Sociedade

Especialistas indicam possíveis causas para o aumento da violência

Estímulo à compra de armas, discurso homofóbico, falhas no treinamento de policiais e tipificação do crime de feminicídio são alguns dos fatores relatados

Pedro Ícaro*
postado em 19/07/2021 21:07
 (crédito: Fernando Lopes/CB/D.A Press)
(crédito: Fernando Lopes/CB/D.A Press)

O 15º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) na semana passada, registra um aumento da violência em vários aspectos pesquisados pelo anuário. Houve uma alta generalizada em relação a 2019, com mais de 50 mil mortes. Alguns crimes específicos, como feminicídio e agressões à população LGBTQIA+, também registraram aumento.

Especialistas ouvidos pelo Correio indicam possíveis causas para o fenômeno. Ele avaliam que o governo e a sociedade civil têm participação nesse cenário. Há problemas estruturais, como as condições precárias de treinamento de policiais. E uma maior intolerância contra mulheres e minorias, além de uma política pública em favor do uso de armas.   

“A política armamentista, pregada pelo governo federal desde o início, ajuda a explicar, de alguma forma, esses números. A flexibilização do porte e da posse de armas de fogo faz com que o número de armas nas ruas e residência aumente. Os criminosos, por sua vez, passam a ter essas armas como alvo. Uma vez com essas armas em posse, eles as usam para cometer os mais variados crimes”, explica Karlos Gomes, especialista em direito público.

Os dados do Fórum Nacional de Segurança Pública revelam o aumento da violência em diversos aspectos. Houve aumento nos casos de feminicídio, de 1.330 para 1.350. Também foi registrado um recorde de mortes em operações policiais, com 6.416 óbitos — o mais alto registrado desde 2013. O levantamento indicou, ainda, maior violência contra a população LGBTQIA+. O número de homicídios contra esse grupo cresceu 25%, e o de estupros, 21%. De um modo geral, o anuário do FBSP identificou um aumento no número de assassinatos. Foram 50.033 em 2020, um aumento de 5% em relação ao ano anterior, com 47.742 óbitos. 

Segundo o advogado e cientista político Nauê Bernardo Pinheiro de Azevedo, o discurso homofóbico do presidente Jair Bolsonaro pode ser um fator indireto para o aumento da violência por causa da orientação sexual. Essa atitude pode incentivar seus seguidores a cometerem atos violentos contra essa população.

"Se a principal autoridade do país se comporta de um jeito que pode levar pessoas a se sentirem legitimadas a praticar atos contra determinados grupos, não é absurdo pensar que pode haver alguma relação. Isso não quer dizer que o presidente efetivamente pense de modo a autorizar esses crimes, mas muitas pessoas acabam expondo seus preconceitos, inclusive de forma fisicamente violenta, acreditando haver respaldo pelas autoridades”, disse.

Recorde de letalidade policial

O número da letalidade policial foi o maior desde 2013, quando se deu o início dos trabalhos do Fórum. Cerca de 6.416 pessoas morreram, um aumento de 1% em relação a 2019. Também houve um aumento de policiais assassinados, cerca de 194 agentes, porém o número de policiais mortos pela covid foi ainda maior, 472 vítimas.

“Quando falamos em aumento do número de mortes pela polícia, este número deve ser analisado detidamente. Devemos ver quantos casos dessas mortes foram causados por confrontos entre policiais e criminosos. Infelizmente temos, no Brasil, um enferrujamento da atividade policial no Brasil: policiais sem treinamentos e sem condições de atuarem nessas funções; policiais que infelizmente abusam de seu poder para subjugar determinados indivíduos. Para melhorar esses números, é necessário um fortalecimento, treinamento e atualização das forças policiais”, avaliou Karlos Gomes.

Feminicídio

Em relação à violência contra a mulher, há variações importantes. O número de mulheres assassinadas diminuiu de 3.966 para 3.913. Mas os casos de violência motivados pelo gênero — denominados feminicídio — aumentaram de 1.330 para 1.350. Os registros de violência doméstica também tiveram uma queda, mas o número de medidas protetivas aumentou.

“Também há que se considerar o fato de que, finalmente, as autoridades estão investigando com mais precisão esse tipo de crime, trazendo à tona os números assustadores de atitudes violentas contra mulheres que acabam em morte”, diz Nauê Bernardo Pinheiro de Azevedo.

O Correio entrou em contato com o Ministério da Justiça para comentar os dados sobre violência, mas não obteve retorno. O espaço permanece aberto para esclarecimentos. 

* Estagiário sob supervisão de Carlos Alexandre de Souza 

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