Jornal Correio Braziliense

Tecnologia

Antes de aceitar um convite no Facebook, avalie a cultura do trabalho


Joana*, uma ávida usuária de redes sociais, conhece bem os problemas profissionais que podem ser causados pelo mau uso desses sites. O serviço preferido dela é o Foursquare, que informa a localização do usuário quando ele chega a restaurantes, lojas e shoppings, entre outros espaços comerciais. ;Fazia check-in (marcação do espaço) em todo lugar aonde ia e até inventava outros para ganhar pontos;, conta.

Sem demora, foi chamada para dar explicações. Afinal, apontava na rede que estava em diversos locais no horário de expediente. ;Os chefes disseram que esse comportamento era antiético.

Demonstrava que eu não trabalhava, ficava passeando e que meus almoços duravam mais de uma hora;, explica. O resultado foi uma advertência e, até hoje, ela é vigiada na web. ;Tive que cancelar minhas contas e agora só acesso e-mail pessoal (ou qualquer outra rede) de casa ou do celular. Uso perfis falsos e nunca adiciono colegas de trabalho.;

A consultora de imagem profissional Gabriela Faula lembra que nem todos os patrões agem como os de Joana. Companhias com culturas mais liberais podem fazer com que relacionamentos entre os colegas de trabalho se tornem pessoais também. ;Geralmente, se os colegas costumam sair para um bar, para jantar ou frequentam a casa um do outro, é comum que se permitam ter acesso às suas vidas na internet;, comenta. Entretanto, se o relacionamento se limitar ao ambiente corporativo, o ideal é não adicioná-los. ;Eles não sabem o que você faz no fim de semana e como você se comporta com seus amigos. Ter acesso indiscriminado a isso pela internet pode distorcer a sua imagem;, explica.

A especialista acrescenta que as chances de alguma coisa no perfil contribuir para alavancar a carreira são mínimas, pois a vida pessoal não é quesito curricular classificatório, mas pode ser eliminatório. O que fazer, então? Faula acredita que recusar o convite pode parecer rude. A sugestão é ficar atento às publicações. ;Erros de ortografia, declarações polêmicas, recados íntimos, fotos com bebidas alcoólicas ou com trajes de banho são chamarizes para queimar seu filme;, aconselha.

Bom senso
O analista de sistemas Rafhael da Silva Gonçalves concorda parcialmente com a consultora. Ele tem quatro subordinados na lista de amigos do Facebook e garante que o contato não influencia o meio profissional. Mas admite que cuidado nunca é demais. ;Na virada do ano, trabalhamos todos os dias da semana e uma pessoa postou no perfil pessoal que estava indignada com a situação. Como ela diz que trabalha na empresa, foi um pouco chata a situação;, conta.

Ainda assim, Gonçalves considera que o nome da companhia não tenha sido denegrido. E, como gestor, avalia que a regra é ter bom senso. ;Você não pode comentar algo no perfil do chefe como faria no de um amigo íntimo.; Para separar os comentários para públicos diferentes, confira ao lado como organizar uma lista de pessoas que poderão ter acesso às informações do seu perfil. O melhor de tudo é que elas não saberão em quais círculos você as classificou.

* Nome fictício a pedido da personagem

Entrevista // Cristian Stassun
O consultor de carreira e doutorando em ciências humanas da UFSC fez a tese do doutorado sobre as novas formas de sociabilidade e intencionalidade que as redes sociais exercem sobre o (des)governo da vida humana. Na entrevista, ele dá dicas para se comportar nas redes sociais e evitar constragimentos no trabalho.

Adicionar o chefe ou os colegas do trabalho nas redes sociais é interessante? Por quê?
Sim, as redes sociais são meios de comunicação rápidos, baratos e eficientes. Mas existe o outro lado que se trata do que você expõe pela internet. A noção do público e privado está cada vez menor, um processo que chamamos de ;espetacularização da intimidade;. É a manifestação de um ;eu; melhorado que tentamos projetar na internet, e, principalmente, atitudes e comentários que perdem a noção de que aquela informação está sendo jogada publicamente para milhares de pessoas. Um dos riscos é ter seu chefe lendo comentários e vendo fotos indevidas, ou suas informações servirem de chacota dentro de espaços corporativos, ou ainda, ser usado juridicamente como prova. O cuidado deve ser sempre o mesmo: escreva pouco sobre intimidades (para isso tem chats próprios), seja sempre politicamente correto nos comentários. Não faça críticas efusivas à polêmicas, não emita comentários sobre preferências políticas e religiosas, e tenha um sensor fino sobre tudo que coloca na internet. Exerça seu direito de privacidade, pois quem estiver observando de fora, não vai se omitir em abusar dele para encontrar problemas no que você se expõe. A dica é: tenha uma meta. Quem quero ser na internet? Um perfil de executivo, de empreendedor, de profissional exemplar, uma pessoa dedicada a família. Se espelhe em alguém e coloque na internet um perfil condizente a essa meta.

Deixar que as pessoas do trabalho tenham acesso a fotos e comentários íntimos pode prejudicar ou alavancar a carreira?

As pessoas se sentem lisonjeadas quando podem ter acesso a intimidade de alguém, é sinal de que a outra pessoa confia em você uma informação importante da vida dela. É um sensação de crédito e proximidade. O ato de fazer isso é valido e pode ajudar na carreira, porém, o conteúdo desse ato é que importa. Se em seus comentários você criticar, fofocar, exercer com dolo alguma coisa ilícita ou descabida, claro que vai lhe prejudicar. O ideal é ter uma postura de retidão com os preceitos sociais, a cultura da empresa e a imagem que quer passar pela internet. O cuidado é extremo tanto para quem quer se manter em um emprego, como para quem quiser conseguir um, pois as agências de recrutamento e seleção serão as primeiras a investigar suas redes sociais.
É importante destacar, que o contrário, acessar comentários íntimos dos outros pode ser bem útil, pois sabendo o cotidiano e as preferências dos colaborados de sua empresa, você pode errar menos no trato com determinada pessoa, e como fator a mais para conquista de opiniões e decisões.

Qual é o limite de intimidade nas redes sociais quando entre os amigos estão os colegas de trabalho e o chefe?

Há pelo menos 10 anos, desde a evolução dos computadores e internet, no ambiente de trabalho acontece aquela história do velho e-mail de piadinhas e pornografia. Coisa de colega que pega no pé, de amigo que demonstra necessidade de aceitação e até de afirmação de sexualidade. Esses e-mails demitiram tantas pessoas, geraram tantos processos, que as empresas criaram regras internas de conduta e filtros inteligentes nas redes de sinal de internet. No caso das redes sociais, as informações são propagadas mais rapidamente e com um alcance muito maior, o risco de um processo criou uma nova atuação dos advogados, e muito mais do que isso, os gestores, às vezes, descobrem mais de um funcionário pelas redes sociais do que no cotidiano. Vários comentários são colocados como: ;Tive que aturar mais uma vez ele (se referindo ao chefe); Estou cansado desse trabalho; Quero todo dia sexta feira;, ou mesmo percebendo que o funcionário fica mais tempo ocioso do que trabalhando, fazem com que tirem parâmetros para permanência do funcionário naquela empresa.