Entretanto, nas empresas de tecnologia, elas são minoria. Em companhias como Facebook, Google, Twitter e Apple, as mulheres representam apenas 30% dos funcionários. No Brasil, a situação é ainda mais desfavorável. Dados divulgados pelo programa YouthSpark, da Microsoft, apontam que, no país, 18% dos graduados em ciência da computação e 25% dos empregados em áreas técnicas de tecnologia da informação (TI) são do sexo feminino. E não é por falta de trabalhadoras capacitadas. De acordo com a Associação Telecentro de Informação e Negócio (ATN), 36.300 mulheres formadas na área buscam colocação no mercado.
Tal quadro traz prejuízos para toda a sociedade, avaliam especialistas. "Nossas economias e nossas sociedades perdem quando deixamos de engajar metade dos cérebros do mundo em nossos motores de inovação", avalia José Avando Sales, diretor da ATN, instituição que opera em todo o Brasil como facilitadora de ensino tecnológico por meio de cursos gratuitos, muitos deles ofertados exclusivamente para jovens mulheres interessadas em TI.
Movimento de mudança
Iniciativas como os cursos da ATN podem ser ferramentas para combater o machismo que ainda impera área, um dos principais responsáveis pela presença tímida de mulheres no setor, segundo Carmen Chaves, diretora da TechSoup Brasil, agência de assistência tecnológica sem fins lucrativos. "Historicamente, mulheres como Ada Lovelace, Mary Kenneth Keller ou Kathleen Antonelli (uma das programadoras originais do Eniac, primeiro computador digital eletrônico), são desconhecidas. Já Steve Jobs, Bill Gates, Jack Dorsey e Mark Zuckerberg são nomes famosos", avalia.
A própria TechSoup é uma iniciativa preocupada em promover a presença feminina no setor, garante Stefane Soares, 18 anos, estagiária na agência. Para a jovem, estar em uma agência de tecnologia comandada por uma mulher é um incentivo para prosseguir na área. "O baixo interesse das mulheres pelos cargos de TI também está ligado a fatores educacionais. Enquanto os meninos são incentivados desde cedo a pensar racionalmente, as meninas são estimuladas a brincar de boneca. Trabalhar numa empresa tecnológica me ajuda a quebrar determinados paradigmas", afirma a aluna de análise de sistemas na faculdade Projeção.
Recém-graduada na licenciatura em computação pela Universidade de Brasília (UnB), Luiza Onofre, 22 anos, concorda com a avaliação de Stefane. "Os avanços surpreendentes da tecnologia nos deram os smartphones, a computação doméstica e a internet. Mas algumas coisas não mudam", atesta a jovem, que hoje se dedica a palestras em escolas públicas e privadas do Distrito Federal com o objetivo de inspirar os alunos a seguir carreiras nos campos da ciência, tecnologia, engenharia e matemática (Stem, na sigla em inglês).
O empenho de pessoas como Luiza e de instituições que tentam aproximar as mulheres da tecnologia podem trazer resultados importantes, apontam dados de outros países. Nos Estados Unidos, onde esse movimento é um pouco mais antigo, os efeitos já são sentidos. De acordo com levantamento feito pelo site HackerRank ; baseado em informações do governo americano ; o setor de TI naquele país contratou mais mulheres do que homens nos primeiros nove meses de 2018. Segundo as informações, cerca de 65% das 39,9 mil vagas criadas no período foram abocanhadas por elas.
Brasileiras bem qualificadas
E o Brasil tem condições de viver um fenômeno semelhante, dada à crescente presença das mulheres no setor acadêmico. Segundo o estudo Doutores brasileiros titulados no exterior, do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), as mulheres representaram 60% desse universo entre 2012 e 2016. "Isso parece estar associado a um conjunto de fatores sociais e econômicos bem conhecidos no país, como a crescente independência e liderança da mulher na sociedade brasileira, a transformação do papel feminino ; a maternidade já não é o principal fato social na vida da mulher brasileira ; e a participação ativa no mercado de trabalho", analisa o coordenador do estudo, Henrique Villa.
No entanto, as doutoras tituladas no exterior ainda ganham menos que seus pares do sexo masculino, que recebem, em média, um salário 26,5% maior. Um dado que aponta o trabalho árduo a ser feito na busca pela igualdade entre os gêneros, de acordo com a advogada e socióloga Flávia Jessini. "Reduzir a hostilidade de certos ambientes de trabalho, assegurar medidas protetivas contra assédios morais e sexuais e descortinar preconceitos em determinadas carreiras são ações necessárias para que as mulheres sejam mais participativas e reconhecidas na área de CT", afirma.
*Estagiária sob supervisão de Humberto Rezende