A epidemiologista e líder técnica de resposta à covid-19 na Organização Mundial da Saúde (OMS), Maria Van Kerkhove, disse, nesta quinta-feira (1°/4), que é crítica a situação da pandemia do novo coronavírus no Brasil. A avaliação foi feita no mesmo dia em que o Brasil chegou perto, novamente, dos 4 mil mortos pela covid-19 em apenas 24 horas: 3.769 óbitos, de acordo com números do Ministério da Saúde e do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass). Isso representa que a média móvel de vidas perdidas no país, nos últimos sete dias, ficou acima da marca de 3 mil pela primeira vez. Comparando-se com a média de 14 dias atrás, a variação foi de aproximadamente 40% — o que aponta tendência de alta no número de mortes pela doença.
Van Kerkhove destacou que, com a variante amazonense P.1, que é mais transmissível, o sobrecarregado sistema de saúde pode ficar totalmente comprometido. “Há uma situação muito séria no Brasil no momento, quando temos um número de estados que estão em situação crítica. Os desafios são diversos. Em termos de transmissibilidade, com a variante P.1 que foi detectada e está circulando no país, se você tem um vírus mais transmissível, tem mais casos, e isso pode sobrecarregar o sistema de saúde, que já está sobrecarregado”, afirmou, em resposta a um questionamento do Correio.
A epidemiologista salientou que a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) está trabalhando com os estados e o país para se certificar de que tenham insumos para cuidar dos pacientes, como oxigênio e todo o suporte necessário. A epidemiologista ainda ressaltou que há uma disparada de hospitalizações e demanda por leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), com aumento de casos graves em todas as idades, incluindo os mais jovens, entre 20 e 60 anos.
Diretora-geral-assistente da OMS, a brasileira Mariângela Simão afirmou que a OMS “está muito preocupada com o que está acontecendo no Brasil”. Conforme explicou, a produção local de imunizante é um aspecto muito importante neste momento, porque, apesar de o país estar recebendo imunizantes pelo Covax Facility — consórcio administrado pela agência das Nações Unidas —, o Brasil consegue produzir suas próprias vacinas pelo Instituto Butantan e pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). “E isso é essencial, considerando a pressão que existe em relação aos insumos”, observou.
Mariângela ainda reforçou que não basta se pautar na disponibilidade de fármacos, mesmo quando o país tem boa cobertura vacinal. Para ela, é importante manter as medidas de prevenção e evitar aglomerações. “É importante que não haja uma falsa sensação de segurança por conta da disponibilização de vacina”, afirmou.
Ameaça mundial
Esta não é a primeira vez que a OMS alerta para a gravíssima situação do Brasil. No início do mês, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom, disse o país é uma ameaça para a América Latina e para o mundo. Na ocasião, ele salientou que era preciso adotar medidas de saúde “agressivas”, enquanto distribuía a vacina às pessoas.
Ontem, Tedros propôs que países que tenham doses excedentes as enviem ao consórcio Covax, a fim de que se possa encaminhá-las às nações que ainda não tiveram acesso à vacina. Ele também salientou a necessidade da criação de um “tratado pandêmico” internacional diante de emergências futuras.
“Não é uma questão de ‘se’, mas de ‘quando’. Um aspecto chave que pode ser consagrado no tratado é ter uma força de trabalho mais forte, que é a essência da resiliência dos sistemas de saúde”, explicou, acrescentando que, antes da pandemia, já se sabia que havia uma falta de aproximadamente 18 milhões de trabalhadores no setor.