No começo, era aquela coisa básica. O celular fazia e recebia chamadas e, no máximo, se tornava um despertador ou um brinquedo despretensioso, com o jogo da cobrinha. Com o passar dos anos, no entanto, o telefone portátil ganhou dezenas de funcionalidades e hoje, com os smartphones, virou uma verdadeira estação de trabalho. Institutos de pesquisa calculam que as vendas desses aparelhos mais que dobraram entre 2009 e este ano. E a expectativa é que, a longo prazo, os celulares de última geração acabem com os arcaicos tijolinhos.
Na família Gusmão, por exemplo, eles se tornaram relíquia há cerca de um ano. Pai, mãe e filhas compraram smartphones e ;brigam; para saber quem influenciou a escolha de quem. ;Eu sempre gostei de tecnologia, a gente teve computador e aparelho de DVD desde o começo. Com o celular também foi assim;, diz o servidor público Ciro Gusmão, 52 anos, que já está no segundo smartphone.
A filha Patrícia, 22, conta que orientou o pai na compra do último celular e, por tabela, indicou outro para a mãe. ;O smartphone é muito bom, consigo estar conectada o tempo inteiro na internet e guardo músicas e arquivos importantes da faculdade;, destaca a jovem. ;O celular também manda tudo que eu escrevo na agenda para o Gmail, e isso facilita as coisas;, completa a estudante, que usa um aparelho com sistema operacional Android, desenvolvido pelo Google.
A agenda é, inclusive, a maior vantagem do celular de última geração, avalia a família Gusmão. ;O calendário oferece alarme para tudo, não esqueço de aniversários, compromissos, o horário de dar remédio para as meninas;, exemplifica a mãe, a servidora pública Luiza Gusmão, 52 anos. Na trupe, a única que não tem um smartphone para chamar de seu é Amanda, 15, que teve o celular roubado em abril. A menina usa o modelo que era da mãe, mas quer ganhar um iPhone no fim do ano. ;Primeiro, vamos ver se ela vai passar de ano, só depende dela;, avisa Ciro.
O sonho de consumo não é exclusividade de Amanda. O iPhone, da Apple, é um dos mais cobiçados aparelhos dessa categoria. A estatística Lígia Louzada, 21 anos, conta que optou pelo equipamento de Steve Jobs por conta da usabilidade. ;Eu cheguei a testar um concorrente da Motorola, mas achei muito difícil de usar. Hoje, meu iPhone é indispensável, não vivo sem;, exagera Lígia. A jovem e a família Gusmão fazem parte de um nicho que tem se interessado cada vez mais pelos smartphones: a classe A brasileira.
Um estudo recente da The Nielsen Company mostra a maioria dos smartphones do país (59%) pertence a usuários com alto poder aquisitivo. Já a classe B é dona de 26% dos celulares modernos. Para analistas, porém, os números devem se equilibrar nos próximos anos. ;A queda de 30% no preço médio desse tipo de aparelho abriu espaço para todas as faixas de renda. Hoje, o smartphone é realidade para 15% dos brasileiros das classes C e D;, pondera Thiago Moreira, gerente regional de produtos Nielsen para a América Latina.
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Se os números ainda parecem pequenos, basta avaliar o crescimento das vendas para se surpreender. Segundo a Nielsen Company, o comércio de smartphones no Brasil aumentou 128% no primeiro semestre de 2010, comparando-se ao mesmo período do ano passado. No mundo, os celulares modernos são 20% e devem chegar a 46% em 2014, conforme levantamento da consultoria Gartner. Por aqui, no entanto, o uso deve ser bem peculiar.
;Acredito que, no Brasil, a ênfase é outra. Como ainda não há muitos PCs por aí, é possível que boa parte da população procure o smartphone como a primeira plataforma de acesso à internet;, prevê Tuong Nguyen, analista do Gartner. Diferentemente do que ocorre no Japão, por exemplo, onde muitas pessoas procuram celulares com alto poder de processamento por conta dos jogos on-line. ;Nos países mais ricos, o celular de última geração se tornou algo individual, personalizado, que humanizou mais a comunicação;, diz o psicólogo Alessandro Vieira, que é analista de comportamento.
Tuong Nguyen, da consultoria Gartner, acredita que o preço será o grande responsável pela popularização desse tipo de aparelho. ;Há quatro ou cinco anos, os smartphones custavam
US$ 400, US$ 500, isso mudou bastante;, observa. E deve mudar ainda mais.
O especialista prevê que os celulares se tornarão uma espécie de tira-dúvidas para todas as horas. Há uma função chamada argumented reality, ainda em desenvolvimento, que deve oferecer uma espécie de raios X da imagem captada pela câmera do aparelho. ;Vamos supor que você está em férias em Paris e aponta o celular para a Torre Eiffel. No mesmo instante, aparecem na tela informações sobre a altura e a idade da construção, dicas de como ir para outros museus e até lojas onde há descontos nas redondezas. Espero ver isso no futuro;, comenta Tuong.
Antes de o telefone de Steve Jobs fazer todo esse sucesso, houve outra empresa que chamou a atenção para os supercelulares. A Research in Motion (RIM) lançou em 1999 o primeiro BlackBerry, um aparelho que permitia a troca de mensagens de dados. Com o passar do tempo, o celular da RIM ganhou clientes fiéis no mundo corporativo, enquanto outras fabricantes decidiram investir em modelos para usuários comuns.