Diante da falta de vacinas disponíveis no Brasil para realizar a imunização contra o novo coronavírus, gestores estudam usar todas as doses disponíveis dos imunizantes já distribuídos pelo Ministério da Saúde. É o caso de São Paulo, que nessa quarta-feira (27/1) anunciou a intenção de vacinar mais pessoas, ampliando o intervalo entre a primeira e segunda doses da CoronaVac de 28 para 43 dias. A orientação do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), no entanto, é contrária.
Antes do anúncio de SP, o Conass fez um alerta na última terça-feira (26) para a necessidade de reservar a segunda dose, já que o tempo entre a primeira e a segunda aplicações pode ser de até 28 dias e não há garantia de que novas doses chegarão a tempo de serem aplicadas.
Assessor técnico e coordenador do Núcleo de Epidemiologia do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Nereu Mansano alertou sobre a necessidade de se reservar a segunda dose, e não aplicar os imunizantes em mais pessoas, na confiança de que as próximas doses chegarão no prazo correto para a aplicação da segunda dose.
"Por que essa segunda dose precisa ser reservada? Porque a segunda dose precisa ser feita em até quatro semanas, e eu não tenho garantia de que eu vou ter uma entrega suficiente para já garantir essa segunda dose. Então, eu tenho que manter essa reserva e justamente, por isso, a nossa orientação foi que a própria gestão estadual sempre que possível faça a reserva por uma questão de segurança”, disse, referindo-se à CoronaVac, vacina da farmacêutica chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan.
O espaçamento entre a aplicação da primeira e segunda doses do imunizante é de 14 a 28 dias, segundo a bula. Na última quarta-feira (27), o governo de SP manifestou vontade de utilizar todas as doses que estão no estado para vacinar mais pessoas, e adiar a segunda dose. Contrariando orientação do próprio Butantan e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que é sempre seguir a bula da vacina, o diretor do instituto, Dimas Covas, disse que não há “problema algum” em ampliar o intervalo em mais 15 dias.
Na terça-feira, entretanto, o coordenador do Conass, Nereu Mansano, já afirmava em uma live técnica para dar orientações aos profissionais de saúde sobre a operacionalização da vacinação contra a covid-19 sobre a importância de se reservar a dose da CoronaVac.
Vacina de Oxford
No caso da vacina de Oxford/Astrazeneca, que no Brasil é produzida em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), ele pontuou que os gestores podem aplicar todas as doses, porque a segunda dose pode ser aplicada em até três meses.
“Nós temos uma tranquilidade maior de poder aguardar uma nova produção para daí fazer a vacinação da segunda dose. Ou seja, eu não tenho a necessidade no caso da vacina da AstraZeneca de já reservar a segunda dose, porque eu tenho um prazo maior para fazer essa segunda dose”, afirmou.
Ele ressaltou, entretanto, que isso não quer dizer que pode-se simplesmente não fazer a segunda aplicação. “Tanto uma vacina quanto a outra foram liberadas pela Anvisa com base em estudos que levaram em conta a aplicação de uma primeira e uma segunda doses. A diferença com a CoronaVac é que eu preciso fazer essa segunda dose com o intervalo de tempo menor. Justamente por isso eu tenho que ter a garantia da existência da segunda dose. É preciso reservá-la, não posso utilizar todas as doses disponíveis já no primeiro momento”, afirmou.
Na última sexta-feira (22), o gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, Gustavo Mendes, ressaltou que não seguir o que está na bula pode atrapalhar a eficiência da vacina. “O risco de não seguir o recomendado em bula pode ser tanto em relação à eficácia — ou seja, se não tiver o intervalo respeitado, se não tiver uma segunda dose tomada, não atingir, não conseguir atingir os anticorpos mínimos para fazer a neutralização —, quanto ao risco de segurança também, se for, de repente, uma superexposição, ou alguma questão assim”, orientou.
Ele disse, ainda, que ao analisar os estudos clínicos, a agência observa exatamente da forma como foi proposto. Ele ressaltou que a orientação é que se siga o que está na bula.
“Toda essa análise clínica e não clínica se conclui numa bula. Então, é na bula que nós e a empresa chegamos num acordo comum entre o que seria esse espaçamento ideal de doses, e aí o que acontece é que a bula é liberada, colocada no site, e há expectativa que se cumpra os requisitos em bula. O monitoramento que nós fazemos inclui também essas questões, de observar se isso está sendo respeitado, fazer uma análise, mas efetivamente não dá para a Anvisa ir lá nas prefeituras, nos estados e verificar se está realmente feito esse regime proposto na bula”, afirmou.