Negros são mais atingidos pelo analfabetismo, mais internados por doenças relacionadas ao saneamento inadequado e têm menor acesso à energia elétrica do que os brancos. Isso é o que mostra a quarta edição da plataforma Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, lançada, ontem, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em conjunto com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud Brasil) e a Fundação João Pinheiro. O sistema abrange cerca de 360 indicadores socioeconômicos sobre desigualdade, renda, trabalho, saúde, educação, habitação, vulnerabilidade, meio ambiente, entre outros. Os dados são referentes a 17 mil localidades brasileiras, sendo 5.565 municípios, 24 regiões metropolitanas, 27 unidades federativas e mais de 10 mil unidades de desenvolvimento humano.
As informações apresentadas são um retrato da desigualdade nacional, tanto entre as regiões, quanto em relação a diferenças entre negros e brancos. Os dados são fundamentais para que possam ser pensadas políticas públicas eficientes voltadas para populações em situações mais vulneráveis. Chama a atenção a diferença entre a escolaridade de brancos e negros, em diversos níveis de educação. O analfabetismo é presente entre os maiores de 25 anos para 11,81% dos negros, contra 5,09% dos brancos. A população negra que finaliza o ensino superior equivale a 8,43%; enquanto a branca, 21,28%.
Outra disparidade que os dados mostram é em relação a pessoas pobres e extremamente pobres quando desagregadas pela cor. Entre os brancos, o percentual de pobres era de 6,41%, em 2017, contra 15,8%, entre os negros. Analisando os extremamente pobres são 3,37%, para os brancos, e 8,02, para negros.
A quarta edição do Atlas também mostra que o Brasil registrou um aumento nos números referentes à pobreza entre os anos de 2016 e 2017. Neste período foi registrado aumento no percentual de vulneráveis, de 24,47% para 24,98%; de pobres, de 11,15% para 11,65%; e de extremamente pobres, de 5,15% para 5,97%. A unidade federativa com maior percentual de pessoas extremamente pobres foi o Maranhão, com 15,62%; e a UF com menor percentual foi Santa Catarina, com 1,54%.
Do total de brasileiros inseridos no Cadastro Único, 66,12% eram beneficiados pelo Bolsa Família em 2017. De acordo com registros do Ministério da Cidadania (Cadúnico — 2017), a diferença entre os grupos raciais beneficiados aumentou entre 2014 e 2017. No primeiro ano considerado, 61,05% eram brancos; 74,32%, negros. Já no último, os números registrados eram 55,73% e 70%, respectivamente.
Entre as constatações positivas, o levantamento mostra que entre 2013 e 2017 houve queda na mortalidade infantil, que passou de 13,39% para 12,38%; os números se mostram mais altos entre os meninos.
Racismo estrutural
No Distrito Federal, enquanto o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) dos brancos chega a 0,92; entre os negros, o número fica em 0,8. “A pesquisa é apenas um reflexo de todo conjunto de desigualdades regionais e sociais também. Então, a pesquisa é um retrato de uma questão estrutural”, pontua a professora do curso de Serviço Social do Centro Universitário IESB, Késia Araújo.
“É a questão do racismo estrutural, que, por sua vez, tem toda uma conotação de classes sociais. Infelizmente, ainda temos essa desigualdade decorrente desse racismo estrutural, então, temos todo esse segmento populacional que tem mais dificuldade de acesso às políticas públicas, que vive numa situação de maior vulnerabilidade social e econômica”, avalia.
Outro ponto que Késia destaca é sobre como esses fatores estão interligados e acabam gerando um ciclo. “Quanto mais a população for vulnerável do ponto de vista social e econômico, mais dificuldade ela tem de ter acesso a serviços sociais básicos, como saúde e educação. É um efeito cascata, as coisas estão muito atreladas”, explica a professora.