Mais de um ano depois do começo da pandemia da covid-19, o Brasil ainda não possui um dos pilares necessários para o combate ao novo coronavírus: a testagem em massa da população. Com cerca de 33 milhões de kits distribuídos aos estados, o país não conseguiu testar nem um terço dos brasileiros, estimada em 213 milhões de pessoas, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em abril, a chegada do novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, trouxe a promessa de um programa de testagem em massa. Quase três meses depois, o plano ainda não saiu do papel. Enquanto isso, especialistas reforçam a necessidade da realização de exames para o controle da pandemia no Brasil.
Segundo Queiroga, que reconheceu o baixo desempenho de amostragem do Brasil no ano de 2020, o objetivo era testar até 20 milhões de brasileiros por mês. Em maio, após a confirmação da chegada da variante delta, também conhecida como cepa indiana, ao Brasil, o ministro reafirmou a ampliação da testagem como forma de conter a propagação do vírus. Na ocasião, Queiroga anunciou o envio de 3 milhões de kits aos estados e ao Distrito Federal, a fim de intensificar a mostragem.
Em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI da Covid, no início de junho, o ministro destacou que a pasta estava na iminência de fechar o contrato para a compra de 14 milhões de testes. Na última semana, entretanto, o discurso mudou e o cardiologista afirmou que a aquisição dos insumos necessários para a ampliação da testagem no país é uma das dificuldades que atrasam a saída do plano do papel.“A questão da testagem, vocês sabem que a aquisição de insumos no serviço público não é tão simples assim, ela obedece a critérios que precisam ser seguidos fielmente”, informou em coletiva de imprensa.
Embora as promessas e o anúncio de um quantitativo de testes a serem adquiridos pelo Ministério da Saúde, a secretária de enfrentamento à covid-19, Rosana Leite, informou que a pasta ainda trabalha para definir o número de testes que serão comprados, evidenciando que o problema está bem longe de uma solução definitiva. A secretária também explicou que mais de um tipo de teste será adquirido (veja arte). “Não será apenas um único tipo de teste. Continuaremos a nossa testagem com RT-PCR, com o teste de antígeno, que a tecnologia melhorou muito. Então, a gente tá vendo uma forma mais fácil para poder ter uma maior capilaridade em todos os municípios do país”, indicou.
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Recomendações
Os especialistas ressaltam que a ampliação da testagem deve começar o mais rápido possível para que o país possa ter mais controle da pandemia da covid-19. Segundo eles, testar deveria ser o lema do Brasil, juntamente com a vacinação, que diferente da testagem conseguiu avançar nos últimos meses. “A testagem teve uma evolução ao longo do tempo, principalmente com a entrada de novos testes no mercado. Mas o Brasil sempre foi um país, comparado a outros países, que tem uma taxa de testagem relativamente baixa para o número de casos”, avalia o virologista Fernando Spilki, coordenador da Rede Corona-ômica, força-tarefa de laboratórios que faz o monitoramento genético de novas cepas.
De acordo com o Ministério da Saúde, até o momento, a pasta já enviou 33,7 milhões de testes rápidos e RT-PCR para todas as unidades da federação. No entanto, no LocalizaSUS a informação é outra e o número distribuído passa de 34,2 milhões. Esse desencontro de dados é outro problema apontado por Spilki. O virologista destaca que essa recomendação de testar a população é uma das principais advertências feitas, desde o início da pandemia, pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Segundo ele, o ideal seria a adoção de diferentes estratégias. Além de testar para obter o diagnóstico de um caso suspeito, o exame pode servir para identificar infecções em pessoas assintomáticas, isolar e quarentenar esses indivíduos. “Essa falta de um programa de testagem mais amplo gera janelas para que você não detecte a circulação do vírus”, indica.
Variantes
Diante da possibilidade do crescimento da circulação da variante delta, primeiramente identificada na Índia e já detectada no Brasil, uma testagem ampla auxiliaria no monitoramento dessa e de outras cepas, ressalta o virologista. Spilki é coordenador da Rede Corona-ômica e destaca que o país deveria aproveitar o momento de queda de casos e mortes visto nos últimos dias para adotar o plano de ampliação da rede de diagnósticos.
“É justamente neste momento que cai o número de casos que seria mais inteligente e mais estratégico expressar a metodologia de olhar caso a caso, testar a rede de contatos de infectados. Em momentos de baixa circulação, o ideal era que a gente conseguisse tentar fazer o que não fizemos até hoje com uma testagem estratégica”, avalia.
COLABOROU GABRIELA BERNARDES*