Agência Estado
postado em 18/06/2021 16:50 / atualizado em 18/06/2021 16:57
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça negou recurso do Ministério Público do Rio de Janeiro e confirmou decisão do ministro do Reynaldo Soares da Fonseca que determinou que seja contado em dobro todo o período em que um homem esteve preso no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, no Complexo Penitenciário de Bangu, na Zona Oeste da capital fluminense. Na ocasião, Fonseca entendeu que houve violação de determinação da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que reconheceu o instituto como 'inadequado para a execução de penas, especialmente em razão de os presos se acharem em situação degradante e desumana'.
Trata-se da primeira vez que uma turma criminal do STJ aplica o chamado 'princípio da fraternidade' ao decidir sobre cálculo de pena mais benéfico a condenado que é mantido preso em local degradante. "A decisão caracteriza um importante precedente possível de ser aplicado para a resolução de situações semelhantes", registrou a corte em nota.
Durante o julgamento, os ministros destacaram o caráter histórico da decisão. Ribeiro Dantas ressaltou 'a importância e a profundidade do voto' de Fonseca e disse que o acórdão será 'referência'. Já Joel Ilan Paciornik ressaltou que a invocação do princípio da fraternidade é 'extremamente procedente' em hipóteses de 'flagrante violação a direitos humanos pelas condições degradantes e desumanas existentes em determinados estabelecimentos prisionais'.
"O voto consagra um princípio já agasalhado na Constituição Federal o Princípio da Fraternidade, em que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e princípios por ela adotados ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte", afirmou ainda o ministro João Otávio de Noronha. As informações foram divulgadas pelo STJ.
Segundo a defesa do homem beneficiado pela decisão, com a contagem o condenado que cumpriu pena no IPPSC de 09 de julho de 2017 a 24 de maio de 2019 alcançaria o período necessário tanto para a progressão de regime quanto para a condicional. Tal análise caberá à Justiça do Rio de Janeiro.
A decisão confirmada pelo colegiado do STJ reformou acórdão da corte fluminense que aplicou a contagem em dobro a partir de 14 de dezembro de 2018. Em tal data o Brasil foi notificado formalmente de uma Resolução da CIDH que proibiu o ingresso de novos presos no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho e determinou que se computasse 'em dobro cada dia de privação de liberdade cumprido no IPPSC, para todas as pessoas ali alojadas, que não sejam acusadas de crimes contra a vida ou a integridade física, ou de crimes sexuais'.
A determinação se deu após diversas inspeções realizadas pela Comissão - a partir de denúncia feita pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro. No caso em questão, a corte fluminense considerou que a resolução não faz referência expressa ao termo inicial da determinação e assim adotou a regra que 'confere efetividade e coercibilidade às decisões na data de sua notificação formal'.
No entanto, ao analisar o caso, Reynaldo Soares da Fonseca ponderou que, ao aplicar a resolução apenas a partir da notificação oficial feita ao Brasil, as instâncias anteriores deixaram de cumprir a determinação, levando em conta que as sentenças da CIDH possuem eficácia imediata.
"Não se mostra possível que a determinação de cômputo em dobro tenha seus efeitos modulados como se o recorrente tivesse cumprido parte da pena em condições aceitáveis até a notificação, e a partir de então tal estado de fato tivesse se modificado", comentou o ministro.
Ao julgar o caso na Quinta Turma, Fonseca lembrou que o Brasil reconheceu a competência da CIDH em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), aprovada em 1969.
Assim, as sentenças da CIDH são vinculantes para as partes processuais. "Todos os órgãos e poderes internos do país encontram-se obrigados a cumprir a sentença", declarou. Além disso, o relator destacou que é permitido ao Estado ampliar a proteção conferida pelas determinações da corte. Nessa linha, destacou que as sentenças da CIDH devem ser interpretadas da maneira mais favorável possível para quem teve seus direitos violados.
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