A tragédia ocorrida na creche Aquarela, em Saudades (SC), reacende o debate sobre a violência cometida por jovens em ambiente escolar. O caso de Santa Catarina não é isolado, mas chama a atenção porque acontece no contexto da pandemia, marcado pelo isolamento social. Especialistas ouvidos pelo Correio avaliam os fatores que podem desencadear esse comportamento violento. Veja, ainda, outras tragédias que envolvem crianças e adolescentes em escolas, em episódios ocorridos no Brasil e no exterior.
A especialista em direito penal Jessica Marques, do Kolbe Advogados e Associados, explica que o crime de homicídio em massa, sem que haja um objetivo étnico, racial ou religioso, é popularmente conhecido como chacina ou massacre. “No Brasil, se o autor do crime for maior de idade, será punido com pena de reclusão a ser fixada de acordo com as circunstâncias do caso. Se for menor de idade, o autor do crime será punido com medida socioeducativa, que não poderá ultrapassar o prazo de até três anos, segundo determina o Estatuto da Criança e do Adolescente”, explica.
Jessica Marques afirma que a ocorrência de massacres em escolas preocupa, principalmente diante das motivações desses crimes, como bullying e abusos, etc. “Sabemos que o bullying não é a causa isolada dos massacres, que, por diversas vezes, são precedidos de transtornos mentais, de sofrimentos de abusos físicos e psicológicos, abandonos. Mas geralmente é o estopim do cometimento das chacinas, razão pela qual é necessário que se promova o combate dessas condutas”, comenta a especialista.
Marques ressalta que a Constituição Federal e a Legislação determinam que é dever da Família, do Estado e da Sociedade promover a proteção e oferecer segurança às crianças e aos adolescentes, evitando pô-los a situações traumáticas que possam desencadear consequências graves e irreparáveis. “Assim, torna-se necessário o debate sobre questões extremistas, discriminatórias, bem como o combate de situações que levem a criança ou o adolescente a vivências traumáticas que possam desencadear adversidades não previstas e impossíveis de serem controladas”, ressalta.
Danos psicológicos
A psicóloga Débora Wehr, 50 anos, especialista em atendimento clínico escolar e empresarial, acredita que em virtude da pandemia, os crimes em escolas e em aulas presenciais têm diminuído. Mas as agressões continuam.
“Esse tipo de crime, em virtude da pandemia, tem diminuído no nosso país. Mas, se considerarmos esse episódio na cidade de Saudades (SC), e alguns outros que não são abordados pela mídia, tem aumentado sim. É preciso notar, ainda, a mudança no comportamento dos jovens. Houve uma mudança radical em virtude da pandemia, principalmente os crimes de agressão. Se considerarmos que agressões se caracterizam por pequenos gestos; começam por verbalizações, registros. Posteriormente, ela de forma mais forte”, explica Débora Wehr.
Os Estados Unidos é popular pelos ataques que ocorreram nas escolas, porém em vários lugares do mundo houve tragédias do gênero. Nenhum outro caso ficou tão famoso quanto o dos dois jovens que mataram 13 pessoas no Instituto Columbine, nos Estados Unidos, que ocorreu em 20 de abril de 1999. Eric Harris e Dylan Klebold entraram na escola onde estudavam e dispararam várias vezes contra outros alunos. No final do ataque, os dois se mataram. Além da dupla, 12 pessoas morreram e outras 25 pessoas ficaram feridas.
Na Bélgica, no dia 23 de janeiro de 2009, Kim De Gelder, 20 anos, pintou os cabelos de vermelho, aplicou uma maquiagem parecida com a do Coringa e entrou armado num berçário em Dendermonde. Segundo sites de notícias da época, ele esfaqueou 15 pessoas e matou três. Duas delas eram bebês com menos de um ano de idade. A outra vítima foi uma mulher de 54 anos, que trabalhava no lugar.
O pior caso de massacre de estudantes no Canadá aconteceu em 1989, na escola de engenharia da Universidade de Montreal. O responsável pela tragédia foi Marc Lepine, um homem de 25 anos, que “odiava feministas”. Segundo o relato do crime, ele entrou em uma sala da faculdade com um rifle semiautomático e uma faca de caça e ameaçou um grupo de estudantes de engenharia mecânica. Depois de expulsar os homens, enfileirou as nove mulheres da turma e disse: “Estou lutando contra o feminismo. Vocês são mulheres, vocês serão engenheiras. Vocês são um bando de feministas”. E abriu fogo. Além das nove mulheres baleadas na sala de aula, outras 18 foram feridas nos corredores da faculdade. 13 morreram. Após o terror Lepine se matou.
A chacina na creche Aquarela, no município catarinense de Saudades, entra na lista de tragédias ocorridas em ambiente escolar no Brasil. Desde 2002, oito ataques violentos já aconteceram. Relembre:
Salvador (2002)
Em 2002, na capital baiana, um jovem de 17 anos matou duas colegas dentro da sala de aula, em um colégio particular da cidade. Ele foi preso em flagrante. A polícia afirmou que o revólver utilizado pelo autor era de calibre 38, obtido com a ajuda do pai, que era perito policial. Um dos motivospara o crime teria sido uma prova de gincana. O jovem teria prometido se vingar das duas colegas, após ficar inconformado com um dos critérios de avaliação na prova.
Taiúva (2003)
Em janeiro de 2003, em Taiúva (SP), cidade com pouco mais de 5 mil habitantes, um ex-aluno da escola estadual Coronel Benedito Ortiz invadiu o pátio da instituição e disparou com uma arma contra alunos, professores e funcionários. Uma pessoa morreu, outras oito ficaram feridas. Um aluno ficou tetraplégico. Após desferir os 15 tiros, Edimar Freitas, 18 anos, se matou. Ele utilizou um revólver calibre 38.
Realengo (2011)
Em abril de 2011, em Realengo, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, 12 adolescentesmorreram assassinados na escola municipal Tasso da Silveira. Ex-aluno da escola, Wellington Menezes de Oliveira, 23 anos, entrou na instituição com a alegação de queprecisava obter o histórico escolar, para em seguida dar uma palestra. Assim que entrou na instituição, Wellington começou a atirar contra as vítimas na sala de aula. Tudo durou cerca de cinco minutos.
Corrente (2011)
Em abril de 2011, um garoto de 14 anos matou um colega com golpes de faca em Corrente, interior do Piauí. A vítima tinha 15 anos. O fato ocorreu no pátio da escola, enquanto os outros colegas esperavam pelo ônibus. Após ser provocado com palavras, o garoto desferiu golpes com a faca,.
Suzano (2019)
Em março de 2019, pelo menos 10 pessoas morreram em um massacre na cidade de Suzano (SP). Quinze pessoas ficaram feridas, após dois garotos encapuzados e armados adentrarem a escola e atirarem contra alunos.O caso aconteceu na Escola Estadual Raul Brasil, no Jardim Imperador. Após o ato, os dois atiradores também se suicidaram.
*Estagiárias sob a supervisão de Carlos Alexandre de Souza
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