Quantos livros cabem na mochila de um estudante? Três, quatro, talvez cinco? Há um momento em que a coluna começa a reclamar do peso. E se você pudesse carregar uma biblioteca inteira, com centenas de volumes à disposição sempre que quisesse folheá-los? Isso se tornou possível com aparelhos portáteis que oferecem a leitura de livros digitais ; os e-books ;, como os tablets e e-readers. Eles ainda estão longe de ser populares no Brasil, mas podem tornar-se ferramentas fundamentais nas escolas do futuro.
Os livros de papel não vão ser banidos das salas de aula, mas terão de conviver com seus xarás virtuais. Esse parece ser o consenso dos especialistas. ;O que vai ocorrer é um híbrido de livros impressos e de digitais, além da utilização de microcomputadores de mesa e portáteis, como os notebooks e netbooks, e da lousa digital;, prevê Ednei Procópio, membro da Comissão do Livro Digital da Câmara Brasileira do Livro.
Uma turma quer acelerar essas mudanças. O Correio reuniu um grupo de estudantes do Centro de Ensino Médio da Asa Norte (Cean), colégio da rede pública do DF, para conhecer os recursos oferecidos pelos e-readers e opinar sobre a ferramenta. Com a ponta dos dedos sobre a telinha de um iPad, por meio da tecnologia touch screen, os jovens viram que é possível grifar o texto, marcar a página em que se parou, fazer anotações no canto do ;papel;, copiar trechos e regular a iluminação, para evitar que a vista canse.
Karen dos Santos, 17 anos, ficou empolgada com a possibilidade de emagrecer a mochila. ;Está muito pesada;, reclama. Carlos Augusto Albuquerque, 16, destaca as vantagens ambientais. ;Economiza papel, tinta de caneta;, enumerou. Quase todos ficaram com vontade de aposentar seus atuais livros didáticos. A exceção foi Irlana Peixoto, 15. ;Prefiro o papel, já me acostumei, acho mais prazeroso;, justifica.
Habituado a ler obras disponibilizadas em PDF, Lucian Lorens, 16 anos, brinca de antever o futuro. ;Não teria mais aquilo ali;, apontou pilhas de livros sobre uma mesa. ;O professor vai mandar um arquivo em Wi-Fi (internet sem fio) para todo mundo na sala e pedir: ;Abram aí na página tal;;, imagina. A turma, porém, acha que os livros digitais vão demorar a ser adotados nas salas de aula. ;Uns vinte anos;, chuta um. ;Muito mais;, diz outro. O supervisor pedagógico do Cean, Hamilton Paz das Neves, acredita que os professores vão ter dificuldades com o novo instrumento. ;Eles ficam meio inseguros com uma tecnologia dessas. Alguns ainda preferem usar o giz. A mudança na estrutura vai ser a longo prazo;, enfatiza.
Estímulo à leitura
É muito cedo, segundo Procópio, para se ter uma medida do impacto que os livros digitais teriam na educação escolar. ;Ainda estamos na fase de alocar microcomputadores nas salas de aulas e ensinar os educadores a trabalhar com os alunos toda a tecnologia já disponível;, explica.
Os educadores devem se preparar para a nova tecnologia. ;Ela será absorvida antes pelos alunos do que pelos professores. Numa primeira fase, haverá forte resistência;, opina João Roberto Moreira Alves, presidente da Associação Brasileira de Tecnologia Educacional e do Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação. ;No passado, o professor era o detentor do conhecimento, mas hoje o conhecimento é um bem público e universal, e os docentes exercem um papel de orientadores para a aprendizagem~, define.
Os livros digitais poderiam fomentar a leitura. ;Segundo o Ministério da Educação, o portal Domínio Público contabilizou, em cinco anos de vida, mais de 15 milhões de downloads de obras no site;, justifica Procópio. Moreira Alves é mais cauteloso. ;A motivação para a leitura depende de ações concretas por parte dos professores. É preciso que as indicações de livros sejam bem feitas;, observa.
Entre as vantagens do novo formato, a mais evidente é a redução dos quilos em papel pelos gramas do equipamento eletrônico. Alunos com necessidades especiais, como deficientes visuais, também podem ser beneficiados. ;Em breve, as máquinas virão com mecanismos que possibilitam o acesso aos audiolivros;, acredita Moreira Alves.
O preço dos leitores de e-books, porém, ainda é um obstáculo. A versão mais barata do Kindle, por exemplo, fabricado pela americana Amazon, custa cerca de R$ 550. O nacional Alfa, da Positivo Informática, sai por R$ 699. ;Talvez o equipamento venha a ser subsidiado, como ocorre em alguns cursos que oferecem apostilas e livros gratuitos na hora da inscrição. Mas isso ainda é muito nebuloso, tanto na educação privada quando na pública;, comenta Procópio.
Com o preço tão salgado, os e-books ainda são privilégio de poucos. A estudante Luiza de Assis, 12 anos, ganhou um iPad no começo do ano, assim que a Apple lançou o tablet nos Estados Unidos. ;Eu tinha pedido um iPod, mas meu pai , que estava por lá, me ligou falando desse outro aparelho;, conta Luiza. A garota, porém, pouco usa o equipamento para ler. ;Eu uso muito para jogar ou falar com os amigos. Li duas vezes com ele;, lembra.
Luiza não é a única que deixa de usufruir de uma das principais funções do tablet. A estudante Letícia Moreira, 14 anos, testou o iPad de um amigo que mora nos Estados Unidos. ;Eu achei legal, mas é muito grande e bem parecido com o iPhone;, opina a garota. ;Compensa mais comprar um Mac, que faz as mesmas coisas.; O iPad ainda não é vendido no Brasil. A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) autorizou a venda do aparelho no fim do mês passado. Ainda não se sabe quanto ele vai custar por aqui ; nos EUA, o tablet sai por cerca de R$ 860.