamento não se repita. “Esse é o objetivo da operação, é a redução do desmatamento”, pontua.

A Operação Samaúma, diferentemente da Verde Brasil, não engloba os nove estados da Amazônia Legal, como a Verde Brasil, mas, sim, os quatro com os maiores números de desmatamento. Até 3 de agosto, a operação embargou, por exemplo, 5,1 mil hectares, realizou uma autuação, aplicou 42 multas, apreendeu 1,6 mil m³ de madeira e 12 armas de fogo, seis maquinários de mineração, oito tratores, dentre outros números. (ST)

Autossuficência de energia
A região do Campo de Provas Brigadeiro Velloso é autossuficiente de energia. No local, encontra-se a primeira hidrelétrica construída na região da Amazônia brasileira. A obra foi feita na década de 1950, pela Força Aérea Brasileira (FAB), e depois foi sendo ampliada a partir da década de 1970. Atualmente, existe uma engenheira elétrica que atua para a Força em Brasília para cuidar da manutenção da hidrelétrica, que fica no Rio Braço Forte.

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