Era setembro de 2011 e a temperatura em Roquetas de Mar, no sul da Espanha, beirava os 40;. Depois de tomar algumas doses de uísque, a travesti brasileira Luisa Marilac pegou a máquina fotográfica e decidiu fazer algo de diferente. Gravou um vídeo para mostrar ;todo o glamour; da sua vida na Europa. ;Nesse verão, eu resolvi fazer algo de diferente. Decidi ficar na minha casa, na minha piscina, tomando os meus ;bons drink;;, diz. Pouco depois, Luisa dá um mergulho meio desajeitado e fecha o vídeo com: ;E teve boatos de que eu ainda estava na pior. Se isso é estar na pior, p;, o que quer dizer tá bem, né?;.
Esquecido na página de Luisa no YouTube, o vídeo virou, no início do ano, febre na web. Fez tanto sucesso que levou a autora a deixar a vida na Europa para aproveitar o sucesso em terras brasileiras. ;Eu sou uma analfabeta nessas coisas de internet, fiz o vídeo e postei lá. Como estava ;alta;, nem me lembro da senha, e nunca consegui retirá-lo;, conta. ;Um dia, um amigo me ligou e disse que o vídeo estava fazendo muito sucesso;, completa.
Se hoje Luisa vive do sucesso de seu vídeo, no início, a história foi diferente. ;Até o vídeo chegar às 100 mil visualizações, só levei pedrada. Não entendia por que as pessoas me gongavam tanto;, reclama. A resposta foi na mesma moeda. Luisa gravou um novo vídeo. ;Parem de me jogar pedras;, implorava aos internautas. ;Foi aí que uma repórter do Brasil me ligou querendo fazer uma matéria comigo. A partir daí, percebi que não havia só o lado ruim;, conta.
Hoje, os vários vídeos da mineira criada em Guarulhos, na Grande São Paulo, e que morava na Europa desde os anos 1990 já somam milhões de vizualizações. Só o primeiro vídeo postado por ela, em que estão a maioria de seus bordões, já foi visto mais de 3 milhões de vezes.
Tendência
O sucesso de Luisa está durando bem mais do que a maioria dos hits da internet, mas é um bom exemplo do movimento de reprodução de conteúdo no mundo digital. Depois que as imagens começaram a bombar no mundo virtual, uma série de internautas, anônimos e famosos, passaram a produzir vídeos em que imitam Luisa Marilac na piscina.
Segundo o professor de teorias da comunicação da Universidade de Brasília (UnB) Luiz Cláudio Martino, a autorreferência e a reprodução de conteúdo são características típicas da indústria cultural. ;Elas são um fenômeno ligado diretamente à cultura de massa. A partir do momento em que surgem os primeiros jornais baratos, direcionados para o grande público, já no século 19, a autorreferência foi se estabelecendo;, explica.
O pesquisador da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (USP) Waldeny Caldas explica que o fenômeno já ultrapassou os limites da cultura de massa, fazendo parte dos costumes da própria sociedade contemporânea. ;Nos anos 1960, os veículos de massa passaram a ter mais importância, e eles incutiram na sociedade essa noção de repetir uma história, adicionando detalhes que deixam a história mais sensacionalista.;
Se as iniciativas em torno das versões de Luisa surgem espontaneamente, no Tumblr uma outra diva ganhou um espaço exclusivo para as ;homenagens;. No Xuxa Is All Around (Xuxa está por toda parte, em tradução livre), quatro amigos organizaram uma página onde os internautas podem imitar a célebre foto da capa do primeiro disco da apresentadora, em situações cotidianas. ;Começou como uma brincadeira. Vi dois amigos comentando as poses da Xuxa e decidi criar uma pasta no Facebook imitando a foto, que estava fazendo 25 anos;, conta o ator Gustavo de Morais Braga, 32 anos, uma das quatro mentes por trás do Tumblr. ;Começou a fazer sucesso e um amigo sugeriu que montássemos um blog. Em três dias, havia estourado;, relata.
Segundo Gustavo, eles recebem entre 30 e 40 fotos todos os dias. ;Nós postamos todas. Já que a pessoa se deu ao trabalho de produzir a foto, acho legal que todo mundo tenha a oportunidade de vê-la publicada;, conta o rapaz, que divide as tarefas de manutenção da página com os amigos Mariana Coelho, Murilo Armacollo e Renato Borges. ;Acho que o diferencial do nosso Tumblr é ser relacionado com uma pessoa que, bem ou mal, faz parte da memória afetiva da minha geração e de gerações mais novas, já que a Xuxa continua trabalhando até hoje;, completa.