Esqueça os multicoloridos ábacos(1), os criativos jogos da memória impressos em cartolina ou as emocionantes tentativas de adivinhar palavras no jogo da forca. Os brinquedos que estimulam o aprendizado de crianças perderam o aspecto artesanal de antigamente e foram transformados em verdadeiros artefatos tecnológicos. Os fabricantes apostam em luzes chamativas, designs arrojados, interfaces desafiadoras e personagens de desenhos animados do momento para chamar a atenção da garotada. Especialistas em educação e psicologia infantil elogiam esses artifícios modernos no desenvolvimento intelectual, cognitivo, sensorial e social das crianças, mas alertam para o uso exagerado.
Vitor Blat, 6 anos, deve concluir a alfabetização no fim do ano. Desde o Jardim I, no entanto, o menino aprendeu a juntar sílabas e a fazer cálculos matemáticos básicos em um laptop desenvolvido especialmente para crianças. Por meio de módulos didáticos inspirados em jogos de videogame, ele teve contato com assuntos que seriam vistos de novo na escola. A mãe de Vítor, Fátima Blat, diz que os aparelhos eletrônicos ajudaram no aprendizado do garoto.
;Meu filho sempre foi muito curioso, e a tecnologia é um atrativo forte para ele. Na minha opinião, o brinquedo precisa despertar a vontade de aprender na criança e, junto com outras opções didáticas, como os livros, é importante nessa idade;, opina Fátima. Vítor se empolga ao falar dos jogos instalados em plataformas tecnológicas. ;É muito legal, porque quando encontro palavras que não conheço, pergunto para a minha mãe;, explica o menino.
[SAIBAMAIS]O computador infantil foi protagonista dos momentos de diversão de Vítor por alguns meses. Depois, porém, a criança partiu para tecnologias mais adultas e com um alcance maior. Atualmente, navega pela internet para pesquisar matérias da escola e baixar jogos online. Os brinquedos eletrônicos didáticos de outrora já não empolgam mais o menino, que agora prefere os gráficos bem trabalhados do PlayStation 3, videogame de última geração.
Ressalvas
A doutora em educação e pesquisadora em mídias Vânia Quintão Carneiro, da Universidade de Brasília (UnB), reconhece a importância de brinquedos tecnológicos no desenvolvimento da criança, mas faz ressalvas quanto ao uso demasiado do recurso. De acordo com Vânia, a utilização da tecnologia na infância, fase fundamental na formação do ser humano, deve ser observada com cautela, principalmente para que o hábito não passe para o estágio de vício.
;O brinquedo precisa contribuir para a evolução cognitiva e emocional da criança, mesmo que seja usado somente como fonte de diversão. Ao mesmo tempo, não se pode ignorar a importância de colocar os pequenos em contato com a natureza e com outros coleguinhas. Isso vai ajudar a desenvolver os sentidos que, muitas vezes, não são bem trabalhados em joguinhos individuais;, avalia.
A especialista faz outra observação importante sobre o assunto. Para ela, a produção e o lançamento de brinquedos tecnológicos são tão intensos que não há tempo suficiente para que uma avaliação eficaz seja feita em cada um dos produtos. Por isso, os pais precisam estar muito atentos às funções dos brinquedos e ao tipo de influência que exercem sobre os usuários, bem como à necessidade da criança ser criança, não um adulto em miniatura.
;O exemplo da menina Maísa é significativo. Ela tem um desenvolvimento cognitivo que impressiona, um raciocínio muito rápido quando interage com outras pessoas dentro do programa. Mas quando ela é colocada em situações simples, como alguém fazendo uma careta, se assusta e tem reações normais para a idade. Maísa não pode ser tratada como se fosse uma adulta. Ela tem apenas 7 anos;, ressalta.
Cada vez mais novos
Helena Paula de Franco, 9 anos, está na 3; série do ensino fundamental, mas já é uma veterana em brinquedos eletrônicos. Aos 4, brincava em um laptop com tema da Xuxa, que trazia desafios como o alfabeto, um jogo da memória e brincadeiras com números, além de aulas de música. Até a profissão a menina escolheu no mundo virtual: foi jogando The Sims (2)que Helena decidiu ser arquiteta.
Os primos Lucas Zotta Lopes, 10 anos, e Daniel Zotta de Oliveira, 8, também brincam com aparelhos tecnológicos há alguns anos. De computadores infantis a bichos que interagem no dia a dia, os garotos passeiam com desenvoltura pelas brincadeiras high tech. Em uma loja de brinquedos, Lucas e Daniel sabem explicar o funcionamento de quase todos os lançamentos eletrônicos. Quando olham para um laptop infantil, desdenham e garantem que está ultrapassado.
Helena, Lucas e Daniel fazem parte de uma geração ávida por novidades tecnológicas. O trio é um exemplo clássico do público-alvo das empresas fabricantes de brinquedos. A variedade de opções é grande ; e a de pedidos da criançada é maior ainda. Letícia Oliveira, mãe de Daniel, confessa que tentou frear a chegada de brinquedos eletrônicos em casa, mas acabou se rendendo.
;Eu era supercontra, mas meu marido também é aficionado por tecnologia e exerceu influência direta sobre Daniel. Hoje em dia, relaxei, porque vi que os brinquedos são legais e ajudam a desenvolver o raciocínio lógico das crianças;, explica. ;Apesar de gostar dos recursos tecnológicos, tenho a preocupação de que eles não sejam as únicas opções no aprendizado do garoto. Como complemento, acho muito válido;.
Do tempo da vovó
O ábaco é uma espécie de primeira calculadora, um instrumento criado na antiguidade para permitir que cálculos fossem feitos. É construído dentro de uma moldura, com arames instalados paralelamente e bolinhas coloridas em cada um deles. Movimentando as bolinhas pelos arames, é possível fazer operações matemáticas simples.
Simulando a realidade
Criado pelo designer de jogos Will Wright e lançado em 2000, o jogo eletrônico The Sims virou febre mundial. O jogador escolhe um personagem, que passa a conviver em sociedade e a experimentar as alegrias e os dramas do cotidiano, como trabalho, relações amorosas, doenças etc. Um dos inúmeros recursos do jogo é a construção das casas dos jogadores.
Como escolher
; É importante que o conteúdo apresente bons exemplos sociais
; Crianças devem receber estímulos sensoriais
; É interessante que o brinquedo proporcione a interação com outras crianças
; Confira se o brinquedo cumpre todas as exigências técnicas de segurança
; Procure aparelhos que estimulem a fantasia e a imaginação
; O brinquedo deve trabalhar o desenvolvimento intelectual e cognitivo, sem deixar de ser divertido
Palavra de especialista
A necessidade de natureza
Não é possível fazer uma avaliação genérica sobre os malefícios que jogos didáticos eletrônicos ou aparelhos tecnológicos podem causar em crianças. Isso depende muito de cada indivíduo. O certo é que esses recursos não podem ser a única opção de aprendizado ou de lazer. Crianças precisam ter momentos de interação com outras pessoas e com a natureza, mas também têm a necessidade de passar um tempo sozinhas. Os pais devem saber equilibrar o uso desses equipamentos, até porque não há como isolar o filho do resto do mundo. A tecnologia é algo que faz parte intensamente da vida de todos nós.
Adriana Andrade é especialista em psicologia infantil
Alguns produtos
Cão Spock
O brinquedo em forma de cachorro estimula a interação com a criança. O cão responde a perguntas, canta e conta piadas
R$ 199
Laptop infantil trilíngue do Ben10
Com 58 atividades em 3 idiomas (português, inglês e espanhol), o brinquedo traz atividades de lógica, ortografia, matemática, música e jogos
R$ 169
Laptop infantil da Barbie
O aparelho apresenta oito atividades que englobam exercícios com vocabulários, números, formas e cores
R$ 119
Globo interativo
Permite atualização de dados por meio de downloads. O globo tem jogos que ensinam geografia e leitura de mapas, além de informações sobre geopolítica
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