A empresária Rafaela Araújo Braga da Silva, de 21 anos, que acumula mais de 60 mil seguidores nas redes sociais, é investigada por usar o nome de uma empresa de cosméticos de Goiás para vender cursos e produtos que seriam falsificados em sua clínica, em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Nesta semana, além dela, foram presos suspeitos de participarem do esquema a mãe da empresária, Margarida Batista de Araújo Braga; o pai, Américo Cristóvão Braga da Siva; e Wendell Venâncio Gonçalves.
Nesta sexta-feira (9/4), os quatro tiveram a liberdade provisória concedida pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) sem pagamento de fiança.
A situação revoltou mulheres que se sentiram lesadas por Rafaela. Quinze delas já entraram com ação na Justiça por danos morais e materiais e relataram as angústias vividas pelas promessas e pelos procedimentos feitos pela suposta esteticista.
A advogada Natália Alves de Freitas trabalha no caso ao lado da sócia Maria Inês Daldegan Pedrosa. Elas representam esse grupo de mulheres.
"Tomamos conhecimento no final de agosto do ano passado. Fomos procuradas por uma cliente insatisfeita, que me colocou em contato com um grupo de moças indignadas com os resultados dos tratamentos estéticos. Pessoas que se submeteram aos procedimentos e tiveram reações como irritação na pele e relataram que as manchas estavam voltando", conta Natália Alves.
As vítimas afirmam que Rafaela prometia um tratamento milagroso para melasma – problema dermatológico caracterizado por manchas escuras na pele.
Foi o caso de uma das vítimas que acionaram Rafaela judicialmente. A mulher, que prefere não se identificar, contou sobre a experiência vivida em julho do ano passado: "Faço tratamento de pele há muito tempo. Sei que melasmo não tem cura, mas sempre venho buscando formas de minimizá-lo, e isso existe. Pelas questões de algoritmo, essa Rafaela estava sempre aparecendo na minha tela e fiquei intrigada, pois ela garantia a cura".
Chamou a atenção da vítima o fato de a suspeita ter mais de 60 mil seguidores, sinal de as pessoas estavam interessadas, na avaliação dela. Foi quando marcou uma consulta em que pagou mais de R$ 1 mil.
"Era uma clinica na casa dela, em Contagem. Ela me atendeu, indicou o tratamento e logo disse: 'você tem que fazer uma limpeza de pele'. Quando o procedimento começou, percebi que ela não tinha conhecimentos técnicos. Ela fez uma limpeza muito próxima ao meu globo ocular de forma agressiva", conta.
Aainda disse que o tempo todo Rafaela fazia fotos e vídeos para a produção de conteúdo. Após a consulta, Rafaela indicou que comprasse outras pomadas para dar continuidade ao tratamento. As embalagens não continham nenhuma informação técnica.
Com o passar dos dias, o rosto da vítima ficou inchado e vermelho. "Enviei uma mensagem pra ela, e ela disse: 'continue passando. É assim mesmo'", relembra.
A mulher afirma que Rafaela postou nas redes sociais uma foto do "antes e depois" dela, porém, as fotos não correspondiam à realidade. Ela acredita que foram editadas.
Pressão estética
A situação foi traumática, mas ela acreditava se tratar de fato isolado: "Achei que era um problema meu. Até que me colocaram em um grupo com mais 100 meninas e todo mundo começou a reclamar. Vi que não era só comigo. Os relatos eram muito tristes, mulheres que fizeram empréstimo para bancar o tratamento".
Associado ao prejuízo financeiro, as clientes foram vítimas de um dano muito maior, que é a diminuição da autoestima.
"Existe essa questão do padrão inalcançável que leva as pessoas a cada vez mais procurarem procedimentos estéticos até bem invasivos. E isso abre caminho para pessoas como Rafaela, que se aproveitam dessa esperança", relatou.
A investigação policial
As investigações da polícia começaram após denúncia das empresas de Goiás referente à falsificação de rótulos e produtos de cosméticos.
O verdadeiro dono da empresa precisou registrar um boletim de ocorrência (BO) depois de receber uma série de reclamações.
Após diligências e oitivas, foram encontrados indícios de que Rafaela estaria cometendo os crimes de falsificação de produtos da linha Perfect Skin e Melan Peel, além de falsificação de rótulos.
Inclusive, uma das marcas publicou uma nota nas redes sociais. Veja abaixo:
A polícia cumpriu um mandado de busca e apreensão nas residências dos supostos envolvidos. Nessa quinta-feira (9/4), a polícia foi até a casa do pai de Rafaela, que acabou sendo presa na clínica, no Bairro Inconfidentes, em Contagem.
Procurada pelo EM, a Polícia Civil afirmou que todas as informações sobre a investigação serão repassadas em coletiva on-line na segunda-feira (12/4).
A prisão e soltura
Nesta sexta-feira, foi concedida a liberdade provisória sem fiança pelo Ministério Público.
O órgão se manifestou pela concessão de liberdade provisória aos conduzidos, com imposição de medidas cautelares, como monitoração eletrônica, comparecimento periódico em juízo, proibição de afastamento da comarca por mais de dois dias, entre outros.
O documento assinado pelo juiz de plantão Haroldo Dutra Dias informa que "ao examinar o auto de prisão em flagrante delito, verifico que foram observadas as formalidades exigidas pela lei processual penal, de sorte que não vislumbro qualquer vício que venha maculá-lo em relação aos crimes de depósito de produtos de procedência ignorada e formação de organização criminosa, diante da existência do lastro mínimo probatório, mormente com base no auto de apreensão, nos relatos das testemunhas e das vítimas."
Ainda aponta que o crime de falsificação de produtos cosméticos e/ou terapêuticos é não-transeunte, sendo indispensável a perícia para sua verificação, o que ainda não consta nos autos.
"Ademais, o crime de depósito de produtos cosméticos sem registro na Anvisa, em que pese não exigir perícia, reclama a juntada da respectiva informação da Autoridade Sanitária sobre a ausência do registro, ou, ao menos, algum documento equivalente, o que também ausente no presente feito."
O outro lado
Jonatas Honório e Thiago Ramos, advogados da defesa de Rafaela, conversaram com o EM.
Jonatas diz que "Rafaela nunca se apresentou como esteticista. Mas ela possui mais de 40 certificações, incluindo, algumas internacionais na área de beleza."
Ele confirmou que ela fazia alguns procedimentos não invasivos na área da pele: "Nunca houve promessa de resolver problema de doença da pele. O tratamento era para melhorar a pele da pessoa e ainda havia um prazo pra melhoria".
Questionado sobre o processo das 15 mulheres, ele afirmou que "é um numero aceitável pra qualquer empreendedor com muitos clientes."
Sobre a prisão, o advogado alega que "a autoridade policial, em um processo ainda em investigação, entendeu realizar a prisão". E completa: "Seis horas depois, por meio de um habeas corpus da defesa, o MPMG deu parecer a lberdade".
Jonatas ainda informou Rafaela vem sendo vítima de crimes contra a sua honra, por dois perfis fake no Instagram. "A notícia crime já foi protocolada junto à Delegacia de Crimes Cibernéticos de Belo Horizonte, para apurar quem é o anônimo por detrás dos perfis", finaliza.