Uma das mulheres de maior destaque na história brasileira nasceu no mesmo dia em que se celebraria, anos depois, o Dia Internacional da Mulher. Trata-se de Maria Gomes de Oliveira, mais conhecida por Maria Bonita. Uma personagem que representa força e independência ao ter trocado uma vida tradicional pelos anos no cangaço. Se estivesse viva, a precursora feminina desse movimento completaria 110 anos em 2021.
Mesmo antes do cangaço, Maria se mostrava uma mulher com características diferentes do habitual. Baiana de Jeremoabo, casou-se quando tinha 15 anos com o sapateiro José Miguel da Silva, o Zé do Neném, com quem teve um relacionamento marcado por infidelidades e agressões por parte do companheiro. Ainda assim o questionava. Por vezes, saía para morar na casa dos pais e não deixava de dançar. Mesmo com outros homens.
Em uma época em que as mulheres não podiam votar ou pedir o divórcio, ela conheceu Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião. Cangaceiro que já tinha fama em todo Brasil e era admirado por Maria. Entre encontros durante passagens dele pela fazenda em que os pais dela viviam, ela pediu para acompanhá-lo no cangaço. Aos 20 anos, deixou o casamento para uma nova vida.
"Ela entra no cangaço em 1929. No primeiro ano, de 1929 até 1930, ela não vai peregrinar com o grupo, e fica em um deserto de tribos indígenas no sertão da Bahia", conta o historiador especialista em cangaço Frederico Pernambucano. "Ela foi uma precursora. Quando Maria Bonita se insinua para acompanhar o bando e ele se apaixona, Lampião deve ter procurado ilação para romper a tradição do cangaço e assim aceitar a presença da primeira mulher, que foi Maria Bonita", completa.
Pernambucano também relata que nos nove anos em que esteve ao lado de Lampião, Maria demonstrou independência: "Ela era vista com muito respeito, de certo modo, com muita admiração pelas mulheres". E destaca que no cangaço, as mulheres tinham uma liberdade maior que a oferecida pela época, mas ainda não eram livres.
"Se a mulher quisesse cozinhar, ela cozinhava. Tinha a liberdade de fazê-lo ou não. O que se diz é que as mulheres viviam para 'luxar', para se perfumar. O papel da mulher não era combater", afirma. "Tinha uma liberdade de vida, mas no fundo, era como a tradição, tanto da cultura pastoril quanto da subcultura do cangaço, em um ponto que não inovou, era que a mulher era uma propriedade do seu homem. Se houvesse adultério, o marido traído poderia matá-la", destaca Pernambucano.
O historiador também descreve que Maria Bonita auxiliou Lampião no processo de criar uma identidade estética para o cangaço. Isto é, no processo de confecção de peças e bordados que fizeram parte da história do grupo. "Quando tinha uma outra cangaceira, ela juntava as mulheres para fazer a bolsa que o cangaceiro usava. Ela colabora na criação de uma verdadeira revolução estética que o Lampião introduz no cangaço na década de 1930."
Gravidez e morte
Segundo perfil biográfico divulgado pela Fundação Joaquim Nabuco, Maria Bonita engravidou ao ter ido viver com Lampião, mas teve um aborto espontâneo. Em 1932, no entanto, ela engravidou novamente e deu à luz a uma menina no meio da caatinga, com a ajuda do companheiro. A filha, Expedita, foi criada por pessoas próximas ao casal que não viviam no cangaço, já que o movimento proibia a presença de crianças.
Maria Bonita morreu em 28 de julho de 1938, após um ataque surpresa de policiais ao local de esconderijo do bando, na fazenda Angicos, no sertão de Sergipe. Ela foi baleada e não resistiu. Lampião também morreu durante o ataque.