As mães estão amamentando seus filhos por mais tempo e, hoje, já é possível encontrar mais de 60% das lactantes, em todas as regiões do país, ainda alimentando bebês com praticamente dois anos de idade. Isso é o que mostra uma pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), encomendada pelo Ministério da Saúde, intitulada Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (Enani) — que avaliou 14.584 crianças com menos de cinco anos de vida, em 123 municípios, no período entre fevereiro de 2019 e março de 2020. O levantamento constatou, ainda, que aumentou o número de crianças que receberam exclusivamente leite materno até os seis meses de idade.
A pesquisa apontou um aumento em 12 vezes na prevalência da amamentação exclusiva para crianças menores de quatro meses. Comparados aos números obtidos em 1986, a porcentagem passou de 4,7% para 60%. “Aumentou muito no Brasil. A gente tem informações nacionais de alguns outros estudos que mostram que a amamentação exclusiva era muito baixa”, avalia Gilberto Kac, coordenador nacional do Enani e professor titular da UFRJ. Ele destaca que, apesar dos valores nacionais ainda serem inferiores, se comparados a países como Noruega e Dinamarca, o Brasil se aproxima da meta de 50% até 2025. “Se seguir o padrão de 1% ao ano, a gente chega a 50% em 2025”, projeta.
Nas crianças maiores, a amamentação também foi avaliada. Dados apontaram que 53,1% das avaliadas receberam leite materno no dia anterior à sondagem. No Sul, a porcentagem foi de 35% e, no Nordeste, 61,1%. Entre as crianças com até 24 meses, 60,9% receberam o alimento no dia anterior. “É justamente nessa etapa de um a dois anos que o Brasil não está tão bem em termos da frequência”, comentou o pesquisador, acrescentando que em comparação com países de poder socioeconômico semelhante, como México e África do Sul, “a gente está pior”.
Entre as crianças com até seis meses, o valor passou de 2,9% para 45,7% em 34 anos. Tal crescimento de 42,8 pontos percentuais representa uma elevação de 1,2% por ano. “O ideal seria que todas as crianças pudessem ser amamentadas exclusivamente até os seis meses. Mas não é possível porque temos mães que não produzem leite, mães que têm de trabalhar. Vemos que o aleitamento exclusivo tem uma queda de 15% justamente de quatro para seis meses, que é quando essa mãe tem que retomar a vida profissional. Tem outros fatores, mas esses explicam muito. Aumentar a proteção para a mãe trabalhadora seria algo que, de fato, nos ajudaria a alcançar resultados melhores”, pondera Kac.
Uma pesquisa realizada pelas universidades de Brasília (UnB) e de São Paulo (USP), em conjunto com a Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo (SES-SP), mostra que não estar em licença afeta em 23% a chance de interrupção da amamentação exclusiva.
“O leite materno é o alimento mais propício para o bebê. Então, a recomendação é deque seja exclusivo até os seis meses, sem água ou chá. O aleitamento, assim como a vacina, reduz as taxas de mortalidade. Crianças muito pobres ou pobres vão ter menos óbitos até um ano se foram amamentadas, porque a amamentação protege da diarreia e das infecções respiratórias agudas, que são as duas maiores causas de óbito em bebês de até um ano”, salienta.
Benefícios evidentes
Para a biomédica Sthéfani de Abreu, de 26 anos, os benefícios do aleitamento são nítidos. “Minha motivação para amamentar vem, primeiro, em saber que estou oferecendo à minha filha o melhor e mais completo alimento do mundo. O leite materno tem tudo que ela precisa para se desenvolver bem, além de criar um vínculo cada vez maior comigo”, observou.
Sthéfani lembra que amamentou a primeira filha por um ano e quatro meses, e só parou por recomendação médica. “Parei porque ela passou a ter dificuldades para dormir. Ela acordava à noite procurando por mim só para mamar. Por isso, o médico pediu que a amamentação fosse interrompida”, relatou. “Mas, com minha segunda filha, que está nessa fase agora, quero amamentar enquanto ela também quiser ou até quando houver uma recomendação para parar”, acrescentou.
Segundo Gilberto Kac, há estudos que mostram que o aleitamento traz benefícios para o desenvolvimento cognitivo. “Tem, também, a imunidade da criança, porque o leite materno tem componente que nenhuma fórmula, nenhum leite de origem bovina vai ter”, explicou.
Bruna Francisca Barbosa, 22 anos, também encontra nos benefícios e na qualidade do leite materno motivos para optar pelo produto natural. “Ela está mais protegida, além de fortalecida em seu crescimento. Minha intenção é deixá-la mamar enquanto ainda tiver vontade. Não pretendo interromper a amamentação tão cedo”, garantiu.
Gilberto Kac acrescenta: “As recomendações da Organização Mundial da Saúde e do Ministério da Saúde são para fazer aleitamento materno exclusivo até os seis meses, e, a partir desta idade, começar a introdução alimentar, que precisa ser cuidadosa e paulatina, pois a criança vai aos poucos progredir para a nova fase”, explicou.
Para o pesquisador, se a meta é beneficiar as crianças, é preciso rever o tempo de licença-maternidade, que é de quatro meses. “Um paradoxo, pois a recomendação (para o básico da amamentação) é de seis meses”.
*Estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi
Dedicação ao filho
• Aleitamento materno exclusivo entre menores de quatro meses – proporção de crianças menores de 120 dias que receberam exclusivamente leite materno no dia anterior à avaliação.
Norte 57%
Nordeste 55,8%
Sudeste 63,5%
Sul 59,8%
Centro-Oeste 60,8%
Brasil 60%
• Aleitamento materno exclusivo entre menores de seis meses – proporção de crianças menores de 180 dias que receberam exclusivamente leite materno no dia anterior à avaliação.
Norte 40,7%
Nordeste 38%
Sudeste 50%
Sul 53,1%
Centro-Oeste 44,1%
Brasil 45,7%
• Aleitamento materno continuado aos 12 meses – proporção de crianças entre 12 e 15 meses que receberam leite materno no dia anterior à avaliação.
Norte 51,8%
Nordeste 61,1%
Sudeste 52,8%
Sul 35%
Centro-Oeste 55,3%
Brasil 53,1%
• Aleitamento materno total em menores de 24 meses – proporção de crianças menores de 720 dias que receberam leite materno no dia anterior à avaliação.
Norte 65,5%
Nordeste 64,3%
Sudeste 57,9%
Sul 58,2%
Centro-Oeste 64,5%
Brasil 60,9%