Coronavírus

Profissão: motorista de ambulância em São Paulo durante a pandemia

Com a chegada da pandemia no país empresas privadas que prestam serviços de transferência de pacientes com covid-19

Agência France-Presse
postado em 23/04/2021 19:44
 (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
(crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)

Carlos Marques trabalha há 12 anos como motorista de ambulâncias no interior do estado de São Paulo. Não foi uma preparação suficiente para os dias desafiadores que vive com a explosão de casos de coronavírus no Brasil.

"A gente espera que hoje seja um dia melhor. Vamos torcer para que não seja tão ruim como os outros dias estão sendo, pegar pessoas desesperadas, chorando. Afinal de contas, mexe com a gente, porque a gente tá ali do lado, presenciando o sofrimento das pessoas", diz Marques, minutos antes de iniciar um plantão na madrugada na semana passada.

Marques, de 52 anos, é formado em primeiros socorros. Além de dirigir, ele ajuda duas enfermeiras com quem divide o turno a transportar pacientes, em caso de necessidade.

Com a chegada da pandemia no país, ele foi contratado por uma empresa privada que presta serviços a um hospital para transferência de pacientes com covid-19 em Santo André, no cinturão industrial da capital econômica do país.

Ele faz turnos de 12 horas, com um dia e meio de descanso entre eles. Mora com esposa, filha e quatro netas em duas simples casas vizinhas que ele mesmo construiu na humilde zona leste da cidade de São Paulo. Nunca contraiu a doença, mas teme que sua exposição acabe afetando a família.

As histórias que testemunha costumam ser tristes, como a de um casal que fez duas viagens diferentes a um hospital.

"Os dois foram intubados e morreram, com intervalo de dez minutos um do outro. E quando eles foram para o hospital, apesar de (estarem com estados de saúde) ruins, eles foram conversando. E isso me marcou muito, porque é uma coisa muito... Um casal, imagina... Não foi fácil, me marcou também", relata durante uma pausa no meio da manhã.

Este mês, quando o Brasil registrou mais de 4.000 mortes por covid-19 em 24 horas, Marques transportava até 16 pacientes em um único dia.

O país mais populoso da América Latina, com 212 milhões de habitantes, totaliza mais de 380.000 mortes - dessas, mais de 90.000 no estado de São Paulo.

Em termos absolutos, o país só é superado pelos Estados Unidos, embora a taxa de mortalidade por 100.000 habitantes seja a mais alta de toda a América e do hemisfério sul.

O total de casos chega a 14 milhões, número superado pelos Estados Unidos e a Índia.

Poucas notícias boas 


A curva de mortes e contágios parece ter parado de subir, mas ainda não há muito tempo para pausas no dia a dia desse motorista.

Em uma das ligações que recebeu, lhe informam que uma paciente que deve ser transferida para outro hospital está se recuperando e logo poderá voltar para casa.

"É muito bom!", afirma Marques. "Geralmente a gente pega o paciente chorando. Preocupado porque a maioria que vem pensa que já vai morrer, né? Quando a gente pega gente assim, que é uma semi-alta, a pessoa sai feliz e a gente fica feliz também", diz, sorrindo.

Marques já foi vacinado contra a covid e diz que seu sonho é que todos sejam imunizados no Brasil, onde apenas 13% dos habitantes receberam a primeira dose até agora (e 5% a segunda).

Apesar de lamentar o baixo salário, não esconde a satisfação pela gratificação pessoal: "Gosto de voltar para casa, mesmo cansado, e saber que fiz um trabalho importante para a comunidade. Tem gente que nos cumprimenta ou aplaude. Alguns nos chamam de heróis. Essa é uma boa profissão".

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