Editorial

Reforma do ensino médio fica para 2019

Mudanças trazidas pela reforma ainda não devem ocorrer este ano. Observar experiências semelhantes em redes de ensino estaduais pode ajudar a traçar um plano nacional

Ana Luiza Vinhote - Especial para o Correio Braziliense
postado em 11/01/2018 03:00
Clarisse Oliveira começará a cursar o ensino médio este ano e se preocupa com a implementação das mudanças
As mudanças decorrentes da reforma do ensino médio ainda não deverão ser colocadas em prática este ano. A previsão do Ministério da Educação (MEC) é de que o novo formato do currículo para esta etapa do ensino comece a ser implantado nas escolas brasileiras a partir de 2019, já que parte da definição sobre o que deverá ser ensinado depende da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
Apesar de os resultados da medida ainda estarem distantes, alguns especialistas acreditam que esse pode ser o início das transformações para melhorar o sistema educacional brasileiro. Outros destacam que o esforço para aumentar os índices de proficiência na fase da educação básica que mais preocupa o governo precisará ir além da reforma.

Para o diretor de Políticas Educacionais do movimento Todos pela Educação, Olavo Nogueira Filho, as escolas devem começar a operar com a nova Base apenas em 2020 e, este ano, o novo modelo de ensino continuará sendo construído para avaliar se as escolas estão aptas a recebê-lo. ;Tudo continuará da mesma forma em 2018 e 2019. Pode ser que o aluno que esteja entrando agora no 1; ano do ensino médio pegue o novo modelo quando chegar ao 3; ano ou em algumas escolas particulares que coloquem a reforma em prática ainda este ano;, observa.
O especialista acredita que é preciso observar as experiências de políticas públicas da educação já em andamento no Brasil para ter uma base sobre o reflexo que elas podem ter. ;A reforma do ensino médio no Ceará e em Pernambuco são dois exemplos de políticas públicas que tiveram bons resultados. Então, se a política educacional for desenhada de uma forma positiva e com foco na progressividade dos estudantes, é possível ter um bom resultado, mas apenas em 8 a 10 anos;, avalia.
Na avaliação dele, se o novo ensino médio for bem implantado, a preparação para o mercado de trabalho será mais eficiente. ;Precisamos entender que o jovem entre 15 e 17 anos já começa a ter interesses diversos, seja entrar para uma faculdade, seja para o mercado de trabalho. Reconhecer isso e desenhar o ensino médio é um caminho que a experiência de outros países apontam como positiva;, afirma.
Já o presidente do Instituto Alfa e Beto (IAB), João Batista Oliveira, não concorda que o ensino acadêmico e o profissional devam se misturar. ;Na escola, o objetivo não é preparar para o mercado de trabalho, mas, sim, para os próximos anos no colégio ou na faculdade. O ensino técnico deve ser incentivado sim, mas não nas escolas;, aponta.
Ele acredita que, se ocorrerem mudanças concretas este ano, será de forma precipitada, pois esse tipo de transformação leva tempo. ;É preciso ter mais discussões e esclarecimentos sobre a proposta. A parte do ensino técnico, por exemplo, não está clara;, observa. Para Oliveira, o primeiro passo este ano deve ser investir na alfabetização. ;Não adianta querer melhorar o ensino médio sem preparar os alunos desde os anos iniciais;, alerta.

Especialistas criticam falta de debate


Doutor em Educação, Erasto Fortes avalia que o novo ensino médio seja um retrocesso. ;Antigamente, as três séries finais da educação básica eram divididas em três cursos, e o estudante podia escolher o que queria. Isso deixou lacunas sérias no ensino. O aluno pode se arrepender de ter feito essa opção e não vai poder voltar atrás;, alerta o especialista em política e gestão da educação.
Já o professor titular da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) Marcos Neira afirma que a implantação de um novo ensino médio exige mais discussões. ;O primeiro grande problema é a falta de diálogo. A proposta trará um grande impacto para a sociedade em geral, principalmente para as camadas mais humildes;, opina o pedagogo, que aponta o ensino em tempo integral como outro problema. ;São milhões de jovens que estudam à noite, pois têm que trabalhar durante o dia. Como fica a situação desses alunos? A proposta tem de olhar para a situação de cada cidadão;, afirma o docente.
Mãe de um estudante de ensino médio, Walquiria Oliveira, 46 anos, acredita que mudar a etapa final da educação básica é necessário, mas a forma como foi apresentada, por meio de uma medida provisória, não foi adequada. ;É preciso mais diálogo, amplos debates e mais participação das comunidades escolares para não ampliar ainda mais as desigualdades na educação;, diz a historiadora.
Sobrinha de Walquiria, Clarisse Oliveira, 14, vai ingressar no ensino médio este ano e já se preocupa com as mudanças. ;Espero que os meus estudos não sejam afetados de forma negativa por causa da reforma. Não concordo em ter que escolher o que estudar, por exemplo. Enquanto você pode aprender um pouco de tudo, só vai aprender o que preferir;, diz a estudante. Clarisse também reclama do ensino integral. ;São muitos alunos em sala de aula. Ampliar a carga horária pode ser um problema se não tiver uma estrutura adequada para isso;, avalia a estudante, que é moradora do Sudoeste.

Principais alterações


Confira as mudanças que devem entrar em vigor com a implantação do novo ensino médio


; Disciplinas optativas: fica a critério da escola incluir artes, educação física, filosofia e sociologia;

; Carga horária: 60% da carga horária serão para conteúdos definidos na BNCC do ensino médio e 40%, optativos;

; Inglês: será obrigatório a partir do 6; ano do ensino fundamental em todas as escolas;

; Ensino integral: a carga horária será ampliada até atingir 1,4 mil horas anuais progressivamente;

; Ensino técnico: o estudante poderá optar por uma formação técnica e profissional dentro da carga horária;

; Professores: será permitido que as escolas contratem ;profissionais de notório saber;.

Fonte: Ministério da Educação

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação