Ele não é Steve Jobs, mas, provavelmente, vai provocar nos leitores algo semelhante ao que o fundador da Apple provocava nos consumidores. Walter Isaacson, autor da biografia oficial do empresário ; que chega hoje às livrarias de 16 países, entre os quais o Brasil ;, conquistará até mesmo quem nunca foi lá muito ligado em tecnologia. É o que aposta Denise Bottmann, uma das tradutoras do livro no país. ;Eu estou até curiosa para saber se os geeks (os apaixonados por tecnologia) vão gostar do material. Porque ele é extremamente leve, amigável ao usuário;, descreve. Steve Jobs por Walter Isaacson (Cia. das Letras, R$ 49,90) reúne cerca de 100 entrevistas com amigos, familiares, concorrentes e com o próprio Jobs, na única obra autorizada sobre a polêmica vida do cofundador da Apple. O lançamento, inicialmente programado para março do ano que vem, foi adiantado por duas vezes, devido ao afastamento (em agosto, o que puxou a publicação para fim de novembro) e à morte do executivo.
Denise, responsável por pouco mais de um terço da tradução, conta que um dos principais focos do livro é mostrar o constante conflito de Jobs no relacionamento com as pessoas. ;A vida dele foi muito puxada, e o Isaacson fez questão de mostrar o quanto era difícil para o empresário ter a personalidade que tinha;, afirma. Em um dos trechos, o autor questiona o fundador da Apple sobre suas atitudes com os funcionários. ;Você não tem ideia do que é ser como sou;, respondeu Jobs. ;Ele era ótimo para lidar com os negócios e com a tecnologia, mas as grandes questões da biografia são a agressividade e a rispidez características de seu temperamento;, ressalta a tradutora.
Tal qual o lançamento dos produtos da Apple, o livro deixou especialistas e fãs da companhia em polvorosa durante toda a semana passada. A todo momento, surgiam novas informações sobre o conteúdo do material ; tratado como ultrassecreto pela editora norte-americana (Simon & Schuster, do grupo de comunicação CBS) e pela brasileira. Não à toa, Isaacson gravou uma entrevista ao programa 60 minutes, da CBS, exibido ontem à noite. Na atração, o autor afirmou que Jobs lamentava não ter começado mais cedo o tratamento contra o câncer. ;Perguntei (por que ele não havia se submetido logo à cirurgia) e ele respondeu: ;Eu não queria que meu corpo fosse aberto, não queria ser violado dessa maneira;;, contou Isaacson.
Ainda sobre o câncer que viria a matá-lo, a obra revela todas as estratégias adotadas por Jobs no combate à doença. Segundo o The New York Times, que teve acesso a uma cópia do livro antes do lançamento, o dono da Apple tentou uma série de tratamentos alternativos antes de se entregar à medicina convencional. As tentativas incluíram a ingestão de sucos de frutas, chás e sessões de acupuntura. Sem sucesso, o executivo passou a apostar na ciência de ponta contra a neoplasia. Conforme o relato de Isaacson, Jobs era um dos 20 seres humanos que tiveram o DNA de seu tumor sequenciado por pesquisadores. O procedimento teria custado, à época, US$ 100 mil.
Jobs também confidenciou ao autor sua raiva em relação a Eric Schmidt, CEO do Google, que foi diretor da Apple entre 2006 e 2009. Em janeiro do ano passado, quando a gigante das buscas lançou um celular HTC com Android, Jobs teria afirmado que o produto era fruto de um roubo, uma vez que trazia vários atrativos presentes no iPhone. ;Vou até o meu último suspiro e vou gastar cada centavo dos US$ 40 bilhões que a Apple tem no banco para corrigir esse erro;, disse ele a Isaacson, segundo a agência AP (que também teve acesso antecipado ao livro). ;Eu vou destruir o Android, porque é um produto roubado;, acusou.
E esse não foi o único assunto delicado tratado na biografia. A editora garantiu que Jobs não teve qualquer controle sobre o conteúdo do livro. Segundo Isaacson, a ideia do fundador da Apple era deixar um legado para seus filhos, para que eles o conhecessem. ;Eu nem sempre estava lá para eles, eu quis que eles soubessem o porquê;, disse o empresário, em uma das últimas entrevistas ao biógrafo, ao ser perguntado sobre as razões que o levaram a autorizar uma obra como aquela. Para Heinar Maracy, tradutor de O fascinante império de Steve Jobs, biografia não oficial lançada no ano passado, a motivação foi menos ;romântica;. ;Ele não queria deixar essa tarefa nas mãos de biógrafos não oficiais. É possível que surjam outros livros sobre a vida do Jobs, mas creio que a obra vai limitar iniciativas desse tipo;, opina.
Nasce um mito
Talvez a descrição da vida de Jobs termine com a obra de Isaacson. Isso não significa, contudo, que o dono da Apple será esquecido, pelo contrário. Dois dias depois da morte do executivo, agências de notícias e sites especializados noticiaram que a Sony Pictures estava comprando os direitos autorais da biografia para produzir um filme sobre a trajetória do executivo. A Sony ainda não confirmou a aquisição. Em compensação, a obra Piratas do Vale do Silício, de Martyn Burke, voltou a ser exibida em alguns canais, inclusive na TV aberta. Lançada em 1999, a montagem conta a história da computação pessoal e de personalidades como Jobs e o fundador da Microsoft, Bill Gates.
E a ode ao dono da Apple não deve parar por aí. Além do livro e do filme, Jobs ganhou uma série de homenagens por meio das mais diversas ;lembrancinhas;. São camisetas, bonés e chaveiros que trazem a fotografia do empresário, frases de sua autoria e o símbolo da empresa. ;Agora, vão surgir muitos itens de escritório com referências a Jobs. Muita gente vai acabar comprando esses produtos, especialmente aqueles que trabalham com tecnologia;, aposta o professor Júlio Moreira, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). ;Fora o que deve surgir na internet, com pessoas sempre comentando o que o CEO faria se ainda estivesse vivo.;
Para Moreira, o executivo vai virar um ícone tal qual a atriz Marilyn Monroe e o político Ernesto Che Guevara. ;Quando pessoas famosas morrem no auge de suas carreiras, elas acabam se tornando imortais. É como se elas fossem absolvidas de todos os seus pecados para se tornarem deuses;, afirma o professor, especialista em marcas. ;A nossa sociedade precisa criar mitos.;
Biógrafo de gênios
Walter Isaacson é um dos escritores mais respeitados dos Estados Unidos. Foi editor da revista Time e, atualmente, administra o Aspen Institute, uma entidade de pesquisas em educação e política. Além da obra sobre Jobs, Isaacson já escreveu as biografias de ninguém menos que Albert Einstein e Benjamin Franklin.
Serviço
Steve Jobs por Walter Isaacson
Cia. das Letras
Preço: R$ 49,90
Número de páginas: 632
Tiragem: 100 mil exemplares