Apesar de fazer parte dos estudos de fase 3 realizados no Brasil, a vacina contra a covid-19 da farmacêutica americana Pfizer está fora do radar do Ministério da Saúde. A candidata é a primeira a ter os testes em massa com seres humanos concluídos e cujos resultados apontaram para 90% de eficácia, conforme divulgação feita pela desenvolvedora, nesta segunda-feira (9/11).
Não existe acordo de aquisição para incorporar ao Programa Nacional de Imunização (PNI) a vacina da Pfizer, feita em parceria com o laboratório alemão BioNTech. Segundo a própria farmacêutica, houve tentativa de oferta para que o Brasil fosse incluído no rol de países a adquirirem as doses, mas não houve resposta por parte do governo brasileiro.
Com autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a candidata contou com mais de 3 mil voluntários brasileiros em São Paulo e na Bahia, mas, diferentemente da chinesa CoronaVac e da britânica de Oxford, não havia previsão de transferência de tecnologia para que o país pudesse produzir a vacina em território nacional. Fecharam acordo com a farmacêutica os Estados Unidos, que deverão adquirir 100 milhões de doses; e a União Europeia, que receberá mais 200 milhões. Japão, Reino Unido e Canadá também entraram no acordo.
A vacina também não está prevista na Covax Facility, mecanismo de cooperação entre mais de 30 nações e que tem como objetivo a chegada de uma vacina também às regiões mais vulneráveis. O Brasil faz parte da iniciativa e, além de esperar uma iniciativa que seja incorporada ao fundo, tem acordo fechado com a produção da AstraZeneca com a Universidade de Oxford.
Dificuldades
Uma das barreiras para a incorporação da vacina da Pfizer é a técnica sofisticada com a qual o Brasil não tem proximidade. A tecnologia é baseada no RNA da covid-19 que, ao ser introduzido pela dose, provoca a formação proteína do vírus para que, assim, o corpo produza a resposta imunológica. Para conservar as doses, é necessário que o material permaneça armazenado em locais com temperaturas extremamente baixas.
"Precisa de -70°C para preservar a vacina. Isso não é a realidade no Brasil. Nem nos Estados Unidos e na Europa. São restrições que estão sendo trabalhados aceleradamente com grandes companhias farmacêuticas muito engajadas à procura de tecnologia que permita o transporte a essas temperaturas. Adquirir freezer nessa capacidade é uma tecnologia extremamente cara. Mas, para a realidade brasileira, temos que trabalhar com vacinas que possam ser conservadas entre 2°C e 8°C, temperaturas garantidas na nossa imensa rede de sala de vacina ao longo do país", explica David Urbaez, infectologista do laboratório Exame, que integra a Dasa.
O anúncio, na visão dele, é ainda superficial, mas que traz uma boa perspectiva, inclusive, para as outras candidatas. "Isso que a Pfizer anunciou é muito bom porque se demonstrou que essa tecnologia gera proteção, que há imunização contra o vírus, o que é um indicativo de que todas as vacinas mais promissoras podem funcionar. Terão essa perspectiva", pondera Urbaez.
Para o médico sanitarista e professor da FGV Adriano Massuda, o Brasil tem uma boa estratégia para a produção de vacina, com parceria firmada com a candidata da AstraZeneca e com a CoronaVac, a última ainda concentrada em São Paulo. No entanto, peca na discussão técnica de como serão as estratégias de vacinação, apesar da ampla tradição na área. "É preciso ter toda uma estratégia de vacinação, definindo os grupos prioritários, porque não vai ter a vacina inicialmente para todo mundo. Além disso, ter uma estrutura logística de distribuição. Algumas vacinas exigem cadeias de frios bastante sofisticadas. Não adianta ter a vacina e não ter como chegar nas condições adequadas para que tenha efeito. Podemos ser pioneiros em campanhas vacinais e perder o compasso pela falta de logística".