Ex-seminaristas detalharam acusações de abusos sexuais e assédio moral contra o Arcebispo de Belém, Dom Alberto Taveira, e como os crimes teriam acontecido, entre os anos de 2010 e 2014. O religioso é alvo de investigações da Polícia Civil e do Ministério Público. Sem citar os casos diretamente, ele nega que tenha cometido os crimes.
Em entrevista ao El País, um deles, que não se identificou e que hoje tem 26 anos, contou que começou a ser assediado pelo arcebispo com 15 anos de idade, ainda antes de entrar para o seminário. Já com 18 anos, ele diz ter sido abusado sexualmente, em meio a um processo de expulsão do grupo de estudantes e à suposta ameaça da autoridade máxima da Igreja no local de “contar tudo” para a família dele.
Outro jovem que também se diz vítima hoje tem 28 anos e relatou que começou a ser assediado pelo padre com 20 anos, mas conseguiu afastar-se dele antes de sofrer abusos físicos. A reportagem também diz que teve acesso ao teor do que foi contado na denúncia pelos outros dois jovens. Um deles, com 16 anos na época dos fatos narrados, foi quem dos quatro teria sofrido as piores violências, ficou traumatizado e chegou a tentar tirar a própria vida após deixar o seminário.
Os quatros jovens foram ouvidos de forma anônima pelo Fantástico, da TV Globo. Os ex-seminaristas disseram que era comum os jovens se encontrarem com o religioso na casa dele. “Teve sábado pela manhã que eu cheguei lá na casa dele, tinha fila de meninos para passar pelo atendimento”, diz um deles.
Segundo os denunciantes, os encontros na casa do arcebispo aconteciam na capela, onde a conversa era sobre vocação religiosa; na sala, onde a conversa era focada na família e nos estudos; e, geralmente no fim da noite, no quarto. Lá, eles falavam sobre intimidades e, segundo os jovens, era onde ocorriam os abusos.
O caso já está sendo averiguado, também, pelo Vaticano. O caso começou a ser formalmente apresentado à Santa Fé em 2019 e, em dezembro, segundo a TV Globo, um representante já esteve no Brasil para conduzir a apuração dos fatos.
Confira os relatos dos quatro denunciantes (conteúdo forte):
“Era colocado como uma coisa normal. Aí acho que ele ia sentindo a abertura, vendo até onde conseguia chegar, testando a gente…”
“Eu já tinha passado pela orientação particular com ele antes, mas tinha sido tudo muito superficial, eu não dava abertura. Quando fui expulso, procurei Dom Alberto e perguntei se ainda havia esperança para mim. Ele disse que tinha um caminho, mas que eu tinha que me abrir ao método de cura espiritual dele”
“Voltei para a primeira sessão e começou: queria saber se eu me masturbava, se eu era ativo ou passivo, se eu gostava de troca-troca, se eu assistia pornografia, quando eu me masturbava o que eu pensava… achei estranho mas achei que era o método dele”.
“Outra coisa comum era a reza junto ao corpo. Ele chegava junto de você, se roçando, e fazia uma reza em algum lugar do seu corpo nu… teve vez que era no rosto e achei que ele ia me beijar”.
“Tive que pegar nele e masturbá-lo, ele pegava no meu pênis e tentava fazer com que eu tivesse uma ereção… Outra coisa é que ele ficava nervoso quando você não conseguia, brigava, dava bronca, mas sempre com esse papo do tratamento, do estamos tentando te salvar… A cada sessão, ele ficava mais agressivo e violento, dizia coisas horríveis, lembrava de fatos passados para te humilhar, dizia que você não estava progredindo, dizia coisas horrorosas para você, que você era uma pessoa horrível, era aterrorizante”.
“Quando ele me tocou, na minha parte íntima, disse que aquilo ali era normal, coisa do homem. Mas, assim, eu não via maldade, porque confiei muito, por ele ser uma autoridade, também não tinha experiência. Mas aquilo foi se tornando já permanente e já mais agressivo. Ele já me recebia na porta e já ia logo pegando”
"Perguntava muito sobre masturbação. Primeiro, mostrava no dedo dele. Como a gente fica muito constrangido, então sempre se muda de assunto. Em outro momento, retorna, até que ele pede para que você mostre. No meu caso, houve um momento em que ele, ele mesmo abaixou as minhas calças, porque eu estava perplexo, e tocou (no pênis) e também rezou”.
“Ele pediu para que eu mostrasse como eu me masturbava no dedo dele. Isso na hora me chocou bastante, porque você não espera uma coisa dessa, né?”.
“Ele pediu para que eu ficasse de pé na frente dele, no meio das pernas dele. E pediu que eu fechasse meus olhos. Eu fechei os olhos, aí ele começou a rezar e foi quando ele pegou em meus órgãos genitais, acho que esperando alguma reação, sei lá, mas não houve nada. Ele me abraçou, deu um beijo próximo da minha boca e disse que é assim, que tinha que rezar”.
“Quando eu comecei a falar para ele que eu queria sair do seminário por isso, isso e isso, comecei a chorar. Ele mudou o humor, repentinamente. Bateu na mesa, me xingou de viado, disse que chorar era coisa de viado, que eu tinha que ser homem, que eu tinha que ser forte. E isso tudo gritando, assim, de maneiro que até chegou a me assustar. E aí nesse dia que ele levantou da mesa dele e me abraçou. Ficou pegando nos meus órgãos genitais, apalpando. Me abraçou, me deu outro beijo perto da boca, disse que gostava muito de mim, que queria me ver ordenado padre”
Outro lado
O caso ganhou destaque após o próprio arcebispo fazer um pronunciamento, no início de dezembro, para se defender do que chamou de "acusações de imoralidade". "Digo que recebi com tristeza há poucos dias a informação de existência de procedimentos investigativos com graves acusações contra mim sem que eu tenha sido previamente questionado, ouvido ou tido qualquer oportunidade para esclarecer esses pretextos fatos postos nas acusações", relatou o arcebispo no vídeo.
Na gravação, Taveira diz que confia na Justiça brasileira para o esclarecimento das "falsas imputações" e afirma estar "totalmente disponível às autoridades, tanto eclesiásticas como civis para que a realidade seja restabelecida".