Os apaixonados por ficção científica certamente se lembram do replicador presente na série de televisão norte-americana Star Trek. O dispositivo materializava objetos sólidos que as pessoas pediam por meio de comando de voz. Se a tecnologia ainda não evoluiu a esse ponto, pelo menos chegou perto. Com as impressoras 3D, é possível criar objetos em três dimensões a partir de um projeto desenvolvido em softwares de desenho, como os usados por arquitetos. Se antigamente esses dispositivos eram usados essencialmente pelas indústrias automotiva, aeroespacial e eletroeletrônica, atualmente eles são mais populares e estão disponíveis para designers e até mesmo para médicos, que podem usá-los no desenvolvimento de próteses para ajudar na reconstrução óssea.
Esse é o intuito de Susmita Bose, professora do Departamento de Química da Escola de Engenharia Mecânica e de Materiais da Universidade do Estado de Washington (Estados Unidos). Ela ; que tinha uma impressora 3D em sua casa que fazia objetos em metal e polímero ; passou quatro anos desenvolvendo um material químico que se assemelhasse ao osso, até chegar a uma mistura de fosfato de cálcio, silício e zinco. ;Desse modo, podemos reconstruir ossos. Por meio de tomografia computadorizada, temos a imagem completa do defeito ósseo. A partir dessa imagem, desenhamos o protótipo em um programa de computador e o imprimimos;, descreve. A ideia de Susmita é utilizar a prótese até que o osso do paciente se reconstrua. Após a recuperação, a estrutura, devido à sua composição, se dissolveria no organismo, sem causar qualquer tipo de efeito colateral.
Segundo a professora, a parte mais interessante e, ao mesmo tempo, difícil desse estudo foi otimizar os parâmetros da impressora para que começasse a trabalhar com o novo material, distinto do plástico e do metal. ;Tivemos que otimizar a máquina para que ela não perdesse muitas partículas da mistura que criamos e para que o pó não ficasse preso no cartucho. Isso foi muito desafiador;, admite. Entre as futuras aplicações médicas do produto elaborado na pesquisa estão a reconstrução de outros ossos, como o maxilar, e a inserção nas próteses de medicamentos que induzam o crescimento ósseo e de tecidos na região afetada.
Manufatura
As impressoras 3D estão no mercado desde a década de 1990. As principais diferenças entre os modelos são o material utilizado para construir os objetos, o tamanho da máquina, a precisão da peça feita, a qualidade da superfície e o nível de detalhes, que abrange cores e texturas. Joe Hiemenz, gerente de Relações Públicas da fabricante Stratasys, afirma que esse produto é a evolução da manufatura e que os modelos dos dispositivos estão cada vez mais avançados, fazendo, inclusive, impressões coloridas. ;Além do fator da exclusividade, de poder criar uma peça individual, os designers conseguem fazer seu trabalho mais rapidamente. Com isso, os produtos chegam ao mercado em menos tempo e possivelmente com preço mais baixo, já que o custo de manufaturar uma peça é reduzido;, ressalta. Hiemenz pondera, contudo, que a tecnologia ainda não é viável para a produção em grande escala, já que o custo se torna muito alto.
A gerente regional para a América do Sul da companhia Objet, Renata Sollero, salienta que as máquinas de alta qualidade e precisão permitem ao profissional agregar valor ao design ainda no início do processo. ;Atualmente, você pode ter 14 materiais diferentes em um modelo. Isso permite uma simulação real do produto final pretendido. Designers, arquitetos, engenheiros, entre outros, podem explorar ideias diferentes mais facilmente e prototipar soluções como dobradiças integradas, encaixes resistentes, fechos e vedações antes de tomar uma decisão final ; e sem precisar montar as peças. Elas realmente encorajam a criatividade;, acrescenta. Ela completa que as impressoras também ajudam médicos a planejar cirurgias. ;Já no campo do entretenimento, os dispositivos têm sido usados para fazer modelos de personagem, como nos filmes Avatar, Coraline, Homem de ferro e Gigantes de aço;, cita.
Popularização
Quanto às impressoras 3D de baixo custo ; a partir de R$ 5,7 mil, em comparação a produtos de aproximadamente R$ 60 mil ; Sergio Oberlander, diretor comercial da Robtec, destaca que tais máquinas têm o diferencial de permitirem que as pessoas fabriquem um produto sem a necessidade de desenvolver ferramentas para isso. ;Desse modo, alguém pode fazer objetos únicos e personalizados. Assim, todo mundo pode ter uma fábrica em seu escritório;, explica. Oberlander diz que esses dispositivos estão disponíveis no mercado internacional há três anos, mas só começaram a ser vendidos no Brasil em 2011.
O designer Alexandre Neto, 35 anos, atesta o benefício que os equipamentos desse tipo podem trazer. Fabricante de figuras de ação colecionáveis, como bonecos e réplicas de armas, ele passou, há cerca de três anos, a desenvolver algumas de suas peças em impressoras 3D. ;Antes, eu esculpia as estátuas na massa mesmo. Mas, em pesquisas na internet, vi que o uso desses dispositivos estava se popularizando. Aprofundei meus conhecimentos no software de desenvolvimento de protótipos em três dimensões e testei a impressora. O resultado das 15 peças que fiz desse modo foi muito satisfatório, pois os produtos saíram com qualidade alta;, descreve.
Neto conta que a tecnologia tornou seu trabalho mais rápido. ;Você tem que fazer o personagem na massa e mostrar para o cliente. Se a pessoa quiser alguma alteração no produto, é necessário reconstruí-lo. Se manualmente esse processo leva cerca de três meses, com esse dispositivo é possível concluí-lo em três semanas;, compara.
Para o também designer Youngster Lucas, 34 anos, os produtos feitos em impressoras 3D têm ótimo acabamento e são muito resistentes. ;Eu usei o dispositivo no fim de novembro para imprimir parte da minha linha de utilidades para cozinha, composta por vários módulos que são fixados em uma barra. Como a pessoa só compra o que precisa, para montar da maneira que achar mais conveniente, só é necessário fabricar a quantidade de peças que os compradores demandarem. No trabalho tradicional, eu precisaria ter um estoque de produtos que ocupam espaço e mantêm o capital da empresa parado;, relata. Lucas pontua que uma das facilidades da impressora 3D é permitir rapidez na fabricação de peças. ;Acredito que a grande inovação na área está em fazer com que os itens impressos já possam ser o produto final, pois antes só serviam como maquetes e protótipos. Várias etapas de produção são puladas, facilitando o processo de criação;, destaca.