Jornal Correio Braziliense

Turismo

Cidade perdida dos incas, no Peru, vive século de exposição ao mundo

Hiram Bingham era um desses caras que mudam de opinião ao sabor dos acontecimentos. Um sujeito, diríamos, pouco confiável. Mas essa característica maleável de seu caráter lhe garantiu o posto de um dos maiores descobridores do século 20. Em 24 de julho, completam-se 100 anos desde que esse norte-americano mostrou ao mundo a até então cidade perdida de Machupicchu, escondida entre uma floresta densa, e as montanhas dos Andes, no Peru.

Para lembrar a data comemorativa de um dos lugares mais enigmáticos do planeta, o Turismo esteve na cidade e também em Cusco. Se, inicialmente, o pouco oxigênio incomoda, o que o olhar e os sentidos registram se torna compensador.

Para o arqueólogo peruano Fernando Astete, do Instituto Geográfico Nacional do Peru e também diretor do complexo de Machupicchu, Hiram Bingham não foi um descobridor, já que a existência do lugar era de conhecimento de muitos. ;Inclusive, estava nas terras de um fazendeiro, Agustin Lizárraga, e havia quatro famílias de camponeses morando nas ruínas;, comentou Astete. ;Mas ele teve seus méritos;, emendou, acrescentando que a forma correta de escrever o nome da lenda é Machupicchu, assim mesmo, tudo junto.

Exploração
Além de completar um século na vitrine do turismo e da ciência, Machupicchu começou a receber de volta as peças arqueológicas saqueadas por Hiram Bingham e enviadas para a Universidade de Yale (EUA). São 42 mil, que começaram a chegar em 5 de abril deste ano. As peças saíram do Peru à época da exploração e, pelo acordo com o governo peruano, voltariam pouco tempo depois. O trato levou 100 anos para ser cumprido. Uma prova inequívoca de que Bingham tinha em seu DNA aquilo que é comum nos descobridores: a ganância.

Questão de ortografia
Machupicchu significa ;montanha (picchu) velha (machu); em quéchua, uma das línguas faladas pelos nativos do Peru. Escreve-se assim, segundo Astete, em respeito à ortografia desse idioma. Ela determina que, quando uma expressão vira um substantivo (como no nome da cidade perdida dos incas), deve ser grafada sem separação entre as palavras.

Cidade perdida ficou mais cara
Só não mudaram as pedras. De resto, é tudo novo em Machupicchu. Quem foi há 10 ou 15 anos ao mais famoso parque arqueológico do Peru sente a diferença. Em outros tempos, em função das facilidades e do baixo preço, o lugar era povoado de mochileiros, em números que pareciam fora de controle; um formigueiro de roupas coloridas, de sorrisos e daquela alegria contagiante dos vinte e poucos anos. Muitos desses frequentadores vinham da não menos famosa trilha inca, um caminho que corta por três dias as montanhas até chegar à cidade perdida.

Tanto a trilha quanto Machupicchu seguem como sonho de consumo de milhões de jovens no mundo, que têm como meta conhecer essas pedras e seus múltiplos significados. No imaginário do aventureiro, a cidadela inca surge como um objetivo a ser alcançado. Mas ir para Machupicchu tornou-se bem mais caro, se comparado com aqueles dias. Se antes pagavam-se pouco menos de US$ 100 para fazer a trilha inca e ainda passar o dia na cidadela, hoje não se faz esse pacote por menos de US$ 400.

Isso porque, numa atitude condizente com o bom senso, o governo peruano resolveu aumentar os preços e controlar a frequência, limitando o número de visitantes por dia, inclusive na trilha inca. Numa conta simples, a medida diminuiu o impacto provocado por milhares de visitantes e não diminuiu o faturamento com os ingressos, para alegria daqueles que se preocupam com a conservação dos monumentos e o inevitável chororô dos mochileiros. Atualmente, somente 2,5 mil pessoas por dia podem visitar Machupicchu.

Pode até parecer muito, mas não é, já que a cidade perdida é bem extensa (15km;, ou dois campos e meio de futebol). O que se vê hoje, em sua maioria, são casais de meia-idade e grupos de turistas, onde não faltam os inconfundíveis japoneses (esses sempre estiveram). Na própria cidade de Águas Calientes (hoje chamada Machupicchu Pueblo), base para a subida até o parque, o burburinho é bem menos intenso do que há alguns anos.

Vale observar que, embora tenha ficado mais cara, a ida à cidade perdida dos incas não se trata de um sonho de luxo. Principalmente se a viagem for num pacote, desses que contemplam outras atrações do Peru. (AD)


O jornalista viajou a convite da Promperu