Mesmo com o selo de segurança pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e previsão de liberação do uso emergencial amanhã, a vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford com a AstraZeneca, e incorporada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), deve perder espaço nos primeiros dias de imunização contra a covid-19. Sem nenhuma dose pronta em território brasileiro e com atrasos de “dois a três dias” para a importação da Índia, como admitiu o presidente Jair Bolsonaro, a alternativa é começar a campanha com os seis milhões de doses da CoronaVac, que estão de posse do Instituto Butantan e foram todas requisitadas pelo governo federal.
Bolsonaro atribuiu o atraso na viagem à Índia ao início da imunização contra a covid-19 naquele país e por pressões políticas. “Foi tudo acertado para disponibilizar 2 milhões de doses. Só que, hoje, neste exato momento, está começando a vacinação na Índia. É um país com 1,3 bilhão de habitantes. Então, resolveu-se atrasar um ou dois dias, até que o povo comece a ser vacinado lá. Lá também tem as pressões políticas de um lado e de outro. No meu entender, daqui a dois, três dias, no máximo, nosso avião vai partir e vai trazer esses 2 milhões de vacinas para cá”, disse Bolsonaro, em entrevista ao Brasil Urgente, da Band TV.
Com a falta de uma data para contar com os imunizantes de Oxford/AstraZeneca, reproduzidas pelo Institito Serum, o governo federal poderá ter que iniciar a aplicação em território nacional somente com a CoronaVac, desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac e reproduzida no Brasil pelo Butantan. Por isso, o Ministério da Saúde solicitou, ontem, por ofício, que o instituto entregue, imediatamente, os seis milhões de doses da CoronaVac importadas da China.
O documento, assinado pelo diretor do Departamento de Logística em Saúde, Roberto Ferreira Dias, ressalta a necessidade de obter os imunizantes para organizar a logística de distribuição aos estados. A pasta anunciou que pretende iniciar o processo de vacinação na próxima quarta-feira, dia 20, às 10h.
“Ressaltamos a urgência na imediata entrega do quantitativo contratado e acima do mencionado, tendo em vista que este ministério precisa fazer o devido loteamento para iniciar a logística de distribuição para todos os estados da Federação de maneira simultânea e equitativa, conforme cronograma previsto no Plano Nacional de Operacionalização da vacinação contra a covid-19, tão logo seja concedida a autorização pela agência reguladora, cuja decisão está prevista para domingo”, diz documento direcionado ao diretor do Butantan, Dimas Covas.
No entanto, a estratégia do governo de São Paulo, divulgada ontem antes do recebimento do ofício do governo federal, era entregar ao ministério 4,5 milhões de doses prontas. O restante das vacinas ficaria com o governo de São Paulo, sob a alegação de que este seria o percentual definido para o estado. Por isso, o Butantan respondeu ao ofício questionando o real quantitativo que ficaria no estado.
“Para todas as vacinas destinadas pelo instituto ao Programa Nacional de Imunizações (PNI), é praxe que uma parte das doses permaneça em São Paulo, estado mais populoso do Brasil. Isso acontece, por exemplo, com a vacina contra o vírus influenza, causador da gripe. Portanto, o instituto aguarda manifestação do ministério também em relação às doses da vacina contra o novo coronavírus”, afirmou o Butantan.
Precipitação
Na última quinta-feira, o jornal indiano Hindustan Times divulgou que o Brasil estava se precipitando ao enviar um avião para buscar vacinas no país, porque a decisão que autoriza a exportação ainda não havia sido tomada. No mesmo dia, mais cedo, a partida do cargueiro da Azul foi adiada pela primeira vez, segundo a companhia aérea, por problemas de logística no preparo da carga. A empresa havia afirmado ao Correio que o avião só sairá do Brasil quando a carga de vacinas estiver 100% pronta.
Na mesma noite, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, telefonou para o chanceler da Índia, Subrahmanyam Jaishankar, frisando o pedido de importação das vacinas replicadas pelo Instituto Serum. Na conversa, Araújo identificou haver “boa vontade” do governo indiano para autorizar a exportação da carga, mas foi informado de problemas de logística pelo fato de a solicitação acontecer justamente no momento em que a Índia inicia a campanha de vacinação. Jaishankar teria dito que o envio ao Brasil acontecerá nos próximos dias, mas sem garantir datas.
O Ministério da Saúde não informou quando o avião buscará as doses nem quando volta com a carga estimada em 15 toneladas. Anteriormente, a aeronave pousaria no Aeroporto Internacional Tom Jobim (RJ), amanhã, mesmo dia que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) decide sobre os pedidos de uso emergencial das vacinas.