Com o preocupante cenário climático e ambiental em todo o globo, as discussões sobre políticas públicas ambientais e ações sustentáveis ganham cada vez mais espaço nas pautas governamentais e de instituições voltadas ao meio ambiente. Nesta sexta-feira (6/8), a Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria (Secap), ligada ao Ministério da Economia, realizou debate on-line sobre as alternativas atuais para o Brasil em planejamento e desenvolvimento sustentável.
O analista de planejamento e orçamento da Secap, Paulo Coutinho, explicou que as ações do Planejamento voltadas para preservação e recuperação ambiental no Brasil são limitadas devido à baixa participação da pasta nas discussões sobre políticas públicas verdes. ”Tem que ter mais capacidade de coordenação das outras políticas. Hoje, existe comando da organização do planejamento, das normatizações, mas o poder de coordenação que é inscrito no Plano Plurianual (PPA) é relativamente frágil. O planejamento faz (apenas) a implementação da decisão política”, explicou.
Segundo Coutinho, embora a legislação possa abraçar as questões ambientais de forma ampla, existe a visão sistêmica equivocada de que “se está legislado, funciona”. “Muitas vezes essa coordenação fica a desejar, a articulação intergovernamental. A gente vai ter que ganhar por articulação e coordenação das políticas públicas. [...] Se fosse só pela lei o problema estava resolvido. A gente está submetido, não controla, e é melhor observar isso antecipadamente, para dentro do planejamento governamental”, pontuou.
Outro fator encarado como desafio, segundo o analista ligado ao ME, são os acordos internacionais, muitas vezes burocráticos. A ausência desses acordos pode limitar, consideravelmente, a capacidade de atuação do governo. “Às vezes, agimos no planejamento governamental sem ter muitas das informações que seriam relevantes quanto às questões ambientais. São tantos acordos necessários e articulações em divergentes níveis de governo, órgãos internacionais e populações locais, que outras articulações são necessárias”, disse, em referência ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Para ele, o órgão perdeu a relevância e poderia “ganhar um novo papel futuro recuperando o espaço que já teve”, defendeu.
Mudanças climáticas
O aumento do nível do mar e da temperatura do planeta são duas mudanças observadas nos últimos 120 anos, de acordo com Matheus Couto, braço-técnico científico do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), da Organização das Nações Unidas (ONU). Segundo o especialista, nos anos mais recentes, considerados “emergenciais climáticos”, foram observados eventos anormais na Alemanha, Austrália e em diversas outras regiões do mundo, e a tendência é que esse eventos climáticos anormais se tornem cada vez mais frequentes.
“As medidas e os cálculos que se faziam na década de 1990, hoje não são mais suficientes para conter erosões, porque o que chovia em um mês está chovendo em uma semana. Essa concentração está cada vez mais frequente, a emergência climática precisa fazer algo a respeito, mitigar e adaptar”, disse Couto, que participou da live da Secap. Além da chuva e da temperatura, a poluição acentuada também preocupa, segundo o técnico da ONU. “Prejudica a saúde dos ecossistemas e está relacionada à saúde humana, também”, destaca.
Para Paulo Coutinho, atualmente, o governo não está preparado para lidar com as mudanças abruptas apresentadas. “O conjunto de evidências vem confirmando a mudança climática como maior desafio (mundial). Será que nossa estrutura de Secretaria de Planejamento dá conta de formular categorias e perspectivas e solução para isso que tem aparecido? Para os desafios e emergência climática?”, questiona.
Seca, frio e desmatamento
O Brasil enfrenta a maior seca dos últimos 91 anos em 2021. O frio também surpreendeu, marcando no mês de julho a pior temperatura para o período em 20 anos, em algumas regiões do país. As regiões marcadas pelo único bioma exclusivamente brasileiro, a Caatinga (Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Maranhão e também a faixa norte de Minas Gerais), são algumas das que mais sofrem.
De acordo com análise realizada há dois anos pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens e Satélites (Lapis), ligado à Universidade Federal de Alagoas (Ufal), 12,85% do semiárido brasileiro (126.336 km² de território, conhecido como o sertão do Nordeste brasileiro), está se transformando em deserto, segundo monitoramento realizado entre 2013 e 2017 e divulgado em julho de 2019.
Além de enfrentar a dura seca e desertificação dessas áreas, o país ainda sofre com os desmatamentos em áreas de floresta. Segundo Coutinho, embora exista financiamento de construção agroflorestal, que é intensivo e traz evidentes ganhos ambientais, em razão da diferença de tempo de “retorno”, agricultores optam pelo desmatamento e criação de gado. “Às vezes preferem desprezar (o incentivo) e colocar boi, para ter lucro rápido, mas é perigoso”, disse.
Sobre a seca, o analista explica que os estudos científicos sobre as chuvas e o período de seca no Brasil precisam ser acoplados nas categorias do planejamento, urgentemente. “Essas novas visões científicas têm que ser acopladas nas categorias de planejamento, regime de chuvas e secas. A periodicidade disso, a disponibilidade de água, o conflito dos múltiplos usos das águas, isso tem que ser primeiro plano do planejamento”, reforçou.
No mês passado, o Ministério da Defesa inaugurou uma antena multissatelital com a promessa de ampliar a fiscalização de grande parte da Amazônia e reforçar o monitoramento ambiental em todo o Brasil. Um dos desafios enfrentados pelo governo, contudo, é a falta de “braços” para fiscalização.
Para a diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Ana Alencar, o investimento em tecnologia é sempre bem-vindo, mas deve vir acompanhado de ação. “Não adianta investir só em tecnologia e disponibilidade de dados, até porque a tecnologia que já temos já nos dão dados em tempo quase real. É preciso que sejam tomadas medidas contra a questão do crime ambiental , e hoje existe dificuldade de atuação. Esses dados precisam virar ações e as pessoas precisam começar a entender que existe uma governança ambiental e que há punição para quem comete crimes ambientais”, disse, na época do lançamento da nova antena.
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