assassinato de Anderson do Carmo

Acusada no crime, Flordelis adotou como filho e foi sogra do marido morto

Saiba quem é a deputada e cantora gospel acusada de mandar matar o pastor Anderson do Carmo

Ana Mendonça*/Estado de Minas
postado em 27/08/2020 11:52 / atualizado em 27/08/2020 11:55
 (crédito: Redes Sociais/Reprodução)
(crédito: Redes Sociais/Reprodução)

Uma série de evidências que ligam a deputada federal Flordelis (PSD) e sua família ao assassinato do pastor Anderson do Carmo chocou o país nos últimos dias. A Operação Lucas 12, deflagrada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) e pela Polícia Civil, prendeu cinco dos 55 filhos de Flordelis e apontou a parlamentar como mandante do assassinato do próprio marido.

Pastora, cantora e deputada eleita pelo estado do Rio de Janeiro, Flordelis obteve 196.959 votos, o melhor desempenho entre as mulheres do estado que disputavam uma vaga na Câmara dos Deputados. Famosa nacionalmente na década 1990 pelo número de filhos, a missionária pregava que a família era “seu bem maior”.

Apesar disso, o inquérito mostra uma outra realidade. Em meio a traições, tentativas de assassinato, brigas, dinheiro, incesto e religião, muitos mistérios se relacionam com os membros dessa família, que foi chamada pelo delegado Allan Duarte, responsável pelas investigações, de “organização criminosa”.

Mas, afinal, quem é Flordelis?

Nascida em 5 de fevereiro de 1961, Flordelis dos Santos de Souza foi moradora da favela do Jacarezinho, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Famosa pela história de adoção dos filhos, a deputada ganhou a mídia após adotar 37 crianças que estavam fugindo de uma chacina na Central do Brasil, no Centro do Rio de Janeiro. Atualmente, Flordelis é mãe de 55, sendo quatro biológicos (três com o primeiro marido e um com Anderson).

Um fato curioso, é que Anderson do Carmo, antes de ser marido de Flordelis foi adotado pela deputada e chegou a ser tratado como genro, quando namorou uma de suas filhas.

Vista por muitos como uma mulher de família, altruísta e dedicada, a deputada acabou até mesmo virando roteiro de filme. Com o título Flordelis - Basta uma palavra para mudar, o longa-metragem foi dirigido por Marco Antônio Ferraz. O elenco contou com atores renomados como Ana Furtado, Letícia Sabatella, Cauã Reymond, Bruna Marquezine, Alinne Moraes e Deborah Secco.

Já casada com Anderson, Flordelis fundou a Comunidade Evangélica Ministério Flordelis, em 1999, no Bairro do Rocha, Zona Norte do Rio. Antes de morrer, o pastor era presidente do Ministério Flordelis. De acordo com as investigações, ele controlava a igreja e a família, tomando conta de tudo, da partilha dos alimentos até as finanças.

Vida política

Flordelis sempre se mostrou inclinada para a vida política. Mesmo quando ainda era missionária, a deputada federal pregava em seus cultos sobre políticas públicas e casos policiais. A primeira tentativa de entrar no mundo político foi em 2004, quando ela se candidatou para uma vaga na Câmara Municipal de São Gonçalo (RJ), sem sucesso. Em 2016, Flordelis concorreu à prefeitura da cidade.

Defensora das crianças e adolescentes, ela foi eleita em 2019 como deputada federal pelo RJ. Mesmo no primeiro ano, a parlamentar concorreu à presidência da bancada evangélica na Câmara. Flordelis perdeu a cadeira para o deputado Silas Câmara (PRB-AM).

Além disso, ela chegou a integrar como titular as comissões de Seguridade Social e Família, de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e dos Direitos da Mulher. Flordelis é mãe do pastor e vereador de São Gonçalo Wagner Andrade (PMDB). Ele chegou a lançar a candidatura com o nome de Misael da Flordelis, mas, após a perda do pai, retirou o nome da mãe.

Após ser denunciada como mandante do assassinato de Anderson, Flordelis corre o risco de perder o mandato e ser expulsa do PSD. Em entrevista recente, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que o “crime não tem relação com o mandato”, por isso, não prevê foro especial, mas para que a deputada seja presa ou afastada do mandato, é preciso que haja autorização da Câmara.

O crime

Anderson do Carmo foi executado com mais de 30 tiros na porta da casa do casal em Pendotiba, Niterói (RJ). Na época do assassinato, a deputada federal afirmou que se tratava de um assalto. Apesar disso, a investigação conduzida pelo Ministério Público e pela Polícia Civil não demorou muito para encontrar divergências nos depoimentos, além de outras evidências.

De acordo com a investigação, a família tentou esconder as evidências dos crimes chegando até mesmo fazer uma fogueira no quintal da casa para destruir provas. Os policiais acreditam que Flordelis tentou assassinar o pastor pelo menos seis vezes por envenenamento, além de contratar pistoleiros em outras duas vezes.

Em uma das mensagens encontradas pelos policiais, Flordelis chama Anderson de “traste” e pede ajuda para um filho. “André, pelo amor de Deus, vamos pôr um fim nisso. Me ajuda. Cara, tô te pedindo, te implorando. Até quando vamos ter que suportar esse traste no nosso meio?”, escreveu.

Em outra, Marzy, uma das filhas do casal, incentiva o irmão Lucas a matar o pastor por R$ 10 mil. Vale relembrar que o revólver usado na execução estava em cima do armário de Flávio, filho que admitiu ser o autor dos disparos.

Os depoimentos e o que pesa sobre cada um

Flordelis: Durante depoimento, a deputada disse sentir muitas saudades do marido. De acordo com ela, no momento do assassinato, estava dentro de um quarto da casa conversando com o neto Ramon e que foi impedida de ver o marido morto. Flordelis, porém, foi apontada como mentora do crime. Ela responderá por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio duplamente qualificado, associação criminosa majorada, uso de documento ideologicamente falso e falsidade ideológica.

Vereador Misael: No depoimento, o vereador afirmou que Flordelis era “mentora intelectual” do assassinato. Ele relatou que a deputada teria revelado aos filhos que tinha quebrado o celular do marido e que achava que Anderson estava “dando a volta nela” em relação às finanças da família. Foi Misael que acusou os irmãos adotivos Lucas dos Santos e Marzy.

Daniel dos Santos Souza: O jovem, de 21 anos, é apresentado como filho biológico do pastor e da deputada federal. Apesar disso, de acordo com a investigação ele foi adotado de forma ilegal. Em depoimento, Daniel afirmou acreditar no envolvimento da mãe que disse para ele que “a hora do pai iria chegar”. Ele também acusou os irmãos Flávio e Lucas.

Simone dos Santos: Filha biológica de Flordelis com o primeiro marido. Simone já namorou Anderson quando os dois eram adolescentes. Ela seria a responsável pelos envenenamentos. De acordo com as investigações, ela buscou informações sobre uso de veneno na internet. Durante depoimento, oito dias após o crime, ela confirmou que fez pesquisas sobre o veneno cianeto e como colocá-lo nos alimentos, mas negou que fosse para usá-lo contra o padrasto. Simone vai responder por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio triplamente qualificado e associação criminosa majorada.

Maria Edna Virginio do Carmo: Mãe de Anderson, foi ela que contou para a polícia sobre o suposto caso do filho com a enteada Simone e que Daniel não era filho biológico do casal.

Marzy Teixeira da Silva: Filha adotiva do casal, incentivou Lucas a matar o pastor Anderson. Durante depoimento, ela confessou o pedido e afirmou que a mãe sabia de tudo. Ela também participou dos envenenamentos. Marzy vai responder por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio triplamente qualificado e associação criminosa majorada.

André Luiz de Oliveira: Filho adotivo, é também ex-marido de Simone. De acordo com a investigação ele foi flagrado em conversas com Flordelis combinando o envenenamento.

Rayne Silva: Neta do casal, ela é filha adotiva de Simone dos Santos. Citada durante depoimento de Érica dos Santos, uma de suas tias, a jovem mandou uma mensagem pedindo o “contato de algum bandido” um mês antes do assassinato. Ela vai responder por homicídio triplamente qualificado e associação criminosa majorada.

*Estagiária sob supervisão da editora-assistente Vera Schmitz, do Estado de Minas

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