O primeiro de muitos
Durante a última década, quem trabalha com videogames travou uma incessante cruzada para provar que o meio deve ser levado a sério, que não é mais um passatempo para crianças. Não faltam argumentos para defender essa ideia, mas os títulos mais badalados de cada ano, com as guerras, as conspirações e os poucos convites à relfexão, mostram o quanto os jogos ; e os jogadores ; ainda são menos maduros do que gostariam de ser. Nesse ponto, The last of us dá um passo importantíssimo para um estágio evoluído, por uma simples característica: ele não foi feito para lhe agradar.
Acima de toda a ambientação (que é fantástica), a ação (que é muito convincente) e o visual (que é tecnicamente impecável), Last of us é um jogo sobre pessoas e seus conflitos, sempre influenciados pela dualidade entre a vontade de sobreviver e a necessidade de manter a sanidade ; e, em alguns casos, a própria humanidade. Para entender o que acontece na mente dos personagens, no entanto, o cenário é o primeiro a dar o tom: um fungo do gênero cordyceps se aloja na mente dos humanos, transformando-os em zumbis.
Os protagonistas, embora muito diferentes, sofreram com a dor da perda: Joel, quem você controla na maior parte da história, perdeu a filha no início do surto de infecções. O jogo começa neste momento e corta para 20 anos depois, mostrando como o mundo mudou: recursos como água e comida são escassos, e os poucos humanos não infectados se transformaram em ladrões (ou tipos piores). Em algumas cidades, exércitos opressores ainda tentam preservar o que restou da sociedade e são confrontados por rebeldes chamados de Fireflies (vaga-lumes).
Com a personalidade devastada pela perda da filha, Joel é uma pessoa que só pensa em sobreviver até se ver, em um encontro inesperado com os vaga-lumes, encarregado de acompanhar a garota Ellie, que guarda um segredo importante para a trama. Daí, o jogo se desenrola como um filme de estrada, com os locais sendo apresentados como estações do ano. O ponto alto fica por conta dos dramas psicológicos que vêm à tona com a convivência entre a dupla, em diálogos afiados.
Sem estragar a surpresa, os eventos da jornada de Joel e Ellie são de fazer você largar o controle e parar por um momento, para pensar no que acabou de acontecer. É nesse ponto que Last of us se mostra de forma corajosa e firma de vez os roteiristas da Naughty Dog (criadora da franquia Uncharted) entre os melhores contadores de histórias na indústria de jogos ; ainda que, em poucos momentos, eles tenham tomado uma lição ou duas de outro expoente do gênero, o seriado/game The walking dead.
Destaque também para a atuação, tanto na dublagem norte-americana (em especial para Troy Baker e Ashley Johnson, que dublam Joel e Ellie) quanto na brasileira (Luis Carlos Persy, como Joel, e Miriam Ficher, como a coadjuvante Tess, que rouba a cena).
Questionamentos
A tacada de mestre da Naughty Dog fica por conta de trazer um roteiro atipicamente maduro sem abrir mão dos elementos característicos dos games de alto orçamento. O jogo mistura tiro com ação furtiva, dois dos principais gêneros do mercado na atualidade. O cenário, apesar das largas doses de criatividade e talento ; os clickers (mortos-vivos em estágio avançado de infecção) povoarão o imaginário dos jogadores por um bom tempo ; , ainda é um apocalipse zumbi, já utilizado à exaustão na cultura pop.
E, além da história, Last of us também tem os méritos como jogo. Ele prefere a tensão aos sustos: não faltam momentos em que você se vê encurralado por hordas de infectados, cada um com um jeito específico de lidar, ou então, situações em que você precisa escapar de um local com ladrões ou soldados. Ambas exigem que o jogador pense. A ambientação, mais uma vez, dá o tom ; há poucas balas e curativos, exigindo que você escolha cuidadosamente quando gastar o que coletou.
Quem conhece o estúdio californiano pela trilogia Uncharted também deve se espantar com o abandono da linearidade. Se o jogo força a economizar recursos, ele não poupa em opções para se livrar (ou escapar) dos inimigos, e também está recheado de itens colecionáveis e salas secretas. Isso, claro, sem mencionar o visual, que não é apenas tecnicamente perfeito, como também mostra uma (mais uma) visão fascinante sobre o fim do mundo como o conhecemos, em que a natureza invade os espaços urbanos.
The last of us define a geração de videogames que se tornará ultrapassada no fim deste ano. Com todas as qualidades, as falhas e ; principalmente ; os avanços. Ele pode não ser o título que os jogadores gostariam de receber, mas com certeza é o que o meio precisa para evoluir. Que seja o primeiro de muitos.
O que importa é a jornada
Filme de estrada (ou, no termo em inglês, road movie) é um gênero do cinema em que os protagonistas viajam, passando por vários locais. Filmes como Little miss sunshine e Harry potter e as relíquias da morte: parte 1 se encaixam no estilo.
Inspiração na vida real
Os fungos do gênero cordyceps são parasitas que atacam insetos. Eles crescem dentro do corpo do hospedeiro, mudando o comportamento até matá-los.
The last of us
Produção
Sony Computer Entertainment
Desenvolvimento
Naughty Dog
Plataforma
Exclusivo para PlayStation 3
Número de jogadores
1 (single-player) até 8 (multiplayer on-line)
Preço
R$ 149
Não recomendado para menores de 16 anos
Avaliação
Jogabilidade: 2,5
Entretenimento: 2,5
Gráficos: 2,5
Som: 2,5
Nota final: 10
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