Em 24 horas, o Brasil registrou 2.815 mortes causadas pela covid-19 e já acumula 290.314 mortos, segundo dados colhidos pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde e reproduzidos pelo Ministério da Saúde. Dezesseis unidades da Federação, segundo a última edição do Observatório Covid-19, elaborado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), estão com taxas de ocupação de leitos de Unidade de Terapia Intensiva acima dos 90%. Esses dados reunidos explicam a razão pelas quais já há pessoas morrendo nas filas de espera de uma UTI.
Em São Paulo, epicentro da doença, mais de 100 pessoas assistidas na rede estadual perderam a vida enquanto esperavam por uma vaga. Pelo menos 25 municípios paulistas, incluindo a capital, anotaram óbitos de pacientes que não chegaram a receber tratamento intensivo. A lista considera infectados que deram entrada em unidades de saúde e tiveram a transferência para a UTI por meio da Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde (Cross), mas não resistiram. Os motivos vão desde a demora em conseguir um leito, passando pela gravidade do estágio da infecção apresentado pela pessoa ou, ainda, a instabilidade do paciente — que não permitia o transporte seguro.
Foi o caso de Renan Ribeiro Cardoso, 22 anos, que morreu na UPA São Mateus II, na capital paulista, 20 minutos após ter conseguido uma vaga na UTI, porém, sem conseguir ser estabilizado para a transferência. No interior do estado, em 2 de março, Márcia Aparecida da Luz, 38, também não resistiu após três dias de espera por um leito de terapia intensiva. Ela e o marido foram internados no mesmo dia, mas só ele conseguiu ser transferido para Sorocaba. “É triste saber que ela poderia ter sido salva se houvesse vaga para internação”, disse a sobrinha Graciele Antunes, 36.
Segundo a Secretaria de Saúde de São Paulo, a demanda de transferências para casos de covid-19 registrada na Central de Regulação cresceu 117% em comparação à primeira onda. Atualmente, são 1,5 mil pedidos por dia, contra 690 em junho de 2020, auge da pandemia no ano passado.
Estoque baixo
Em termos de assistência médica, nem mesmo para quem já ocupa uma vaga na UTI a situação melhora. Isso porque o país vive uma crise no fornecimento de oxigênio hospitalar e de medicamentos necessários para manter pacientes intubados. Segundo levantamento feito pelo Fórum Nacional dos Governadores, ao menos 11 medicamentos usados na terapia intensiva estão em falta ou com estoque apenas para os próximos 20 dias, em diversas unidades da Federação.
“De acordo com dados da última semana, ao menos 11 medicamentos estão em falta ou em baixa cobertura (entre 0-20 dias) em mais de 10 estados; notadamente, a situação mais grave refere-se aos bloqueadores neuromusculares, que estão em falta ou em baixa cobertura (entre 0-20 dias) em pelo menos 18 estados”, detalha o texto dos governadores enviado ao Palácio do Planalto e ao Ministério da Saúde.
O documento — assinado pelo coordenador de temas relacionados ao enfrentamento à covid-19 do fórum e governador do Piauí, Wellington Dias, e por outros 11 governadores — ressalta a irregularidade no abastecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) de bloqueadores neuromusculares, anestésicos e sedativos, utilizados na intubação de pacientes.
Em busca de uma solução, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) anunciou, ontem, que adotará medidas regulatórias emergenciais para enfrentar a escassez dos remédios. Entre elas, a flexibilização de critérios para importar esses medicamentos e até mesmo a possibilidade de importação direta de insumos por hospitais e redes privadas.
Para piorar esse quadro, as vítimas da covid-19 ainda têm que contar com o funcionamento do equipamento e torcer para que não haja intercorrências, tal como aconteceu em Campo Bom, na Grande Porto Alegre. No hospital Lauro Reus, seis pessoas morreram por falta de fornecimento de oxigênio devido a uma falha no sistema. A direção da instituição está apurando o que causou o problema.
(Colaboraram Alexia Oliveira e Pedro Ícaro, estagiários sob a supervisão de Fabio Grecchi)
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Pacheco pede doses a Kamala
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), remeteu, ontem, carta à vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, solicitando autorização para que o Brasil compre doses de vacina contra a covid-19 estocadas nos EUA, mas que ainda não têm aval para uso naquele país — referindo-se à vacina da Oxford/Astrazeneca, que ainda não tem a homologação das autoridades sanitárias e de saúde norte-americanas. Ele ressalta, no documento, que os brasileiros vivem um período de “angústia e sofrimento” com o agravamento da pandemia do novo coronavírus. “Tenho a honra de dirigir a vossa excelência, em nome do Congresso Nacional, o pleito de que seja considerada a eventual concessão de autorização especial que permita a aquisição, pelo governo brasileiro, de doses de vacina estocadas nos EUA e ainda sem a previsão de serem utilizadas localmente”, pediu o senador. A mensagem foi enviada à Embaixada no Brasil, endereçada à vice, que também preside o Senado norte-americano.
Remédios estão em falta
Diante do risco de desabastecimento, o Ministério da Saúde solicitou a entrega dos estoques das fábricas dos medicamentos para intubação de pacientes nos leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTI) para a covid-19. Mas a medida pode ser inócua. Isso porque o presidente do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), Nelson Mussolini, afirmou que o estoque desses insumos chegou ao limite.
A crise ocorre devido ao aumento de casos graves de infecção pelo novo coronavírus e à explosão das internações em UTIs. Com uma demanda muito superior à normal, os fabricantes não conseguem suprir a demanda, apesar do aumento na produção. “Em condições normais, eu pedia 10 e recebia 10. Com a pandemia, preciso de 10 e recebo a metade. O fabricante está me entregando cinco e os outros cinco vão para outro hospital, que também está precisando”, explicou Dan Gedankien, assessor da Sindusfarma.
Farid Buitrago, presidente do Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF), disse que o temor da falta de insumos nos hospitais para a intubação dos pacientes é real. “É uma situação grave, pois esses medicamentos são fundamentais para fazer a sedação do paciente e, assim, se possa realizar um tratamento adequado. Os que podem vir a faltar são os relaxantes musculares. Se um paciente não tiver o medicamento para ser sedado e, depois, intubado, pode vir a óbito. Existem medicamentos que podem substituir, porém, não têm o mesmo efeito”, alerta.
Uma técnica em enfermagem em um hospital de Brasília, que pediu para não ser identificada para não sofrer represálias, citou que são diversos os produtos que estão em falta nos hospitais do DF. Ela recebe relatos diários de colegas sobre as carências e também vive o problema na unidade em que trabalha. “Os leitos não são as únicas coisas que faltam nos hospitais. Já começa a haver desabastecimento de materiais simples, mas necessários, como luvas, agulhas, seringas e acessos intravenosos”, observou.
*Estagiárias sob a supervisão de Fabio Grecchi
Contrato com Pfizer e Janssen é fechado
Depois de ser cobrado por prefeitos e governadores para acelerar a vacinação contra a covid-19, e de receber aval Congresso, o Ministério da Saúde finalmente assinou, ontem, os contratos para a compra dos imunizantes fabricados pelos laboratórios Pfizer/BionTech — 100 milhões de doses — e Janssen/Johnson & Johnson — 38 milhões. Ao todo, o governo federal investiu mais de R$ 7,7 bilhões na aquisição dos fármacos, que começarão a ser entregues entre abril e junho.
Segundo o ministério, o cronograma de entregas acordado no contrato com a Pfizer prevê a chegada dos primeiros 13,5 milhões de doses entre abril e junho, e os 86,5 milhões restantes entre julho e setembro. Já o calendário acertado com a Janssen aponta para a disponibilidade de 16,9 milhões de injeções entre julho e setembro, e outros 21,1 milhões entre outubro e dezembro de 2021.
“Cabe ressaltar que o cronograma de entrega das vacinas é enviado ao Ministério da Saúde pelos laboratórios e está sujeito a alterações, de acordo com a disponibilidade de doses e a real entrega dos quantitativos realizada pelos fornecedores”, disse a pasta em nota.
A primeira vacina a receber o registro definitivo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) foi a da Pfizer, em 23 de fevereiro. Já a da Janssen ainda não tem nem mesmo a autorização de uso emergencial concedida pela Anvisa — só depois vem a homologação. No entanto, na última semana, a Organização Mundial da Saúde (OMS) aprovou o uso emergencial da vacina de dose única da subsidiária da Johnson & Johnson.
Longa negociação
Os dois laboratórios passaram por um longo período de negociação com o governo federal, que recorreu ao Congresso para a flexibilização das regras de aquisição, obtendo a segurança jurídica que pretendia para a assinatura do contrato. O impasse era, sobretudo, devido à exigência de isenção, pelas empresas, da responsabilidade para eventuais efeitos colaterais que as vacinas possam causar. O imunizante da Pfizer, por exemplo, foi oferecido em agosto de 2020, mas o ministério se prendeu à burocracia e nem mesmo um pré-contrato foi acertado — o que poderia ter feito com que o brasileiro já em dezembro estivesse sendo vacinado.
Enquanto as novas doses não chegam, a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP) pediu ao ministério que reavalie a necessidade de reservar metade das doses da CoronaVac, entregues aos estados e municípios, para garantir a segunda aplicação. Segundo os gestores municipais, existe atualmente um fluxo de produção do Instituto Butantan capaz de suspender a estocagem para a rodada adicional de imunização, algo que, na opinião dos prefeitos, aceleraria a campanha de vacinação.
A FNP propõe a reserva de apenas 10% das doses e não mais 50%, assim mesmo a título de segurança. “O pedido se dá no intuito de ampliar o alcance tempestivo de mais pessoas, acelerando a imunização da população brasileira. Ação urgente, diante dos números alarmantes de casos e trágicos de mortes em nosso país”, justifica a carta enviada ao ministério. (BL e MEC)